Neste sábado (3), estreia no canal do Youtube do Grupo Ìwà o espetáculo Yèyé (“mãe”, em iorubá), voltado aos desafios da maternidade durante a pandemia. Dirigido, produzido e roteirizado pela atriz gaúcha Josiane Adriana Acosta da Rosa, artisticamente chamada de Josy Acosta, de 37 anos, Yèyé é fruto do projeto do Grupo Ìwà Mama África, que começou em uma data próxima ao nascimento de Maisha Bárbara, filha de Josy. Agora com um ano e quatro meses, a menina já foi inspiração para a arte voltada às mães, e também acompanhou Josy em todo o processo de criação do projeto.
Conversando com a ancestralidade negra e africana, Yèyé se propõe a passar adiante as histórias contadas pela griote Vovó Cici sobre os arquétipos femininos de orixás. A personagem escolhida para nortear a narrativa foi Nanã, figura que representa “a mãe do ser-humano” nas religiões de matriz africana.
— Pedi à Vovó que contasse histórias que versassem sobre mulher-guerreira, mulher-encantamento e mulher-mãe. Depois, entrei em sala de ensaio com o professor Negrizu, arte-educador e coreógrafo da Escola Olodum, para trabalhá-las corporalmente e, só então, o roteiro surgiu — conta a mestre em Artes Cênicas — Acabou juntando tudo: uma homenagem à Vovó Cici, que é uma contadora de histórias aqui do bairro, uma homenagem à Nanã, que é a mãe primordial, a mãe ancestral do ser humano.
Morando em Salvador há 10 anos, a atriz, que já participou do grupo porto-alegrense Ói Nóis Aqui Traveiz, aproveita a riqueza cultural que sua atual cidade, e em especial seu bairro, Engenho Velho de Brotas, possibilita. Com a criação de seu projeto, Josy quis fornecer à população local uma possibilidade de geração de renda.
— Para além de toda essa questão religiosa, para mim era importante que movimentasse a economia do bairro — comenta — É um bairro essencialmente cultural, então era importante dialogar não só com os espaços culturais, mas com os artistas. Fiquei pensando: que espetáculo fazer? O que oferecer para esse público, já que a gente está tão distante fisicamente e as apresentações são online?
Durante a criação do Mama África, após uma convocatória pública, Josy conversou com 20 mães de três estados brasileiros, Rio Grande do Sul, Bahia e Santa Catarina, com quem trocou experiências sobre a maternidade em tempos de pandemia. Para além de um simples bate-papo, o momento de desabafos acabou se transformando em um grupo de apoio no qual elas se sentiram confortáveis para contar suas dificuldades e sentimentos neste período singular.
Josy reforça a intenção de acolhimento que conduz o Mama África ao dialogar com estas experiências e dar espaço às questões que angustiam essas mulheres:
— É um projeto feito dessa mãe e atriz para outras mães. A minha forma de me aproximar delas foi presenteá-las com uma camiseta para elas e uma para os bebês — conta. — Quando terminarem de assistir, elas vão abrir os presentes que ganharam e ver que um pedaço do espetáculo está com elas, que fazem parte deste processo. E o quanto é bom a gente que é mãe ser abraçada, acolhida e presenteada, né?
Papo de mãe
Nos encontros entre as mães, alguns temas apareceram com frequência, como o sentimento de solidão, mesmo entre aquelas que contam com uma rede de apoio presente. O cansaço também foi uma questão frequente destas mulheres, que por vezes conciliam as tarefas domésticas com a maternidade. No entanto, as conversas não foram feitas apenas de pontos a serem melhorados, mas também geraram reflexões sobre os novos momentos que se surgiram para cada uma delas.
As participantes responderam à seguinte questão: “Em uma frase, diga como você definiria (ou qual o sentimento de) ser mãe na pandemia. Não pense muito, escute seu coração”. “Malabarista! Vivo no constante equilíbrio entre transbordar de amor e de cansaço”, “É preencher as incertezas com afeto e sabedoria”, “Um misto de força, fé e fragilidade imensa” e “Esperança por dias melhores” foram algumas das respostas.
O espetáculo Yèyé fica disponível no canal do Youtube do Grupo Ìwà até o dia 10 de abril. Dividem o palco com Josy os músicos Juliana Almeida e Gabriel Carneiro, que produzem os arranjos com Pedro Acosta. As composições são de Toni Edson. O projeto Mama África, vencedor na categoria Teatro do Prêmio das Artes Jorge Portugal, é apoiado pela Secretaria de Cultura e da Fundação Cultural do Estado da Bahia por meio da Lei Aldir Blanc, encaminhada pela Secretaria Especial da Cultural do Ministério do Turismo, do Governo Federal.