O Fundo Monetário Internacional (FMI) avaliou na manhã desta quarta-feira (15) que o Brasil agiu corretamente ao declarar estado de calamidade pública no mês passado, o que permitiu ao governo implementar medidas no combate à pandemia do coronavírus.
De acordo com o Fundo, o país gastou 2,9% do Produto Interno Bruto (PIB) em resposta à crise, com expansão de programas de transferência de renda e alívio tributário, mas o valor ainda está abaixo do que foi dispensado pelo grupo do G20, por exemplo, do qual o Brasil faz parte.
— O governo brasileiro corretamente declarou calamidade pública, o que permitiu suspender a meta fiscal e, neste contexto, criou espaço para apoiar o sistema de saúde e para apoiar famílias e empresas. No caso do Brasil, houve expansão de programas de transferência de renda e alívio tributário. O agregado (das medidas) é de cerca de 3% do PIB — afirmou o economista do FMI Ting Yan durante entrevista coletiva online.
Inicialmente, o governo brasileiro propôs auxílio de R$ 200 de emergência aos trabalhadores informais e à população de baixa renda, valor considerado insuficiente por especialistas. Depois, demorou pra implementar o pagamento de R$ 600 às pessoas e dificultou os saques de quem não tem conta corrente.
O G20, por sua vez, gastou 3,5% do PIB no enfrentamento da pandemia, enquanto o G7, formado por potências industriais como Estados Unidos e Alemanha, anunciaram pacotes que chegam a 5,9% de suas economias.
A previsão do FMI é que os gastos com saúde e com medidas de auxílio a pessoas e empresas chegarão a US$ 3,3 trilhões no mundo todo. Já os planos de injeção de empréstimos e outras garantias totalizam US$ 4,5 trilhões - US$ 1,8 trilhão e US$ 2,7 trilhões, respectivamente.
Aumento da dívida
O Brasil também descola de outros países em índices como a dívida bruta, maior entre os emergentes desde antes do coronavírus. Segundo relatório Monitor Fiscal do FMI, a dívida bruta do Brasil deve subir quase 10 pontos percentuais em 2020 e atingir 98,2% do PIB.
— Vemos que a dívida bruta sobre o PIB vai crescer para quase 100% do PIB em 2020, mas em 2021 vai estabilizar nesse nível. Novamente, é um aumento, mas não uma tendência. Quando a epidemia for uma questão do passado, o Brasil deverá centrar esforços para recuperar a tração dos esforços de consolidação fiscal — explicou Yan.
No ano passado, a dívida bruta brasileira era de 89,5% do PIB, mas o aumento acentuado para este ano, diz o FMI, é reflexo da queda de produção e receitas decorrente da pandemia e da necessidade de ampliar gastos principalmente nos setores de saúde e de serviços emergenciais.
O governo brasileiro desconsidera os títulos do Tesouro mantidos no Banco Central e calcula a dívida pública do país entre 75% e 80% do PIB hoje. Em razão da diferença de critérios, portanto, não é possível fazer qualquer comparação com os dados divulgados pelo FMI. O novo momento, porém, fará com que o aumento de déficits e dívidas públicas extrapole o Brasil e as economias emergentes, e atinja a todos os países do globo. A projeção é a de que a dívida bruta mundial aumente 13 pontos e chegue a 96,4% do PIB em 2020.
No seu relatório Monitor Fiscal de outubro de 2019, ainda sem a pandemia em suas projeções, o Fundo avaliava que a dívida do Brasil chegaria a 93,9% do PIB em 2020, com um pico que seria atingido em 2022, de 95,3%, abaixo do nível que deve ser alcançado este ano. A recuperação viria somente a partir de 2024, mas agora o cenário é ainda mais incerto e as retomadas fiscais e econômicas dependem de diversos outros fatores atrelados à duração e gravidade da pandemia.
No esforço de combater a crise sem precedentes desde a Grande Depressão de 1929, diz o FMI, os países precisam redirecionar seus gastos e políticas fiscais para "salvar vidas" e "pessoas e empresas mais atingidas" pela pandemia. Não são mais desejáveis em vários setores, por exemplo, políticas de estímulo a atividades em um momento no qual estão vigentes as regras de isolamento e distanciamento social.
Diante dessas e outras dificuldades, a dívida bruta nas economias desenvolvidas também deve disparar: o índice irá a 122,4% em 2020, em comparação aos 105,2% de 2019. As duas maiores economias do mundo, EUA e China, verão uma escalada considerável de suas dívidas brutas. Nos EUA, o índice passará de 109% do PIB no ano passado para 131,1% este ano, enquanto na China o número irá de 54,4% para 64,9%.
O Fundo fala ainda em "aumento de déficit necessário e apropriado" à medida que os governos precisam redirecionar seus gastos e desenvolver políticas fiscais para agirem frente à pandemia, mas alerta para a dificuldade de países emergentes, como o Brasil, se recuperarem pós-crise.
"Embora o aumento considerável desses déficits esse ano seja necessário e apropriado, a situação mais preocupante é para mercados vulneráveis, emergentes e em desenvolvimento, que enfrentam múltiplos choques além da pandemia, como o agravamento abrupto de condições de financiamento, queda das demandas externas — caso dos exportadores de commodities", diz o relatório. "Mesmo após o esforço global para aliviar restrições de financiamento, esses países vão ter que redirecionar seus gastos com saúde ao invés de outros serviços", afirma.
No Panorama da Economia Global, divulgado na terça-feira (14), o Fundo projetou queda de 3% na economia mundial e previu recuperação de 5,8% no ano que vem caso a pandemia melhore até o segundo semestre de 2020. No Brasil, a projeção de retração foi de 5,3% para este ano e recuperação prevista para 2021 de 2,9%.