Depois de fechar 2016 com rombo menor do que o previsto nas contas públicas, o governo do Rio Grande do Sul encerrou o primeiro semestre de 2017 com motivos para preocupação: em seis meses, o déficit do Estado – gasto acima da arrecadação – voltou a crescer e já passa de meio bilhão de reais.
O resultado é praticamente o oposto do alcançado no mesmo período do ano passado. De janeiro a junho de 2016, houve superávit graças a recursos adicionais obtidos a partir de operações que não irão se repetir – como a venda da folha dos servidores ao Banrisul. O dinheiro extra ficou menos de 24 horas em caixa (foi usado para bancar pendências), mas impactou na contabilidade anual e contribuiu para reduzir o desequilíbrio registrado ao final de 2016 – no valor de R$ 143 milhões negativos. De lá para cá, a tendência se inverteu.
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Até junho deste ano, a receita do governo estadual cresceu 2% acima da inflação, em relação a igual período de 2016. Só que isso não foi suficiente para fazer frente às despesas, que tiveram acréscimo real de 7%. O avanço nos gastos, segundo a Secretaria da Fazenda, se deveu a três fatores:
1) o peso crescente dos reajustes salariais (o último foi em maio) na área da segurança pública, aprovados na gestão passada;
2) o custo cada vez mais alto dos servidores inativos, cujo contingente se amplia mês a mês;
3) a elevação dos gastos com custeio, provocada por reajustes em contratos de terceirizados e aumento de verbas para a saúde, que, por lei, não pode receber menos de 12% da receita.
– O déficit não foi surpresa. A gente sabia que não teria mais recursos extraordinários e que as despesas seguiriam crescendo, mesmo com todo o esforço de contenção – diz o secretário-adjunto da Fazenda, Luiz Antonio Bins.
Se nada mudar, segundo Bins, o buraco pode chegar a R$ 3,4 bilhões no fim de 2017. Titular da pasta, Giovani Feltes já admite publicamente a possibilidade de "encontro de folhas" nos próximos dois meses (leia mais na entrevista ao lado).
Caso a perspectiva se confirme, o Estado não conseguirá concluir a quitação dos salários de agosto do Executivo na primeira quinzena de setembro, como tem feito até agora. Por falta de verbas, o pagamento poderá ficar para o fim do período, quando já deveriam estar sendo honrados os contracheques seguintes, de setembro, e outras despesas, como o duodécimo (repasse aos demais poderes). Impasse semelhante vem ocorrendo no Rio de Janeiro desde 2016.
– Se não emendar duas folhas, vai ficar bem perto disso. Hoje, os principais ingressos de ICMS ocorrem nos dias 12 e 27. Se até o dia 12 não der para pagar, no mínimo a conta ficará para o dia 27. Vai embolar tudo – projeta o especialistas em finanças públicas Darcy Carvalho dos Santos.
Na avaliação de Santos, é "inevitável" a piora do quadro nos próximos meses, porque as parcelas da dívida com a União – suspensas entre abril e dezembro de 2016 – voltaram a ser cobradas neste ano. O valor aumenta a cada mês.
Outro complicador é o parcelamento do 13º salário de 2016. Quando o Estado finalmente zerar o passivo, terá mais um 13º pela frente.
– Se não sair o socorro da União, vai piorar muito. Não é exagero – adverte Santos.
A adesão ao regime de recuperação fiscal, considerada vital pelo governador José Ivo Sartori, inclui a suspensão da dívida por três anos e a autorização para a busca de novo empréstimo, o que permitiria ao governo estadual voltar a pagar remunerações em dia. O problema é que a União exige uma série de contrapartidas, a Secretaria do Tesouro Nacional não aceita ceder e há dúvidas em relação aos benefícios.
A líder da bancada do PT na Assembleia, deputada Stela Farias, diz que a oposição nunca negou a existência da crise, classificada como "histórica", mas questiona os números da Fazenda e critica as saídas propostas pela gestão.
– Forçar um acordo com um governo ilegítimo não faz o menor sentido. Sartori quer isso a qualquer preço porque precisa de caixa para buscar a reeleição em 2018. No que depender de nós, não vai conseguir – afirma Stela.
O governo estadual rebate, argumentando que o acordo com a União terá três anos, prorrogáveis por mais três, e que, portanto, as medidas beneficiarão a atual administração e a próxima, "seja quem for o novo governador".