Massagem tântrica, mandala lunar, cristais vaginais, aulas de burlesco. O tabu do prazer feminino ainda é tão grande no Ocidente que leva as mulheres a tradições de outras culturas ou outros tempos em busca de novas formas de cultivar sua sexualidade.
A professora de sociologia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul Raquel Weiss, 38 anos, não precisou sair de Porto Alegre para ter contato com algumas dessas vivências e iniciar uma pesquisa sobre o que ela chama de terceiro momento na história da sexualidade feminina.
Os dois primeiros formam uma trilha de períodos opostos. Depois de viverem uma educação repressora, as mulheres passaram a sentir uma pressão dupla: ser a responsável pelo prazer do outro e chegar ao orgasmo.
A pesquisadora estuda como valores socialmente compartilhados impactam ações individuais – e um dos temas mais regulamentados pela moral é a sexualidade. Por ser um tabu, uma das maiores fontes de informação sobre sexo acabou sendo a pornografia, orientada à satisfação do homem, destaca Raquel.
Onde está o prazer feminino, afinal? O que é sexo para elas? A partir de conversas com outras mulheres, a professora percebeu que tais questionamentos não eram só seus. E foi a ausência de uma formação para a satisfação sexual delas na cultura ocidental que a levou a espaços de tradições como o tantra, o taoismo e outros que dão atenção ao prazer da mulher.
– Com a globalização, tivemos acesso a novas informações, troca de experiências, pessoas viajando pelo mundo. Só em Porto Alegre, tem vivências de Índia, China, Peru – conta a professora.
Os questionamentos e a proliferação de propostas diferentes para lidar com o prazer da mulher formam esse terceiro momento, segundo a pesquisadora. Raquel entende que sexo não é só algo que “simplesmente acontece”, mas uma “forma de arte” que você desenvolve. Há saberes transmitidos entre gerações, coisas que se pode aprender para a experiência sexual ficar mais interessante.
– Mas se você não está aberta para o prazer, as técnicas não servem para nada – alerta.
Além do orgasmo
As experiências estudadas por Raquel expandem a noção de prazer feminino para além do orgasmo. São vivências que trabalham a feminilidade e entendem o prazer como parte fundamental da identidade feminina. Um caminho que passa pelo autoconhecimento e pela transformação da ideia de prazer como algo restrito à relação sexual. As vivências alquímicas, por exemplo, que entendem o sexo como uma troca energética, ensinam que o erotismo está na conexão com todas as esferas da vida.
– Você precisa ter o corpo aberto ao prazer. A uma comida gostosa, à luz do sol, a respirar. Sem isso, você chega em uma experiência sexual com o corpo muito enrijecido, travado – explica Raquel.
Você precisa ter o corpo aberto ao prazer. A uma comida gostosa, à luz do sol, a respirar. Sem isso, você chega em uma experiência sexual com o corpo enrijecido, travado.
RAQUEL WEISS
Professora da UFRGS
Outra barreira que precisa ser derrubada é a de que masturbação se faz apenas quando não se tem um parceiro ou parceira. Na tradição taoista, conta a professora, a masturbação é chamada de “prática de autoaperfeiçoamento”. Os taoistas defendem que você não pode esperar que o outro saiba o caminho do seu prazer se você mesma não o explorou.
Depois de quatro anos de investigações, Raquel tem uma única preocupação: que essa busca se torne mais uma tarefa a ser cumprida na rotina da mulher contemporânea, cujo estilo de vida não contribui para encontrar o prazer. O mercado de trabalho é hostil, há sobrecarga de atividades domésticas e qualquer minuto que sobra entre uma tarefa e outra é preenchido pelo smartphone.
Raquel alerta para que as mulheres não entrem na paranoia de se inscrever em um milhão de cursos para reencontrar seu prazer e transmite uma lição aprendida com Trinidad Aguilar, antropóloga colombiana que vive em Porto Alegre e oferece oficinas sobre as tradições das curandeiras andinas:
– A mulher precisa aprender a contemplar. Sem a contemplação não se acessa nenhum tipo de prazer.