Secretário de Fazenda e Planejamento de São Paulo, o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles afirmou que "não faz sentido" a proposta do governo federal para compensar a queda de arrecadação dos Estados causada pela pandemia de coronavírus.
Ele disse que, uma vez que a dimensão e a duração da recessão são imprevisíveis, o plano não pode valer por apenas três meses e não deve prever um teto de repasses aos governos locais como quer o ministro da Economia, Paulo Guedes.
– Não sabemos qual será a duração e o tamanho da recessão. São questões que não dependem da nossa decisão. Vamos fazer um acordo com quem? Com Deus? Não podemos combinar que a pandemia só vai durar três meses. Se demorar mais, vai custar mais, não só em termos de recursos do Tesouro, mas em termos de vidas humanas – declarou Meirelles à reportagem.
O secretário defendeu o projeto de socorro que foi aprovado pela Câmara dos Deputados na segunda-feira (13) e criticado pela equipe econômica do governo federal.
O texto determina que a União repasse recursos aos Estados e municípios por seis meses, como forma de compensação pelas perdas com o recolhimento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), estadual, e do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), municipal, provocadas pela paralisação de atividades econômicas.
A equipe do ministro Paulo Guedes, no entanto, insiste na proposta que prevê a transferência menor de recursos, por apenas três meses.
– O governo tem o direito de fazer isso. O que os Estados apontam é que isso não faz sentido. Não cabe aos Estados determinar que vamos encerrar o isolamento na data tal e que a economia voltará ao normal imediatamente – afirmou Meirelles.
Líderes da Câmara, onde o projeto foi aprovado por ampla maioria, calculam em R$ 80 bilhões os repasses que serão feitos nos próximos meses, mas o texto não estabelece um teto para essas compensações.
O Ministério da Economia afirma que esse modelo não dá previsibilidade aos gastos. Em caso de queda de 10% da receita, a despesa seria de R$ 30 bilhões. O desembolso subiria para R$ 85,5 bilhões em seis meses se a receita for 30% menor. Caso a arrecadação caia pela metade, o gasto seria de R$ 142,5 bilhões, nos termos do projeto aprovado pela Câmara.
O governo apresentou nesta terça-feira (14) um pacote alternativo de medidas, no valor de R$ 77,4 bilhões – sendo R$ 40 bilhões de repasses diretos aos Estados e municípios, R$ 22,6 bilhões de suspensão de dívidas com a União, e R$ 14,8 bilhões de dívidas com bancos públicos federais.
– A crítica que se faz, de que não se sabe o valor (dos repasses), também não faz sentido – reagiu Meirelles. – Todos estamos trabalhando pra ser o menor possível. Se durar mais, a tragédia humana será maior, e a consequência econômica também. A sociedade brasileira vai ter que enfrentar. Vai aumentar a dívida? Vamos ter que enfrentar esse problema.
O secretário, subordinado ao governador João Doria (PSDB), diz considerar "correta e equilibrada" a versão de socorro aos Estados aprovada pela Câmara. O texto ainda precisa ser aprovado pelo Senado e pode ser vetado pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
– O projeto não permite um aumento das despesas dos Estados. Pelo contrário, porque não aumenta o limite de crédito. Houve falatório sobre isso antes, mas os Estados não propuseram isso – declarou, acrescentando que o texto veda também a concessão de subsídios fiscais pelos governos locais.
Em confronto político com Doria, o presidente Jair Bolsonaro já insinuou que não daria ajuda financeira a governadores que impuseram medidas de isolamento, com impacto sobre a economia e a arrecadação.
– Quer agora vir para cima de mim? Não, ele tem que se responsabilizar pelo que ele fez – disse Bolsonaro no dia 2 de abril, referindo-se a um pedido de compensação feito por governadores numa carta assinada por Doria. – Não vai cair no meu colo essa responsabilidade.
Meirelles defendeu as medidas de isolamento e disse que as consequências econômicas também são negativas para os Estados.
– Ninguém tomou atitude simplesmente pela vontade de diminuir a atividade econômica. Elas foram necessárias para proteger a população – afirmou.