A Vale perdeu R$ 71 bilhões em valor de mercado nesta segunda-feira (28), no primeiro pregão da Bolsa brasileira após o rompimento de uma barragem da mineradora em Brumadinho (MG), e caiu de terceira para quinta empresa mais valiosa do país.
É a maior perda de valor de mercado em um único dia na Bolsa brasileira. O tombo anterior foi a perda de R$ 47,3 bilhões pela Petrobras, em maio do ano passado, segundo a Economatica.
Até a semana passada, a Vale era a terceira maior, atrás apenas de Petrobras e Itaú, mas agora perde também para Bradesco e Ambev. O valor perdido apenas nesta segunda equivale a cerca de todo o valor de mercado da empresa de celulose Suzano.
O tombo é a reação imediata de investidores contra o possível impacto financeiro da tragédia sobre a empresa, que já teve R$ 11 bilhões bloqueados (cerca de 45% do caixa da empresa em setembro de 2018, dado mais recente) e foi multada em R$ 250 milhões pelo Ibama e em R$ 99,139 milhões pelo governo de Minas Gerais.
O rompimento da barragem matou 60 pessoas e existem 292 pessoas desaparecidas na região, segundo o Corpo de Bombeiros.
A queda reflete ainda a suspensão do pagamento de dividendos e juros sobre capital próprio, que garantiu R$ 7,7 bilhões a acionistas no ano passado e vinha atraindo investidores.
A Vale tem peso de 10,9% no Ibovespa, que caiu mais de 2% e fechou o dia cotado a 95.443 pontos. Outro efeito da queda das ações da empresa no mercado foi o giro financeiro recorde da Bolsa brasileira, que movimentou ao redor de R$ 24,5 bilhões. A máxima anterior havia sido de R$ 20,7 bilhões no primeiro pregão após a eleição de Jair Bolsonaro (PSL), em 29 de outubro do ano passado.
As ações da Vale recuaram 24,52%, a R$ 42,38. O tombo da Vale teve reflexo também sobre a Bradespar, que recuou 24,5, a R$ 26,43. A companhia tem cerca de 6% papéis da Vale. Os demais acionistas da companhia não têm ações listadas em Bolsa.
Em Nova York, os recibos de ações da mineradora recuavam 16%, após o tombo de 8% na sexta-feira, quando a Bolsa brasileira estava fechada pelo aniversário de São Paulo.
Desde a tragédia, analistas têm repetido que o impacto do acidente para a companhia será menos sobre a produção e mais relacionado às questões jurídicas.
— Estamos numa névoa, ninguém tem uma certeza do que vai acontecer. Tem a reincidência, que pode ser um agravante — disse Tiago Reis, da Suno Research.
Reis fala sobre o rompimento da barragem da Samarco, em Mariana (MG), em novembro de 2015. A Vale tem 50% da Samarco e, à época, foi poupada pelo mercado financeiro. Após alguns pregões de baixa, a companhia entrou em uma trajetória de recuperação que levou a uma valorização de mais de 200%.
O Banco UBS disse que não está claro o impacto sobre a produção e a logística da empresa após a tragédia e questiona se as multas sobre a companhia não serão maiores desta vez, considerando que é o segundo rompimento de barragem ligado à Vale.
Reis lembra, porém, que uma série de fatores que explicavam a baixa se inverteram.
Além do rompimento da barragem de Mariana, o preço do minério estava em baixa, a Bolsa brasileira sofria com a crise econômica e a aversão ao governo de Dilma Rousseff (PT), com o Ibovespa negociado abaixo dos 40 mil pontos, e a própria Vale vivia incertezas corporativas que se dissolveram quando houve a reestruturação societária, em 2017.
Os fundos de pensão das grandes estatais brasileiras (Previ, Petros e Funcef) controlavam a Vale via uma empresa chamada Valepar. Eles detinham as ações com direito a voto (ordinárias), enquanto os minoritários tinham ações classe preferenciais. A reestruturação promovida em 2017 converteu os papéis em ações ordinárias e a empresa migrou para o Novo Mercado, segmento da B3 destinado a empresas com as melhores práticas corporativas.
Segundo a XP Investimentos, a mina Feijão, parte do complexo Paraopeba representa de 1,5 e 2,5% da produção de minério da Vale. Mesmo que uma parte maior da operação fique parada temporariamente, o impacto neste aspecto deve ser limitado.
Todo o sistema produz 7% do minério da Vale, segundo dados divulgados pela companhia no terceiro trimestre.
Apesar da tragédia, a XP mantém a recomendação de compra dos papéis da empresa com horizonte de médio e longo prazo.
— Entretanto, uma série de incertezas em relação ao impacto no curto prazo permanecem, portanto sugerimos cautela — escreveu a corretora em relatório.
Em relatório, o banco UBS afirma que ainda não está claro qual será o impacto sobre a produção e a logística da companhia.
O banco questiona ainda se as multas sobre a companhia serão maiores desta vez, considerando que é o segundo rompimento de barragem ligado à Vale. Em 2015, uma barragem da Samarco, companhia da qual a Vale é sócia, se rompeu.
O UBS não oferece respostas aos acionistas, mas manteve recomendação neutra para a companhia.
A Guide destacou que os papéis continuarão pressionados no curto prazo, reflexo dos danos de imagem à companhia e provisões para pagamento de multas e indenizações.
— Mais: o rompimento da barragem poderá atrasar também as concessões e licenças ambientais nas operações Brasil. Há também o risco de novos processos de investidores nos EUA, e downgrade de agências de risco — afirmou a corretora.
No sábado, a agência de classificação de risco Standard & Poor's afirmou no sábado que a nota da companhia pode ser rebaixada em consequência da tragédia.
— Acreditamos que a Vale enfrenta vários riscos decorrentes do desastre. Suas obrigações financeiras para remediar e compensar as perdas podem ser substanciais, e a empresa pode ter de enfrentar escrutínios extensos e complexos de entidades ambientais e órgãos reguladores que resultariam em suspensões de licenças — disse a S&P em comunicado no sábado (26).
A agência colocou a nota da empresa —que é BBB— em observação, indicando que a mineradora pode ser rebaixada no curto prazo.