Bastou Paulo Guedes pisar nos EUA para que seu celular disparasse com ligações e mensagens diretamente do Brasil. "É urgente", escreviam aliados para tentar convencer o ministro da Economia a dar retorno a tantos pedidos. Mas Guedes parecia irredutível: "pessoal, vocês têm que ter capacidade de resolver o problema aí. Não é possível que eu não possa ficar um dia fora", escreveu.
Era quinta-feira (11) e o chefe da equipe econômica de Jair Bolsonaro estava no meio de uma agenda com 27 compromissos entre Nova York e Washington. Ainda não imaginava que teria de lidar com a decisão do presidente de interferir, à sua revelia, no reajuste do preço do diesel da Petrobras. A medida contrariou ferozmente a condução da política econômica liberal defendida pelo ministro – de livre mercado e menor intervenção possível – e despertou a desconfiança dos investidores.
Até aquela tarde, porém, Guedes desprezava os recados que chegavam sobre a habitual falta de articulação entre a equipe econômica e o Congresso, e focava sua atenção nos encontros com autoridades financeiras internacionais. Mas em poucas horas as crises internas geradas pelo Planalto escalaram e o ministro precisou passar boa parte do tempo tentando explicar – e entender – as decisões tomadas pelo presidente.
Entre as reuniões, recebia mensagens sobre a atuação de aliados do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que também estava em viagem oficial aos EUA. Os deputados fizeram andar no Congresso um texto alternativo ao do governo sobre reforma tributária depois que um auxiliar de Guedes falou sobre as propostas do Planalto em relação ao tema.
Depois, veio a enxurrada de recados e ligações sobre a decisão de Bolsonaro de segurar o aumento de 5,7% no preço do combustível – Guedes não fora avisado da medida. Irritado, o ministro evitou enquanto pôde comentar o assunto. Sobre a confusão com o presidente da Câmara, no entanto, disse a jornalistas que Maia deve ter um "senso político superior" ao dele ao fazer seus cálculos, mas teme que o andamento de várias propostas atrapalhe a aprovação da reforma da Previdência.
Nos encontros fechados nos EUA, empresários e investidores queriam saber o prazo e o tamanho da reforma que será aprovada pelo Congresso, e qual a possibilidade de o ministro não continuar no cargo até o fim do governo. Por enquanto, escutam que não há nenhum sinal concreto de que ele vá deixar o posto, mesmo após a interferência de Bolsonaro na Petrobras.
Depois de muita insistência dos jornalistas, Guedes afirmou no sábado (13) que é possível consertar na base da conversa decisões "não muito razoáveis" tomadas pelo presidente na economia. E é isso que o ministro pretende fazer nesta semana, quando volta ao Brasil para, segundo ele, entender melhor os fatos e as motivações do Planalto.
O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, outro integrante do núcleo econômico que viajou aos EUA nesta semana, não quis comentar sobre a política de preços da estatal. Ele se reuniu com autoridades do Fundo Monetário Internacional (FMI), em Washington, e se deteve a fazer elogios ao projeto do governo sobre a autonomia do BC.
Segundo Campos Neto, isso vai ajudar a reduzir os juros no Brasil, já que livraria a instituição de interferências políticas.
Maia, por sua vez, também não gostou da apresentação da proposta pelo Planalto – ele defende a medida há anos com um texto que já tramita no Congresso. Legislativo e Executivo disputam o protagonismo da aprovação de uma agenda reformista no país. No início da semana, Maia e Guedes falaram para a mesma plateia de investidores e empresários em Nova York, porém em dias diferentes.
O mercado reagiu bem à fala do ministro, já conhecida pelos americanos, e com um pouco mais de cautela ao discurso do presidente da Câmara, que falou dos problemas de articulação política do governo.
Investidores olham para o Brasil com cuidado e querem esperar a aprovação da reforma da Previdência para colocarem dinheiro de fato no país. Segundo Guedes, que se reuniu com o ministro das finanças da China, o secretário do tesouro americano, a diretora do FMI, entre outras autoridades, ninguém perguntou sobre o celeuma da Petrobras.
Nos bastidores, porém, a avaliação foi de que a interferência de Bolsonaro na estatal prejudicou as conversas de Guedes no exterior, pois coloca em dúvida sua capacidade de sobrepor a economia liberal a pressões políticas. Nas palavras do ministro, os investidores estrangeiros estão olhando com enorme interesse para o Brasil, já que a economia mundial está desacelerando e esse pode ser um grande momento para os mercados emergentes.
— É preciso olhar para o futuro. Vou atuar no front em que posso fazer alguma coisa para frente — disse Guedes.