Cada vez mais mulheres estão desapegando da necessidade de pintar os cabelos quando os fios começam a perder a cor. Afinal, qual é o problema de assumi-los maduros e naturais?
Antes vista como rebeldia ou até desleixo, a atitude agora já é encarada por muitas como novo estilo de vida. Essa libertação feminina também gerou uma demanda nova no mercado da beleza. Os salões percebem novas clientes querendo fazer a transição ou a manutenção dos brancos.
A seguir, duas mulheres que abandonaram a tintura de vez contam como tomaram a decisão e por que se sentem muito mais felizes agora:
"Não tem um dia em que eu saia na rua e não elogiem meu cabelo"
Mafalda Panattieri, 69 anos, é professora de ioga, atriz e modelo nas horas vagas. Começou a pintar os cabelos aos 13, quando, por alguma questão genética, já tinha fios brancos e incomodava-se com as piadas que ouvia no colégio. Até os 35, ela tingiu interruptamente os fios, exceto durantes suas duas gestações.
Em 1986, porém, teve algum tipo de reação alérgica ao produto e sentiu-se repentinamente muito mal com o cheiro da tinta. Resolveu passar as tesouras e deixou o cabelo bem curtinho. No outro dia, raspou a cabeça. Aos 35 anos, assumiu seu cabelo natural e explica por que:
– A tinta é muita escravidão, muita química no corpo.
Depois de mais de três décadas convivendo com os fios brancos, Mafalda acredita que, hoje, seu cabelo faz parte de sua identidade:
Dá para ser bonita com rugas, peso, cabelo branco".
MAFALDA PANATTIERI
– Quando vou me encontrar com alguém, nem preciso dizer onde eu estou, sou fácil de localizar (risos). Não tem um dia em que eu saia na rua que não elogiem meu cabelo. Pessoas de todas as faixas de idade acham bonito, inclusive mulheres que pintam dizem que sonham em ter um cabelo como o meu – afirma ela.
Diferente de tantas mulheres, essa foi uma decisão tranquila para Mafalda. Com serenidade no rosto, demonstrando uma personalidade ínfima, ela afirma:
– Para mim foi muito fácil. Adoro meu cabelo, é livre. Aceitação é tão lindo. Hoje eu já não entendo quem pinta. Minha dica para quem quer parar de pintar é cortar, para deixar crescer. Dá para ser bonita com rugas, peso, cabelo branco.
"Qual é o problema de ficar mais velha?"
Muitos fatores levaram Stela Rates, 57 anos, escritora e professora da Faculdade de Farmácia da UFRGS, a optar pela transição. Morena desde que se entende por gente, começou a odiar o resultado quando iluminava seus fios para disfarçar os brancos. Ela também não é muito fã de salões de beleza - compromisso que cumpria mais ou menos de 20 em 20 dias para retocar a coloração. Além do custo financeiro, ela acrescenta.
Por isso, há três meses Stela iniciou o processo de transição. No entanto, ela admite que nem sempre é fácil manter a autoestima elevada:
– Acho que estou adentrando agora na fase mais difícil, estou com mais ou menos quatro centímetros da parte grisalha. Por enquanto estava dando para disfarçar com um coque ou uma tiara. Daqui pra frente não tem muito mais como. Em alguns momentos eu fico insegura. (...) Não é só uma questão estética, tem uma questão de identidade – aponta.
Entre dúvidas e julgamentos, Stela reflete sobre a questão de ser mulher em uma sociedade que não aceita a decisão feminina de ser natural:
Deixar o cabelo grisalho é um pouquinho de resistência. Ao direito de envelhecer, ao direito de ser bonita fora do padrão".
STELA RATES
– As pessoas olham, muitas dizem: " Tu é uma mulher tão bonita, tu vai ficar tão mais velha". E me incomoda. Qual é o problema de ficar mais velha? Será que eu vou deixar de ser bonita se eu tiver o cabelo grisalho? – questiona.
Para Stela, aceitar os cabelos grisalhos faz parte de um processo de busca de liberdade e contra a pressão social pela juventude eterna, especialmente em relação às mulheres:
– O meu marido tem o cabelo completamente branco e todo mundo acha lindíssimo. Como assim pra ele é lindo e para mim não? Vou até o fim porque sou muito obstinada. Quero ver como é o meu cabelo grisalho e como eu fico com ele. Procuro ter a tranquilidade de pensar que não devo nada nem pra mim nem para ninguém: se eu não gostar, eu pinto. É só um cabelo. Deixar o cabelo grisalho é um pouquinho de resistência. Ao direito de envelhecer, ao direito de ser bonita fora do padrão.
Como cuidar dos fios brancos e grisalhos
Donna conversou com Ana Paula Caramori, médica dermatologista da Sociedade Brasileira de Dermatologia, e com Guilherme Araújo, hair stylist no Espaço Leo Sampaio, para descobrir quais são os cuidados necessários para tratar o cabelo grisalho ou branco de forma adequada.
Transição é fase mais difícil
Tomar a decisão de abandonar a tintura pode ser difícil, mas depois inicia o momento mais chato do processo: a transição da cor de quem pinta e quer parar. O cabelo fica com aquela marca, que vai crescendo conforme você não retoca a raiz, e assim o contraste de cor fica cada vez mais aparente.
A solução para esse impasse, segundo Guilherme, está nas mechas claras e inversas.
– A ideia é diminuir esse contraste entre os fios sem e com pigmento: o cabelo é pontualmente colorido só para quebrar aquele excesso de tinta. Com o tempo, a pintura vai deixando de ser necessária – explica.
Para o profissional, essa etapa é crucial para que a cliente não desista:
– Já vi muitos casos de clientes que começaram e não conseguiram seguir porque não fizeram a transição – afirma.
Hidratação específica
Segundo a médica e o cabeleireiro, não tingir os cabelos é realmente mais saudável. A química estraga a haste e faz com que ela perca proteína. A questão é manter os fios bem hidratados.
O cabelo branco, por ter um processo de queratinização diferente do colorido, tende a ser mais duro e, por isso, é preciso hidratar mais. Para que ele se mantenha saudável, é recomendado fazer hidratação uma vez por semana, e de preferência com agentes emolientes - produtos à base de óleos e silicone -, que realmente devolvem a umidade para o fio, afirma a médica.
– Existem pesquisas que dizem que a cutícula do cabelo branco vem mais espessa, como se fosse um cabelo modificado geneticamente. É como se a natureza fizesse ele vir mais grosso para proteger o organismo de alguma maneira. Ele é um cabelo grosso, com frizz e rebelde, e precisa de tratamentos específicos – resume Guilherme.
O hairstylist ainda alerta: é indispensável o diagnóstico de um profissional:
– É importante entender que não é a mesma hidratação para todo mundo. A gente usa óleo de argan, por exemplo, para cabelos com a textura média, e um óleo mais espesso, como o de abacaxi, para os fios mais grossos e rebeldes, para ter uma ação anti-frizz maior.
Para quem tem a pele negra, é necessário uma atenção especial: o fio tende a ser mais sensível, fino e delicado. Sendo ele branco ou pigmentado, isso já exige um cuidado maior na hora da hidratação.
Proteção solar e térmica para não amarelar
Os brancos e grisalhos têm menos melanina, e por isso são mais sensíveis à radiação solar. Quando o fio entra em contato com a luz do sol, há oxidação da fibra capilar, o que amarela o cabelo.
Para evitar o transtorno, é importante usar métodos de proteção físicos, como boné e lenço, e também produtos com filtro solar e proteção UV.
Quem faz escova ou utiliza ferramentas de calor com frequência precisa de produtos que protejam dessa alta temperatura. É indicado o uso de produtos específicos anti-amarelamento, como xampus e condicionadores silver, que são azulados/arroxeados. Esses pigmentos grudam na haste e neutralizam a cor, deixando o tom mais perolado e prateado.
Outro fator que pode amarelar o cabelo é o cigarro, principalmente a nicotina.
Por fim, além da piscina e do mar, a própria água do chuveiro também pode acabar amarelando os fios. Toucas de silicone são boa opções nesse caso.