Comprar alimentos em grandes quantidades para conseguir preços mais baixos junto aos fornecedores e, assim, poder oferecer descontos nos pratos servidos aos clientes. Essa estratégia, usada há cinco anos pelos sócios do Tantan Bar Antônio Cavaleto e Silvio Rivero, agora se tornou uma dor de cabeça. Com o novo decreto da prefeitura de Porto Alegre restringindo uma série de atividades com o objetivo de conter o avanço do coronavírus, o estabelecimento no bairro Cidade Baixa fechará as portas nesta quarta-feira (24) com o estoque cheio de comidas e bebidas e sem saber exatamente o que fará com os produtos que vencem nas próximas semanas.
A cozinha e o estoque do Tantan retratam uma realidade vivida por boa parte dos 6 mil bares e restaurantes na Capital, que a partir desta quinta-feira (25) só poderão operar nos sistemas de telentrega e pague e leve. As câmaras frias estão repletas de itens perecíveis, como carnes, frios e hortifrutigranjeiros. Ainda na quarta-feira, o local recebia caixas de cargas que haviam sido adquiridas antes do anúncio das restrições no município, quando se vislumbrava a retomada do movimento de clientes.
Ao fechar as portas no final da tarde de quarta, restarão armazenados e sem destino certo quase cem quilos de carnes (cortes bovinos, suínos, peixes, frango e outros), 25 quilos de queijo e presunto, 300 ovos, 15 barris de chope, entre outros itens.
— Vamos ficar com um estoque muito grande. Fechar novamente será um baque, devemos ter prejuízo de R$ 50 mil com todo esse estoque parado — lamenta Rivero.
Levando em consideração a queda no movimento diário de clientes e os gastos com a manutenção do estabelecimento, Cavaleto calcula que o prejuízo passará dos R$ 100 mil enquanto vigorar a restrição para abertura.
— Quem vai pagar essa conta (do aumento dos casos de coronavírus), infelizmente, mais uma vez são os bares e restaurantes — lamenta Cavaleto.
Na primeira paralisação, entre março e maio, o Tantan chegou a doar alimentos aos funcionários e realizou ações sociais, como entrega de marmitas a moradores de rua e comunidades carentes da Capital. Agora, os sócios do bar cogitam repetir as doações. Até porque mesmo mantendo o sistema de telentrega e pague e leve durante o período do decreto, o faturamento despencará. Rivero estima que a média de pratos vendidos diariamente pode cair de 25 para três, com o atendimento restrito à demanda online.
— Começamos a usar os aplicativos agora na pandemia. Somos novos neste mercado e ainda estamos aprendendo — destaca.
Com a queda na receita, os sócios têm utilizado recursos próprios para pagar os funcionários e manter as despesas em dia. A reserva de caixa que a empresa tinha já foi toda utilizada. Desde o início da pandemia, o Tantan chegou a diminuir a equipe, passando de nove para três funcionários. Ainda assim, Cavaleto e Rivero garantem que farão o possível para se adaptar ao contexto e manter a empresa aberta. Inicialmente, cogitou-se buscar um empréstimo para capital de giro. No entanto, a exigência de garantias e o juro alto fizeram os sócios desistirem do financiamento.
Decreto libera doações
Após a publicação do decreto municipal, a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes no Rio Grande do Sul (Abrasel-RS) orientou os associados a tentarem liquidar os estoques, enxugando a operação para trabalhar com telentrega e pague e leve. Caso o fechamento não seja revisto no curto prazo, a tendência é de que sejam feitas ações sociais e doações para evitar o desperdício de comida. Esse foi o caminho já foi escolhido pela maioria dos estabelecimentos no início da pandemia, quando vigoraram restrições para abertura por cerca de 60 dias.
— Ainda procuramos alternativas para tentar reverter essa situação. Estamos todos inconformados e tristes, cada um da sua forma — constata Fernanda Tartoni, presidente da Abrasel-RS.
A doação de refeições ou alimentos prontos que não forem vendidos passou a ser autorizada por lei a partir desta quarta-feira (24). O presidente Jair Bolsonaro sancionou projeto que possibilita a bares e restaurantes realizar essa ação, conforme publicado no Diário Oficial da União.