A despeito de sua variada culinária, o Peru se tornou conhecido, globalmente, pelo ceviche. A Itália, com uma brutal diversidade regional, ganhou o mundo por meio do macarrão e seus molhos. Raciocínio semelhante pode ser estendido a outros países. Receitas icônicas, pratos-bandeira, portanto, ajudam a difundir tradições nacionais (e, em contrapartida, também reforçam certos clichês). Mas e o Brasil? Qual é o nosso maior estandarte nas mesas internacionais?
Haveremos de encontrar os partidários da feijoada, os entusiastas do churrasco, os apóstolos de quindins e brigadeiros. Do meu lado, se eu pudesse escolher, gostaria que cozinheiros de outras terras se esbaldassem com as nossas farofas. Percebessem que seu potencial vai muito além da guarnição, tendendo para a força de um prato, por si só. Que existem variantes de textura, de umida de, no crocante, nas gorduras utilizadas e nos temperos.
Muita gente por aqui é capaz de explicar as nuances das farinhas de trigo francesas e italianas, suas distintas moagens e seu índice de cinzas. Porém, não conhece muito bem as maravilhas da farinha de mandioca, seus pontos de torra diferentes, seu poder de espessamento, sua granulação e todo um universo de farofas que pode ser derivado a partir daí.
Para o leitão assado, para o churrasco, para o feijão, para comer pura... Não é incrível que um singelo subproduto do mais brasileiro dos ingredientes (a mandioca perpassa todo o território nacional) nos renda tantas alternativas? Eu voto a favor dela e, em um trabalho de formiga, não perco a chance de exaltá-la toda vez que um estrangeiro me pergunta sobre o que é essencial provar estando no Brasil. Pois é a farofa.
Nota final: A gastronomia perdeu um de seus maiores cozinheiros nesta semana. O francês Alain Senderens marcou época por sua cultura, por ser um precursor do chef enquanto pensador e personagem público; um pioneiro dos menus harmonizados com vinho; e pela atitude de “devolver” as estrelas recebidas para o Guia Michelin.