"Passei atrás dele, minha parte eu fiz". "Curti um story, minha parte eu fiz". "Adicionei nos 'close friends' do Instagram, minha parte eu fiz". O meme, que ganhou repercussão nas redes sociais nos últimos meses, é sobre a falta de habilidade para a paquera, que gerou identificação em muita gente.
Porém, a diversão coletiva com a própria dificuldade em demonstrar interesse acabou levantando também um questionamento: será que estamos desaprendendo a flertar?
Fizemos essa pergunta aos seguidores do Instagram de Donna e as respostas demonstram que, sim, as redes sociais influenciaram uma mudança na dinâmica das relações. E isso tem deixado muita gente confusa na hora da conquista.
O que eu faço com esse "like"?
As "novas linguagens" para demonstrar interesse (e suas possíveis interpretações) na internet foram as principais menções delas no que diz respeito às dificuldades na hora de flertar.
"Quem acredita que uma curtida é flerte está perdido, mas, de fato, todo mundo anda com preguiça de investir, pelo que vejo", opinou uma.
"Até recentemente tentei flertar via rede social com uma pessoa bem interessante e que tinha tudo pra dar certo, mas ele não entendeu minhas indiretas e desisti", contou outra.
"Talvez, não desaprendendo, mas não sabendo exatamente, neste momento onde a paquera acontece mais pelas redes sociais", apontou uma terceira.
— A comunicação afetiva se adapta a cada período histórico e à cultura em que ela está inserida. Como o mundo "ciber" faz parte da nossa vida na atualidade, a "comunicação ciber" também faz parte tanto da comunicação geral como da afetiva. Os significados que as ações nas redes sociais acabam adquirindo vão sendo construídos com o passar do tempo — avalia a psicóloga e sexóloga Lina Wainberg.
— Às vezes, a compreensão do que uma curtida significa, ou uma "não-curtida", varia muito de pessoa para pessoa. Eu não diria que nós estamos desaprendendo a flertar, mas que o flerte está se transformando. Ele tem outra linguagem, outra forma de se expressar — conclui.
Ao vivo é melhor!
"Se eu dependesse de uma curtida, nunca teria casado... Meu love, na época, nem Orkut tinha... Foi na cara, na garra e na coragem! Ao vivo e a cores", relatou uma seguidora bem-humorada.
E ela tem um ponto. De acordo com a psicóloga, a proteção das telas faz com que os flertes se tornem menos verdadeiros.
— Estudos têm mostrado que a forma como a gente reage a algo que nos agrada ou desagrada difere quando é através da tela ou pessoalmente — diz ela. — O que ocorre ao vivo envolve mais, porque tem mais informações da expressão facial, corporal, entonação de voz, olho no olho. O envolvimento é maior, porque a tela faz com que as pessoas não estejam tão incorporadas à cena.
Lina ainda ressalta que a promoção de valores como individualidade, performance e velocidade tem feito com que os flertes sintam a pressão de ser mais "eficientes". Com isso, também são descartados com mais facilidade.
— A proteção que a tela do computador ou celular dá faz com que as pessoas se sintam mais encorajadas a ações que no face to face, muitas vezes, elas não teriam — pondera.
Consentimento em primeiro lugar
A interação no perfil de Donna também contou com algumas participações masculinas. Nos comentários da publicação, um seguidor revelou um receio. "A real é que, dependendo de quem vem, é assédio. Os homens também estão com medo", publicou ele.
Esse comportamento também é apontado pela psicóloga como consequência de as mulheres não aceitarem mais as "cantadas clássicas".
— Existe uma mudança cultural de valorizar o consentimento. Isso vem mudando o limite entre as relações. Mesmo para um flerte, é importante perceber se existe um olhar de interesse. Se é um flerte respeitoso, que possa ir sentindo se há espaço para mais ou não. A "velha cantada" agora é vista como uma agressão quando não há um sinal de consentimento — afirma Lina.
*Produção: Luísa Tessuto