O plenário do Senado aprovou nesta quarta-feira (11) o projeto de lei que modifica o marco das telecomunicações vigente desde 1997. A votação foi simbólica. Horas antes, o texto havia sido aprovado na Comissão de Ciência e Tecnologia. Como não houve modificações, seguirá para sanção presidencial.
O projeto tramita há quase três anos no Congresso e prevê a possibilidade de as operadoras de telefonia migrarem dos atuais contratos de concessão para termos de autorização, como funciona na telefonia celular.
Pelo texto, as concessionárias de telefonia fixa poderão migrar antecipadamente dos atuais contratos de concessão para termos de autorização, pagando um valor a ser definido pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações). Estimativas feitas pela equipe econômica indicam algo em torno de R$ 34 bilhões.
Os contratos de concessão foram definidos pela União durante a privatização, há mais de duas décadas. As autorizações são concedidas pela Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) para todas as empresas interessadas em prestar serviços de telefonia móvel e internet.
Mudanças no investimento
O modelo de concessão entrou em desuso com o avanço da internet, o que torna essas contratos desinteressantes para o setor privado. Por isso, o governo vinha estudando mudar as regras para estimular uma nova rodada de investimentos no setor decorrente da possibilidade de migração da concessão para autorização.
A mudança é uma ajuda para a Oi, maior concessionária de telefonia fixa do país que está em recuperação judicial com uma dívida de cerca de R$ 20 bilhões considerando o plano de descontos e alongamento dos pagamentos a credores aprovado pela Justiça.
Sem as amarras definidas pelos atuais contratos de concessão, a empresa terá chance de atrair um comprador ou novos investidores. Os chineses e a americana AT&T são os mais interessados.
A concessão engessa investimentos para áreas que não são mais rentáveis. Um exemplo: a Oi é obrigada a manter orelhões em funcionamento sob pena de multa e gasta o equivalente a R$ 1 bilhão por ano, em troca de menos de R$ 20 milhões gerados em receita por esses aparelhos.
A Anatel também fará um levantamento para definir o valor dos bens usados na prestação da telefonia fixa (equipamentos e imóveis) e descontará os investimentos realizados e ainda não amortizados pelas companhias na atualização desse parque técnico.
Essa diferença de valor terá de ser reinvestida na melhoria da capacidade de transmissão de dados pela rede de fibra óptica das operadoras em locais hoje sem grande atrativo comercial.
O projeto
A relatora do texto, senadora Daniella Ribeiro (PP-PB), chegou a cogitar uma emenda de redação, alterando o texto que saiu da Câmara dos Deputados, mas recuou no início desta semana. Se isso fosse feito, o projeto teria de passar por outras comissões e até voltar para a Câmara depois.
Telefônica, Embratel, Algar e Sercomtel, que também operam como concessionárias, poderão migrar seus contratos caso o plenário do Senado aprove o texto como está.
Outra mudança que causou controvérsia com os partidos de oposição e foi mantida no projeto de lei é a possibilidade de as operadoras comercializarem suas frequências. Frequências são como avenidas no ar por onde as teles fazem trafegar seus sinais. Para evitar interferências, cada empresa tem suas faixas de frequências — todas adquiridas em leilão. A transferência terá de ser submetida para anuência da Anatel.
Essa abertura vai criar um mercado secundário, permitindo novos negócios especialmente em regiões de pouco interesse para as grandes operadoras. Essa troca de licenças terá validade de 20 anos, podendo ser prorrogada por igual período.
Para as emissoras de rádio e TV, houve a garantia de que ficarão fora da contribuição feita ao Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust), única exigência para que não dificultassem a aprovação do projeto.
Grandes grupos de mídia, como Netflix e Google, esperavam garantir, expressamente no texto, que a programação audiovisual transmitida pela internet fossem livres de qualquer regulação e, portanto, de cumprimento de cotas de produção de conteúdo local e do pagamento de contribuições para fundos setoriais como a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica nacional (Condecine).
Um projeto específico tramita no Senado e deve resolver essa situação que os gigantes de mídia chamam de "insegurança jurídica". De autoria do senador Vanderlan Cardoso (PP-GO), o texto poderia ter sido votado em conjunto com o novo marco regulatório das teles, mas foi adiado para a próxima semana.
Um dos pontos de embate do governo com as empresas de mídia se refere à arrecadação para o Condecine. O governo concorda que essas empresas fiquem livre de regulação na transmissão de conteúdos audiovisuais pela internet, mas não abre mão da arrecadação ao fundo.
Esse projeto está sendo conduzido para atender a um pedido do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que, em troca de uma parceria com o Brasil, quer que Jair Bolsonaro convença a Anatel a aprovar a compra da Warner Media pela operadora AT&T.
A lei vigente veda que uma operadora de telefonia (a AT&T, no caso) detenha o controle de uma produtora de conteúdo (Warner Media). No Brasil, a AT&T é dona da Sky, empresa de TV paga e internet por satélite. Foi por esse motivo que a Globo teve de vender o controle da Sky. Hoje, ela é acionista minoritária, com cerca de 5% de participação.