O Congresso Nacional aprovou nesta quinta-feira (25) a Lei Orçamentária Anual 2021 com mais verbas para emendas parlamentares (dinheiro que deputados e senadores destinam às suas bases eleitorais) bancarem obras, concentração de recursos para investimentos no Ministério da Defesa e reajustes para militares. O texto segue para sanção do presidente Jair Bolsonaro
Após uma negociação entre o governo e partidos da oposição, o texto foi apreciado na Câmara dos Deputados e aprovado por 346 votos a favor e 110 contrários. Depois, seguiu para o Senado, onde recebeu 60 votos a favor e 12 contra.
Geralmente, o orçamento de um ano é votado no ano anterior. Devido à pandemia e às eleições municipais, a apreciação foi adiada, ocorrendo com atraso de três meses.
Para destravar a votação, o Executivo se comprometeu com a esquerda em fazer reajustes posteriores, por meio de abertura de créditos extraordinários, para recompor cortes em áreas como saúde, educação e no Censo a ser realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Coube ao líder do governo no Congresso, Eduardo Gomes (MDB-TO), costurar o acordo.
— Façamos na próxima semana ou no primeiro momento, uma reunião para estudarmos a tempo, uma discussão breve sobre composição do orçamento das universidades, na área da saúde, assuntos que são primordiais — disse Gomes no plenário do Congresso.
—A gente quer fazer esse compromisso de público — acrescentou.
O líder do PCdoB, deputado Renildo Calheiros (PE) propôs que os presidentes da Câmara e do Senado participem das negociações com o governo para que os recursos sejam repassados por meio de projetos de abertura de crédito orçamentário (PLNs). Apesar do acordo, os partidos orientaram contra a aprovação do orçamento, mas deixaram de obstruir a votação, com exceção do PSOL e do Novo. Entre a esquerda, o PDT foi o único a favor da aprovação.
Com o cobertor curto, o Congresso fez uma série de manobras para construir a redação final e atender pressões por emendas parlamentares. O senador Márcio Bittar, cancelou R$ 26,46 bilhões em despesas do seu parecer. A tesourada maior foi feita nas despesas obrigatórias de Previdência Social, no valor de R$ 13,5 bilhões.
A medida é uma manobra contábil para cumprir o acordo de aumento das emendas negociado durante a votação da proposta de emenda à Constituição (PEC) do auxílio emergencial há duas semanas, como antecipou o Estadão. Com a manobra contábil, o Congresso consolidou uma articulação para assumir o controle de quase R$ 46 bilhões em recursos do orçamento federal deste ano.
O volume de emendas parlamentares, indicadas por deputados e senadores para seus redutos eleitorais, é uma pressão contra o governo do presidente Jair Bolsonaro. O clima de "festa das emendas", conforme classificado pelos próprios congressistas, vai, na prática, estourar o teto de gasto e exigir um bloqueio do orçamento para garantir o seu cumprimento em 2021. Só de emendas colocadas diretamente pelo relator serão R$ 26 bilhões. Esses recursos serão negociados entre parlamentares e ministério do governo.
Críticas ao reajuste de militares e a concentração de investimentos na Defesa
Um dos principais alvos de críticas foi o orçamento destinado ao Ministério da Defesa. Conforme o Estadão/Broadcast revelou, o orçamento para os militares superou R$ 8 bilhões e representa um quinto (22%) do total para o governo federal neste ano, enquanto o do Ministério da Saúde ficou em R$ 2 bilhões. Só para aquisição de aeronaves de caça, são garantidos R$ 1,6 bilhão. Para construção de submarinos, R$ 1,3 bilhão.
— Minha gente, nós estamos guerreando contra quem? Eu pergunto a vocês: submarino e aviões de caça vão combater o coronavírus? Então, não dá para entender que prioridades são essas. Como aumentamos o orçamento da defesa e diminuímos o orçamento da educação e diminuímos também o orçamento da saúde, que é vital para todos nós? — questionou o deputado Bira do Pindaré (PSB-MA).
— Esse orçamento é de uma austeridade fiscal seletiva, de massacre para os pobres e benesses para a cúpula —criticou a líder do PSOL na Câmara, Fernanda Melchionna (PSOL-RS).
Os militares também são a única categoria que deve ser contemplada neste ano com reajuste, o que deve consumir outros R$ 7,1 bilhões dos cofres públicos, enquanto todo o restante do funcionalismo está com o salário congelado até dezembro.
— O Congresso Nacional age como puxadinho do Palácio do Planalto e se submete de maneira humilhante, dando aumento para os militares enquanto congelamos, com razão, o salário do funcionalismo público. O congelamento tinha que ser para todos — afirmou o deputado Kim Kataguiri (DEM-SP).
— Os trabalhadores mais pobres deste país vão receber um calote por conta dessa festa, dessa feira que está sendo distribuída — afirmou a deputada Sâmia Bomfim (PSOL-SP).
O volume adicional de emendas foi negociado com parlamentares do centrão, historicamente mais ativos na elaboração do orçamento federal. O volume inicial de R$ 3 bilhões em emendas de relator, proposto no início da semana, havia frustrado os congressistas.
— Eu quero agradecer a recomposição daquilo que nós já tínhamos, para não prejudicar o andamento das obras em Santa Catarina — afirmou o senador Jorginho Mello (PL-SC), agradecendo pela inclusão de recursos para rodovias no Estado.
Com um volume de emendas parlamentares chegando a R$ 46 bilhões, o teto de gastos não poderá ser cumprido neste ano. A saída para o governo é estabelecer bloqueios orçamentários para cumprir a limitação fiscal.
— Esse orçamento que será votado hoje está furando o teto — discursou o deputado Marcel van Hattem (Novo-RS), criticando a manobra.
A flexibilização na regra foi defendida publicamente ao longo do dia.
— Precisamos enfrentar as dificuldades de crescimento do país que a Emenda Constitucional (do teto) está impondo não só na saúde, mas também na infraestrutura e logística — afirmou a deputada Carmen Zanotto (Cidadania-SC).
O relator defendeu a prerrogativa do Congresso de cortar as despesas com benefícios previdenciários, alegando que o Ministério da Economia foi procurado, mas não apontou de onde tirar dinheiro para turbinar as emendas. Na equipe econômica, o argumento é que não havia espaço para flexibilização.
— Eu fui procurado por senadores e deputados e não vi um pedido do qual eu me envergonhasse. Só deputados e senadores pedindo para não parar uma obra, uma obra de uma barragem, de uma água, de coisas que me honram muito — disse Bittar.