A domesticação das plantas influenciou a evolução vegetal e determinou, por meio das migrações humanas, que a maioria das poucas plantas cultivadas o sejam longe do seu local de origem e de consumo. Segundo a FAO (Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura), a produção de alimentos vegetais para o homem baseia-se em não mais do que 150 espécies, num universo de cerca de 130 mil comestíveis. Mais de 90% das calorias que a humanidade consome provém de apenas 30 plantas. E, de modo geral, a pesquisa tem sido direcionada basicamente ao aumento da produtividade dessas espécies mais do que ao aumento da diversidade de culturas por meio do recrutamento e uso de novas espécies, sobretudo locais. Essa concentração de esforços em poucas espécies torna a indústria de alimentos e as populações humanas mais suscetíveis aos estresses associados com mudanças globais. Além do mais, o aumento da produtividade das atuais culturas, baseia-se em práticas agrícolas intensivas associadas com altos custos ambientais.
A agricultura hoje tem a responsabilidade de atender a crescente demanda de alimentos e, ao mesmo tempo, suplantar as mudanças climáticas que incluem alterações na frequência e intensidade das precipitações e aumento da ocorrência de secas. E tudo isso diminuindo o uso de agroquímicos.
O uso comercial de novas culturas e plantas selvagens teria potencial, por meio da diversificação e da adaptação local, de tornar a produção de alimentos mais sustentável e resiliente. Isso sem falar em outros usos possíveis como medicinais, ornamentais ou para forrageamento de animais (abelhas e herbívoros). É o caso das mais de 600 plantas forrageiras nativas do Bioma Pampa para uso na formação de pastos cultivados e regeneração dos pastos nativos degradados.
É também o caso de muitas produtoras de raízes e tubérculos e das centenas de frutos de que dispomos localmente como araticum, araçás, banana-do-mato, butiá, feijoa, goiaba serrana, guabiroba, juçara, pinhão e pitanga, apenas para citar algumas das mais de 200 espécies que possuem frutos ou sementes alimentícias.
Em suma, temos plenas condições de usar mais produtos locais provendo dietas diversificadas e saudáveis, mantendo a biodiversidade e diminuindo a pegada ecológica (sobretudo do transporte) das grandes monoculturas. Mas temos que reaprender a valorizar esses produtos e, mais importante, estimular sua produção, pois essa maravilhosa diversidade está associada à não menos rica diversidade cultural daqueles que conhecem, convivem e entendem a importância ecossistêmica desses produtos e de suas muitas funcionalidades que vão além de simplesmente prover alimento. Para isso necessitamos quebrar paradigmas repensar os modelos de produção agrícola e sua distribuição territorial.
Carlos Nabinger é mestre em Fitotecnia e doutor em Zootecnia, professor da Faculdade de Agronomia da UFRGS
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