Começou a estudar psicanálise e parou. Foi então para a Suécia. Trabalhou em Uppsala, depois em Varsóvia e por fim em Hamburgo, como diretor do Instituto Francês. Após um tempo como professor de psicologia e filosofia na França, passou três anos lecionando na Tunísia. Em 1968, participou de uma universidade experimental em Vincennes e se engajou em muitas ações políticas. De 1970 até sua morte, em 1984, foi professor de História dos Sistemas de Pensamento em Paris, passou um pequeno período em Berkeley e também no Japão, onde se dedicou ao zen-budismo.
Esse é um pedacinho do currículo do filósofo Michel Foucault. A exemplo dele, eu adoraria trabalhar numa faculdade de um país, depois no jornal de outro país, ser professora numa universidade europeia, me engajar em movimentos na África, fazer um doutorado nos Estados Unidos e um retiro espiritual num ashram. Mas teria que carregar a família junto.
Cada vez que leio sobre pessoas que viveram inúmeras experiências mundo afora, fico imaginando quantas outras não gostariam de fazer o mesmo, mas quem vai levar o filho no colégio, quem vai dar atenção à mãe doente? Não dá para simplesmente chutar o balde e virar as costas. Por isso é tão importante a gente se perguntar, ainda no início da vida adulta, o quanto estamos dispostos a negociar nossa liberdade.
Desde cedo, percebi minha inclinação para viver solta, mas não quis abrir mão de ser mãe. Acreditava que a intensidade deste envolvimento amoroso seria a maior das aventuras, meu profundo mergulho emocional. Então respirei fundo e embarquei na maternidade, acreditando que mais adiante, com filhos adultos, voltaria à liberdade possível, sem me dar conta de que esse momento coincidiria com o envelhecimento dos meus pais. E agora?
Agora, gracias a la vida. Familiares e amigos íntimos são espelhos que reforçam nossa identidade. Raízes prendem, mas também fortalecem. Posso viajar, trabalhar, amar, posso o que eu quiser, ainda que não usufrua 100% do meu livre-arbítrio. Para mim, que nasci com longas asas, não é muito fácil, mas foram escolhas bem pensadas. Como dizia Foucault, precisamos resolver nossos monstros secretos, nossas feridas clandestinas, nossa insanidade oculta, e o desejo de ser livre faz parte disso, mas liberdade não é apenas ir e vir.
Optei pelos vínculos afetivos como conforto contra a passagem do tempo e para povoar minha existência de sentimentos mais generosos do que apenas o egóico amor por si mesmo. Já que não dá para ser uma globe-trotter o tempo todo, viajo através da minha força criativa e do meu pensamento, que foi desobstruído pela leitura e atravessa qualquer fronteira. Temos um ano inteirinho pela frente. Não importa em que condições, que sejamos todos livres, cada um traçando seu próprio plano de voo.