Líderes que representam a maioria dos deputados decidiram, nesta terça-feira (26), que vão fazer mudanças na proposta de reforma da Previdência. Ao consultar as bancadas, que somam 291 dos 513 parlamentares, lideranças da Câmara se posicionaram contra as alterações no benefício pago a idoso carente (BPC) e nas regras de aposentadoria rural.
O grupo também é contra os dispositivos que permitiriam futuras mudanças na Previdência por rito mais simples. Trechos da proposta retiram da Constituição regras para as aposentadorias.
Como alterações da Constituição demandam mais votos no Congresso, seria possível reformar a Previdência sem precisar seguir o rito de uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). "Qualquer reforma previdenciária deve ter como princípios maiores a proteção aos mais pobres e mais vulneráveis", diz a nota assinada pelos líderes dos partidos MDB, PR, PP, PRB, PSDB, DEM, PSD, PTB, SD, Cidadania, Podemos, PROS e Patriota. Inicialmente, o movimento contou com líderes de 11 partidos, mais dois aderiram ao ato depois.
Com 291 deputados e os votos da oposição, os pontos da PEC criticados pelas bancadas devem ser excluídos pela Câmara. Segundo eles, a desconstitucionalização das regras do sistema previdenciário poderia gerar insegurança jurídica.
O anúncio foi feito pelo líder da maioria na Câmara Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), que não sabe quantos votos a PEC da reforma da Previdência poderia ter com as alterações defendidas pelo grupo.
— Essa responsabilidade de contagem de votos não é nossa, é do governo — afirmou.
Para Maia, propostas "têm mais atrapalhado do que ajudado"
Pela proposta enviada ao Congresso, idosos de baixa renda receberão R$ 400 de benefício a partir dos 60 anos e só ganharão um salário mínimo (hoje em R$ 998) a partir dos 70 anos. Atualmente, o BPC é pago aos 65 anos, no valor de um salário mínimo, para pessoas que comprovam situação de miséria (renda per capita de até um quarto do salário mínimo).
Para os trabalhadores rurais, a proposta vai exigir idade mínima de 60 anos (para homens e mulheres). Hoje, as mulheres podem pedir o benefício aos 55 anos e os homens, aos 60 anos, desde que tenham 15 anos de contribuição - a proposta aumenta o tempo de contribuição para 20 anos.
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), disse que as mudanças propostas para o BPC e a aposentadoria rural "têm mais atrapalhado do que ajudado" a tramitação da reforma da Previdência.
— Para mim, não é surpresa nenhuma. Era absolutamente previsível que os líderes trabalhassem para modificação ou retirada, ou seja lá o que for, porque vamos discutir isso dentro do Congresso Nacional, porque eles já tinham mostrado uma insatisfação, em especial as bancadas do Norte e do Nordeste, com esses temas específicos — afirmou.
Partido de Maia está entre os signatários da proposta
Os representantes da maioria dos deputados classificam a reforma da Previdência como importante e necessária, mas contestam pontos da proposta.
Para o líder do DEM, Elmar Nascimento (BA), o governo "perdeu a batalha da comunicação" e, por isso, é necessária a retirada dos artigos da PEC que alteram os trechos criticados pela maioria da Câmara.
— Aqui o ambiente é nosso — afirmou o líder, em tom de crítica ao governo, que rejeita articular votos em favor da reforma da Previdência.
Os líderes negam que o ato desta terça seja uma retaliação ao governo, mas, nos bastidores, reconhecem que é uma reação às divergências entre o presidente Jair Bolsonaro e o Congresso, especialmente diante das críticas ao presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
A oposição — PDT, PT, PCdoB, PSB, PSOL e Rede — anunciou nesta terça que votará contra a PEC da reforma da Previdência. Juntas, essas siglas têm 133 votos contra a proposta. Oposicionistas vão tentar derrubar a PEC ainda na primeira etapa na Câmara: a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).
Pela manhã, Guedes desistiu de ir à CCJ
Sobre a decisão do ministro da Economia Paulo Guedes de não participar de audiência pública na CCJ nesta terça, Ribeiro disse que o tema tem que ser tratado pelo presidente do colegiado, Felipe Francischini (PSL-PR), e pelo governo.
— É o governo que está articulando com a própria Comissão de Constituição e Justiça.
Descontentes com o Planalto, líderes de partidos independentes ao presidente Jair Bolsonaro articulavam, antes da desistência, um boicote ao debate com o ministro.
— É melhor nem vir mesmo. Já tínhamos sugerido isso na semana passada — disse à reportagem da Folha de S. Paulo o líder do PP, Arthur Lira (AL).
Outras lideranças, como do PSDB e do PR, também comemoraram, nos bastidores, o cancelamento da participação de Guedes. Essas siglas, que não fazem parte da base de apoio ao governo, reclamam da falta de articulação política e diálogo entre o Congresso e o Palácio do Planalto.
Durante a tarde, a sessão da CCJ foi encerrada. O Ministério da Economia havia designado o secretário especial da Previdência Rogério Marinho para responder às perguntas, mas os deputados decidiram não ouvi-lo.
Durante a tarde, a CCJ aprovou novo convite ao ministro da Economia Paulo Guedes para falar sobre a reforma da Previdência na próxima quarta-feira (3). O convite foi aprovado através de um acordo entre interlocutores do governo e a oposição, que queria convocar o ministro para comparecer à Comissão.
Em mais um recado ao governo, os deputados aprovaram que o relator da proposta de reforma da Previdência só deve ser escolhido na próxima semana, após Guedes ir ao Congresso defender a medida.
Governadores pressionam por reforma
Em reunião com o ministro da Economia, Paulo Guedes, governadores defenderam nesta terça-feira (26) que o governo federal precisa aperfeiçoar a articulação política para dar celeridade à tramitação da reforma da Previdência. Uma das vozes mais ativas na defesa da reforma, o governador do Rio Grande do Sul Eduardo Leite sustentou que o tema precisa ser tratado como prioridade pelo Planalto.
— A situação é urgente e o tempo político é curto. A janela de oportunidade é o primeiro semestre, no máximo o início do segundo – afirmou, fazendo referência às eleições municipais, que devem mobilizar os parlamentares a partir do final deste ano.
— Deixamos claras as preocupações dos governadores sobre relação entre governo e Congresso. Queremos que a decisão sobre a reforma da Previdência se dê o mais rápido possível. Se o ambiente político retardar aprovação da Previdência, os estados terão menos tempo para aprovarem medidas complementares juntos às Assembleias Legislativas — complementou.
O encontro ocorreu no Palácio do Buriti, sede do governo do Distrito Federal. Leite elogiou o envolvimento dos ministros Guedes e Onyx Lorenzoni, da Casa Civil, em torno da reforma, mas reforçou que o foco do Planalto precisa estar voltado para o andamento dos projetos que tratam do sistema previdenciário.