Exposição a céu aberto no centro de Porto Alegre, 26 escritores gaúchos pintados por 26 artistas plásticos, evento que celebra a tradicional Feira do Livro, que está em curso. A cidade ganha cor, homenageia seus autores, oferece arte gratuita aos pedestres e aí vem um zé mané e faz o quê? Vandaliza o retrato do papa da crônica brasileira, Luis Fernando Verissimo. Depois que a obra original foi substituída por uma cópia, o sem-noção voltou lá e danificou a cópia também. Os organizadores acionaram a Polícia Civil e parece que não foi uma molecagem aleatória, e sim um ato com implicações políticas. Que vexame.
Sem mudar de assunto, li o recém-lançado livro de Chico Buarque (Anos de Chumbo e Outros Contos), uma joia literária, e o do Gregório Duvivier (Sonetos de Amor e Sacanagem), original e divertido, e, em meio ao meu entusiasmo, lembrei de um sujeito que recentemente me mandou um e-mail dizendo que não respeito meus leitores quando indico certos livros (aludindo a um autor da periferia que andei elogiando). Imagino que este leitor esteja agora bufando: o segundo parágrafo da coluna nem terminou e já citei o nome de três escritores comunistas, só posso estar de provocação.
Comunista virou um adjetivo aplicado a quem faz trabalhos de qualidade, produz cultura, está em sintonia com o mundo real e propõe a expansão do pensamento, mas que não pode ser admirado às claras. A extrema-direita caiu numa cilada: hoje se vê na obrigação de odiar aqueles que mantêm o país refletindo, pulsando, avançando. Que mico.
Claro que tem gente que, mesmo apoiando o inquilino inominável do Planalto, reconhece o valor dos nossos artistas, sem misturar alhos com bugalhos, mas ainda assim é um constrangimento, vai dizer. Ter que ouvir a Fernanda Montenegro ser chamada de sórdida por alguns ignorantes e engolir em seco diante deste despautério. Ver uma rapaziada com titica de galinha na cabeça desprezar Caetano Veloso e fingir que isso não é um sintoma sério da decadência do país.
Não queria estar na pele de quem já não se permite aplaudir de pé o talento e a contribuição gigantesca de tantos músicos, atores, escritores, fotógrafos e humoristas que injetam sensibilidade e reflexão em nossas rotinas repetitivas, que nos tornam respeitados aos olhos do mundo, que nos emocionam e nos fazem dançar, sorrir, sonhar. Que sinuca: como reconhecer o brilhantismo de quem se posiciona contra o mito de araque a quem a criatura ainda defende? Tem um hiato aí que incomoda. Então o jeito é desmerecer os grandes a fim de não parecer tão pequeno. Uma humilhação.
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Neste sábado, alegria, alegria, volto a encontrar meus leitores na Feira do Livro de Porto Alegre. Às 17h30min, lanço Noite em Claro Noite Adentro, mas leve também A Claridade Lá Fora, o romance que não pude autografar ano passado. Te vejo lá – de máscara, mas com os olhos em festa.