A publicação do balanço do terceiro trimestre do Banrisul, hoje, faz deslanchar o processo de oferta das ações detidas pelo governo gaúcho, até o limite da manutenção do controle. Na busca de recursos a curto prazo para amenizar a crise financeira, o Piratini vai oferecer para grandes investidores institucionais 49% dos papéis ordinários, com direito a voto, e os 14,2% dos preferenciais que ainda mantém. Levando-se em conta a cotação do fechamento do pregão de sexta feira na bolsa de São Paulo, seriam arrecadados cerca de R$ 1,83 bilhão.
Após o banco divulgar os números mais recentes, por questões legais será publicado nos próximos dias fato relevante com as condições para a operação. Daí, começa um road show com a apresentação do negócio aos possíveis interessados. Além do Brasil, haverá encontros com grandes fundos de investimento em Londres e Nova York.
Ao contrário da oferta inicial de ações do Banrisul em 2007, pessoa física não terá chance de comprar ações. O road show, por cerca de 15 dias, deve começar neste mês. Toda a operação está prevista para ser concluída em 2017.
Vendedor das ações, o Estado contratou o próprio Banrisul para coordenar a oferta. Mas outros bancos farão a distribuição dos papéis e a liquidação das operações. O time selecionado é formado por Itaú BBA, Bradesco BBI, JP Morgan, Morgan Stanley e Bank of America Merrill Lynch.
O valor de R$ 1,83 bilhão tem como base a cotação do fechamento da sexta-feira dos papéis preferenciais (PN), os mais negociados no pregão paulista: R$ 14,37. Apesar da maior parte da oferta ser de ações ordinárias (ON), que encerraram a semana em R$ 24, quase não têm liquidez. Assim, é consenso que o valor final terá como referência as PN. Quando confirmou a operação, o Estado chegou a projetar faturamento de R$ 3 bilhões.
Situação do país pode influenciar operação
Além de as ordinárias terem poucos negócios, seus detentores não têm vantagem financeira em relação aos preferencialistas. Em hipotética privatização do banco, os donos das PN recebem o mesmo que ofertado por ação ao bloco de controle, que tem as ON. O mecanismo é conhecido como tag along.
No dia em que a operação foi anunciada, 4 de outubro, as ações PN do Banrisul levaram tombo de 10,8% devido à frustração do mercado com a expectativa de privatização, especulação impulsionava o papel desde o início do ano.
Um dos temores sobre o sucesso da oferta é a desconfiança dos investidores estrangeiros em relação ao Brasil. O rali que levou o índice Ibovespa a bater em setembro a máxima histórica que vigorava desde 2008 perdeu fôlego após aumentarem as dúvidas em relação à capacidade do Planalto de aprovar a reforma da Previdência, considerada essencial para o equilíbrio das contas do país no longo prazo.
Na hipótese de queda ainda maior do mercado acionário, não é destarcado o cancelamento da operação.
O analista de bancos Luis Miguel Santacreu, da Austing Rating, avalia que um dos pontos que favorece o Banrisul é o fato de já ser de capital aberto, a despeito da desconfiança em relação a estatais, o que em geral reflete em desconto no preço na comparação com os pares privados.
– O Banrisul já foi estudado por vários analistas, que o compararam com outros bancos, já foi milhares de vezes sabatinado, questionado, e eventuais dúvidas que o mercado tinha, respondidas – diz Santacreu.
Mesmo assim, também terão peso o ambiente vivido no país, como andamento da reforma da Previdência e clima político, o que pode tornar o momento mais favorável ou hostil para ofertas de ações.
A agência de risco Fitch, uma das três maiores do mundo e que acompanha o Banrisul, publicou em outubro relatório sobre bancos públicos estaduais e alertou para as eleições de 2018, com risco de troca de diretorias executivas. Estratégias e metas, observou, estão sujeitas à situação financeira e diretrizes políticas dos acionistas controladores, "embora as atividades sejam desempenhadas com relativa autonomia", ressalvou.
Entre aspectos positivos do Banrisul, o diretor de instituições financeiras da Fitch no país, Jean Lopes, lista captação estável e pulverizada, sem oscilações na crise, e a custos mais baratos em relação a outros bancos de médio porte no Brasil.
– De negativo, o que pesa é o ambiente operacional do Rio Grande do Sul – diz Lopes, referindo-se à concentração dos negócios no Estado, em meio à estagnação econômica e a crise das finanças públicas.
Por estar em período de silêncio até hoje, o banco não se manifestou.
No que o dinheiro ajuda
O alívio financeiro com a venda das ações será pequeno. O R$ 1,83 bilhão hoje projetado seria suficiente apenas para cobrir um mês da folha de pagamento do Executivo, cerca de R$ 1,4 bilhão bruto.
O momento
O governo gaúcho esperou o momento de euforia na bolsa para fazer a oferta, após o índice Ibovespa bater recorde de pontuação, em setembro. No início do ano, a cotação do papel preferencial do Banrisul estava na casa dos R$ 10. Em fevereiro, após especulações sobre privatização do banco, subiram para R$ 19. Um dia antes do anúncio da oferta de ações, estava na casa de R$ 17. No dia da confirmação da operação, queda de 10,80%. Agora, as incertezas relacionadas à confiança no Brasil são monitoradas para saber se há apetite em relação aos papéis e o valor que os investidores estarão dispostos a pagar.
O cálculo
Serão vendidas 128 milhões de ações. Hoje, a projeção de arrecadação seria de cerca de R$ 1,83 bilhão devido à cotação dos papéis mais negociados, que encerraram a sexta-feira a R$ 14,37.
O controle
Com a venda de 49% das ações ordinárias (ON), com direito a voto, o Estado ainda fica com 51%, o que garante o controle sobre o banco.
Como é feita a oferta
O procedimento de definição do preço é conhecido como bookbuilding. No livro de ofertas, o coordenador da oferta avalia, junto a investidores, o apetite pelas ações.
O coordenador da operação, por exemplo, pode determinar um intervalo de preço.
Os investidores indicam quantas ações estariam dispostos a comprar, e a quanto.
Dessa maneira, observa-se o interesse de acordo com o nível de preço.
Tabuladas as ofertas, é possível definir, de acordo com a quantidade de papéis que interessa a cada investidor e o preço que pretendem pagar, o valor da ação no processo.
A intenção é encontrar um valor que equilibre os interesses de quem vende e de quem compra.