PhD em Economia pela tradicional Universidade de Chicago, Joaquim Levy ainda é um aprendiz na arte de fazer política. Perícia que desenvolve por necessidade. Respeitado no mercado, o ministro que conduz a recuperação das finanças do país teve de reforçar a articulação do governo no ajuste fiscal.
Aprimorar o jogo de cintura e medir o impacto político de gestos e falas são as principais lições que Joaquim Vieira Ferreira Levy tenta assimilar. A ausência no anúncio dos cortes do orçamento, na sexta-feira, dia 22, serve de exemplo.
Defensor de um talho de R$ 80 bilhões, acima dos R$ 69,9 bilhões definidos, ele discordou do colega Nelson Barbosa (Planejamento), faltou à entrevista coletiva e criou dúvidas sobre sua permanência na Esplanada. Para dissipar os rumores, na segunda-feira seguinte concedeu entrevista na portaria da Fazenda. Apesar do episódio, o ministro das "mãos de tesoura" segue forte.
- O mercado reagiria muito mal à saída dele - avalia um petista com trânsito no Planalto.
Leia todas as últimas notícias de Zero Hora
Aos 54 anos, Levy não pretende deixar a Fazenda pelos fundos. Quer consagrar a carreira construída entre mercado e poder público. Atuou no Fundo Monetário Internacional (FMI) e no governo de Fernando Henrique (PSDB), foi secretário do Tesouro com Lula (PT) e secretário da Fazenda do Estado do Rio de Janeiro, no governo do PMDB. Alto executivo do Bradesco, desligou-se do banco após o convite da presidente Dilma Rousseff para substituir Guido Mantega.
Escolhido pela eficiência em cumprir a meta fiscal capaz de recuperar a confiança dos investidores, o ministro logo entendeu que deve dosar a sinceridade. Em janeiro, afirmou que o modelo de seguro-desemprego estava "ultrapassado". Em fevereiro, criticou a "brincadeira" das desonerações, defendida por Dilma. No trabalho, mantém seu estilo maratonista. Às 6h, assessores recebem e-mails do chefe, que chega por volta das 8h30min à Fazenda e não costuma sair antes da 1h da madrugada.
Levy pretendia se concentrar à parte técnica do ajuste, mas parlamentares gostam de tratar com quem manda. Como é dele a chave do cofre, teve de entrar nas negociações para aprovar as medidas do ajuste fiscal no Congresso. Com dificuldade para ceder a argumentos políticos, tenta convencer deputados e senadores de que afrouxar o ajuste só atrasará a recuperação da economia.
A visão provocou discussões com o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e outros parlamentares. Afinado com o vice-presidente Michel Temer, o ministro se reuniu com diferentes bancadas. Parlamentares criticaram o tom "professoral" das explanações e elogiaram a cordialidade nas respostas.
- Foi sem conversinha de compadre, e ele respondeu tudo - diz o deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS).
As novas habilidades políticas do ministro auxiliaram na aprovação das medidas provisórias do ajuste no Senado. Terça-feira passada, alertado por Temer do risco de derrota, telefonou para seis senadores, que votaram com o governo. O empenho facilitou a missão de equilibrar as contas públicas, obsessão exposta em um quadro que Levy fixou à parede da sala de reuniões do seu gabinete. A mensagem fica à vista de quem lhe pede dinheiro: "Agora, o Brasil só gasta o que arrecada".
Nadar e velejar nas horas de folga
Acostumado a jornadas de trabalho que invadem as madrugadas, Joaquim Levy gosta de espairecer na água: entre uma braçada e outra na piscina ou em aprazíveis velejadas na Baía de Guanabara. O ministro mantém um pequeno barco no Rio de Janeiro, pouco utilizado desde que tomou posse na Fazenda, no início do ano. Já a natação, praticada desde a juventude, também auxilia a manter a forma do longilíneo Levy, um cinquentão de 1m93cm.
A sintonia com a água e a desenvoltura com números e raciocínios complexos conduziram Levy ao curso de Engenharia Naval na Universidade Federal do Rio de Janeiro. No mestrado e doutorado, decidiu singrar os mares da economia.
Há mais de duas décadas imerso em reuniões em gabinetes, o ministro contrapõe a rotina engravatada com passeios ao ar livre. Além de velejar, tem fascínio por estudar árvores - inclusive, iniciou um guia sobre as espécies do Aterro do Flamengo.
Avesso a extravagâncias, Levy vive em um flat em Brasília e mantém outro em São Paulo, espaços que também utiliza para trabalhar. A dedicação minimiza as saudades da mulher e das duas filhas, que moram em Washington (EUA).
Descrito como um sujeito bem-humorado, o ministro ainda encontra brechas na agenda para torcer (e sofrer) pelo Botafogo. Durante sua passagem pela Secretaria da Fazenda do Rio (2007 a 2010), tornou-se célebre no meio político a brincadeira do ex-governador Sérgio Cabral, diante dos infortúnios da Estrela Solitária:
- Quando o Botafogo perde é bom não pedir dinheiro a ele.