O aumento das restrições para a abertura de empresas durante a vigência da bandeira vermelha em quatro regiões do Rio Grande do Sul, dentro do modelo de distanciamento controlado estabelecido pelo governo do Estado, é recebido com críticas pelas entidades empresariais gaúchas. Dirigentes do comércio e do setor de serviços, atividades que serão mais atingidas pela medida a partir desta terça-feira (23), avaliam que a nova paralisação pode ser fatal para uma série de empresas que já vinham com problemas no fluxo de caixa.
Com a migração da bandeira laranja para a vermelha, 44 cidades nas regiões de Porto Alegre, Canoas, Novo Hamburgo, e Capão da Canoa terão de fechar o comércio e restringir a prestação de serviços não essenciais. O número passava de 100, mas o governador Eduardo Leite abriu a possibilidade das restrições serem flexibilizadas em dois terços dos municípios sob a bandeira. A indústria poderá seguir funcionando, com uso de 50% do quadro de funcionários ou de até 75% da mão de obra nas atividades essenciais.
O presidente da Federação do Comercio de Bens e Serviços do Rio Grande do Sul (Fecomércio-RS), Luiz Carlos Bohn, avalia como equivocada a decisão de fechar todo o comércio durante a bandeira vermelha. O dirigente ressalta que os lojistas vinham tomando cuidados em relação ao distanciamento e ao uso de equipamentos de proteção individuais (EPI) durante os atendimentos. Segundo Bohn, mais demissões e fechamentos de empresas podem ocorrer por causa da paralisação total das atividades.
— Não somos contra controles de disseminação da pandemia, mas não existe nenhuma evidência de que é a abertura do comércio que provoca o aumento no ritmo de contágios — aponta, ao ponderar que aglomerações estão acontecendo em outros locais das cidades.
Na Capital, muitos lojistas já fecharam as portas nesta segunda, seguindo ao novo decreto municipal. As diferentes diretrizes previstas nos decretos do Estado e da prefeitura vêm causando confusão entre os empresários, diz o presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (CDL-POA), Irio Piva.
— Temos uma situação estadual e outra municipal, e isso faz com que o pessoal demore a entender. A falta de previsibilidade acaba sendo tão ruim quanto a paralisação para o setor – salienta Piva.
O aumento das restrições à abertura das lojas em Porto Alegre vinha sendo questionado na Justiça na semana passada pela Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do Rio Grande do Sul (FCDL-RS). Com o novo decreto municipal, o presidente da FCDL-RS, Vitor Augusto Koch, considera que a ação pode ter perdido mérito. No entanto, o dirigente enfatiza que nova medida jurídica poderá ser tomada nos próximos dias. Ainda assim, Koch ressalta que a orientação é que os lojistas sigam à legislação estadual a partir desta terça.
– Estamos sendo cerceados das nossas atividades sem direito a fazer um contraponto. Essa situação gera um problema muito grande. As pessoas não conseguem atender aos seus compromissos financeiros e estão vendo os negócios escorrendo pelas mãos – aponta Koch, criticando a falta de ações do Estado durante a crise, como o adiamento do pagamento de impostos estaduais e disponibilidade crédito para as companhias.
Planejamento
Após ficarem fechados por cerca de 60 dias, entre março e maio, atendendo a decretos municipais e estaduais, muitos lojistas da Região Metropolitana veem a nova paralisação como um baque. O uso de medidas temporárias para atenuar despesas, como férias coletivas, bancos de horas e redução de jornada ou suspensão de contrato dos funcionários, já teria se esgotado.
Além disso, produtos adquiridos junto a fornecedores devem se acumular. Mesmo com adoção de vendas pela internet ou mesmo na modalidade porta a porta, a empresária Juliana Guterres avalia que a capacidade de giro das mercadorias ficará prejudicada sem a loja física. Proprietária da Meia&Cia, em Canoas, Juliana havia reforçado na semana passada o estoque de artigos de inverno. Na noite desta segunda, ela fechou a empresa, sem perspectiva de retorno. Ela acredita que dificilmente a bandeira vermelha deixará de vigorar nas próximas atualizações.
– No Dia das Mães tivemos um recorde de vendas, aí reforçamos estoques e fomos atrás de novos fornecedores. Agora, acredito que vamos voltar a ficar fechados por um bom tempo – lamenta.
Para quem trabalha com produtos perecíveis, o prejuízo é ainda maior. Proprietário de uma franquia da Casa do Pão de Queijo em um shopping da Capital, Octávio Scheibe havia recebido um carregamento de comidas e bebidas para os próximos 15 dias. Com prazo de validade, parte dos alimentos deve ser perdida, gerando perda de R$ 6 mil.
— A gente fica meio perdido com esse abre e fecha. Temos uma preocupação com os empregos e também com a saúde mental dos trabalhadores. Existe um grande nível de insegurança e as pessoas precisam do emprego para sustentar suas famílias – constata.
Com 10 funcionários, Scheibe não reduziu a equipe mesmo com a queda no faturamento após a pandemia. Para tentar superar o novo período de paralisação, ele buscará crédito em banco.