A temporada é de aromas e cores nas feiras e supermercados. Apetitosos, os pêssegos são uma cultura tradicional de Pelotas e do sul do Rio Grande do Sul, além de serem a fruta de maior importância econômica na região. Só nesta safra, devem movimentar até R$ 80 milhões, mas o volume financeiro envolvendo toda a cadeia, com grande força da indústria, chega a R$ 200 milhões ao ano, segundo Sindicato da Indústria de Doces e Conservas Alimentícias de Pelotas (Sindocopel).
Com a colheita já no fim, a expectativa de produtores e das indústrias é de uma melhora na economia brasileira no próximo ano para que a produção volte a crescer, já que a maioria dos produtores manteve os números de produção do ano passado.
O período da colheita começou em outubro e segue até janeiro, com a expectativa de alcançar 60 mil toneladas. Mesmo com condições climáticas positivas, o preço de venda da fruta é considerado baixo pelos produtores. Conforme dados da Emater-RS, o pêssego tipo 1, com melhor qualidade, está sendo comercializado a R$ 1,65 e o tipo 2, a R$ 1,45. Em relação à safra passada, o reajuste foi de 10%.
— O preço é insatisfatório enquanto o custo da produção aumentou. Queríamos um mínimo de R$ 1,80 para o tipo 1, pois os custos de produção subiram de 35 a 40% — avalia Mauro Scheunemann, presidente da Associação dos Produtores de Pêssego de Pelotas.
Atualmente, são cerca de 1,2 mil famílias produtoras como a de Scheunemann em Pelotas. Somente esse recorte gera cerca de 6 mil empregos no campo. A maioria dos produtores tem o negócio passado de geração a geração.
— Muita coisa mudou. Hoje temos máquinas ajudando e o trabalho se tornou mais tranquilo — compara Ondino, 72 anos, pai de Mauro, que trabalha também com a esposa, Elinda, e a nora Graciela.
A maior parcela do pêssego vendido pelos produtores de Pelotas tem como destino as indústrias. A região, que chegou a contar com 60 fábricas, hoje tem 13. Segundo números do Sindocopel, são produzidas 70 milhões de latas por ano, empregando 7 mil pessoas durante o período da produção.
Uma dessas fábricas está localizada na Colônia Francesa, no distrito rural do Quilombo, em Pelotas. A Doces Crochemore emprega 15 funcionários fixos, mas na época da safra esse número sobe para 80. Todos os trabalhadores são moradores de ruas próximas à fábrica. O regime de trabalho é intenso durante os meses de outubro a janeiro, quando é produzido todo o pêssego em calda da temporada.
O proprietário Paulo Crochemore explica que a dinâmica da sua fábrica é a mesma das demais: trabalha intensamente durante a safra, produz estoque e retorna ao trabalho no ano seguinte. Algumas empresas ainda aproveitam para utilizar os equipamentos na produção de figo ou abacaxi em calda no período de entressafra.
— Trabalhamos muito de outubro a janeiro. Depois, ao longo dos meses, vamos fazendo outras coisas, trabalhando até com outros produtos — explicou Crochemore, que está na terceira geração da empresa.
A década de 1990 impulsionou muito o desenvolvimento tecnológico das indústrias pelotenses de pêssego. As empresas se viram obrigadas a dinamizar os seus processos para sair em vantagem contra a concorrência de países sul-americanos. Ao conseguirem produzir mais pêssego em calda, em menos tempo, atualmente 90% do pêssego em calda consumido no país é produzido na cidade.
Ciência impulsiona a produção
Juntando a tradição ao desenvolvimento industrial, a cultura do pêssego em Pelotas ainda tem mais um ingrediente: a ciência. Ela se uniu ao produtor e deixou o pêssego com mais qualidade. Os trabalhos desenvolvidos pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) prolongaram a safra e auxiliam em diferentes dificuldades que os agricultores enfrentam.
O trabalho coordenado por Maria do Carmo Bassols Raseira, pesquisadora da Embrapa Clima Temperado, é reconhecido por produtores e pela indústria. Com o auxílio da modificação genética, foi possível ampliar a safra, que antes durava apenas 20 dias, para os atuais três meses. Além disso, novas qualidades de pêssego são desenvolvidas a cada ano.
— O melhoramento genético faz com que tenhamos a sensação de que somos artistas. Projetamos e depois colocamos em prática exatamente o que temos convicção. É um trabalho árduo que desenvolvemos durante todo o ano — explica a pesquisadora, considerada uma das grandes especialistas do pêssego no Brasil
Com 76 anos, Maria do Carmo trabalha há mais de 50 anos nas soluções sobre o pêssego. A sua função e a de seus colegas é muito minuciosa. Eles desenvolvem novas plantas em laboratório que podem ser mais resistentes ao clima ou as pragas. A partir disso, a Embrapa faz um trabalho junto aos produtores da região e oferece as mudas modificadas.
Pêssego em Pelotas
Os primeiros registros de pêssego em calda no Brasil citam Pelotas como cidade pioneira no século 19. Influenciado pela colonização francesa, o município se desenvolveu ao longo dos anos com o surgimento de agroindústrias na zona rural.
A partir de 1950, ocorreu um grande trabalho de melhoramento genético, capitaneado pelo pesquisador Sérgio Sachs. Nessa mesma época, houve a instalação de grandes processadoras de doces e conservas na região. A produção teve o seu ápice na década de 1970, quando havia mais de 50 empresas.