A disparada no preço do leite a partir de maio, período de entressafra, começa a ficar no passado, com os valores voltando ao normal, mas o impacto sobre os derivados continua. Enquanto o litro do leite longa vida caiu quase 15% em setembro nos supermercados de Porto Alegre, produtos como creme de leite e manteiga ficaram mais caros.
O queijo em fatias acumula alta de 29,5% desde o início do ano – percentual bem mais alto do que a inflação apontada pelo Índice de Preços da UFRGS (IPC/Iepe) no período, de 8,15%. O leite condensado subiu 6,4% no mês passado, e no ano a alta se aproxima dos 37%.
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Conforme o presidente do Sindicato da Indústria de Laticínios e Derivados do Estado (Sindilat), Alexandre Guerra, o descolamento de valores pode ser explicado pela data da fabricação. Parte dos produtos que estão nos supermercados foi embalada quando a matéria-prima ainda estava nas alturas.
– Em setembro, houve o pico de produção de leite no Estado e importação do Uruguai, e isso derrubou os preços da matéria-prima – afirma Guerra. – O reflexo nos derivados deve aparecer na chegada dos novos lotes.
Apesar da queda de quase 20% acumulada nos últimos dois meses, o leite ostenta alta de 41% no ano. A pesquisa de preços de outubro deverá apontar nova redução no preço, diz Guerra, já que na segunda quinzena de setembro chegou às gôndolas leite mais barato. Entretanto, o valor do litro, que nos mês passado estava em R$ 3,13, não deverá voltar ao nível de janeiro, de R$ 2,21.
– Se o preço voltar a esse patamar, a indústria e os produtores quebram – sentencia, argumentando que houve aumento de preços.
Maior vilão, carne tende a dar trégua
Os alimentos, em geral, que vinham subindo a galope desde o início do ano, têm dado refresco para o bolso dos porto-alegrenses: é o segundo mês seguido que os preços caem (declinaram 0,25% em agosto e 0,85% em setembro). Ainda assim, a alta acumulada desde janeiro é indigesta: 11,18%.
– Apesar da queda nos últimos meses, a alta nos alimentos é superior à inflação média de outros produtos e serviços em Porto Alegre, que está em 8,15% – afirma Everson Vieira dos Santos, coordenador da pesquisa IPC/Iepe da UFRGS.
Essa disparada tem vilões conhecidos da população. O feijão engrossa a dificuldade: já subiu mais de 70% neste ano, 7,1% em setembro. Como é produto essencial no cardápio do brasileiro, seu peso no orçamento é grande. Frutas e legumes continuam lá em cima – desta vez, foi o preço da banana que decolou.
Essas circunstâncias jogam o custo da cesta básica em Porto Alegre às alturas: conforme o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), a Capital tem a comida mais cara do Brasil. Para uma família porto-alegrense se alimentar durante um mês, precisa gastar pelo menos R$ 477,69. Os mesmos produtos (a cesta pesquisa itens como arroz, feijão, açúcar, óleo e leite) custam R$ 367,54 em Natal (RN).
– Há impacto do clima na produção dos hortifrúti, mas o que mais tem pesado na cesta dos gaúchos é a carne – afirma Daniela Sandi, economista do Dieese.
Embora seja potente produtor, o Rio Grande do Sul também exporta muita carne, o que reduz a oferta em um mercado de alto consumo. A qualidade do produto gaúcho é superior, o que também influencia os preços. Mas há uma boa notícia: o churrasco tende a ficar mais barato até o final do ano.
– Nos últimos meses, o preço da carne passou a subir menos, e a tendência é que o produto comece a chegar mais em conta nos supermercados nas próximas semanas – afirma Daniela.
O quadro de inflação, combinado com desemprego e endividamento, obriga consumidores a usarem criatividade para fazer o dinheiro render no supermercado. Kellen Martins, 29 anos, passou a trocar frutas e legumes que sobem demais, como banana e tomate, por opções mais baratas, e tirou do cardápio o feijão e a lentilha. De olho nos encartes promocionais, escolhe com cuidado o momento para ir às compras:
– Só vou em dia de promoção, e passo longe das marcas mais caras.