*Texto por Luiz Américo Camargo, crítico gastronômico e autor do livro Pão Nosso
Para alguns, pode soar como modismo gourmet, mas não é. Defendo que se trata justamente do contrário: é uma volta à essência, é uma busca por conciliar simplicidade com alta qualidade. Do que estou falando? De pizza.
Nos últimos tempos, um número crescente de pizzarias e pizzaiolos têm retomado a trilha do cânones italianos e restaurado o que há de elementar na especialidade: massa leve e bem fermentada, molho de puro tomate, coberturas harmoniosas e distribuídas sem exagero. Pizza não é para ser pesada, nem para subjugar maxilares e papilas com excessos de queijos e afins. É a possibilidade de uma refeição saborosa, digestiva.
Tomemos, por exemplo, o panorama de São Paulo, com seu alto consumo diário de redondas. Casas decanas, como Castelões e Speranza, que ajudaram a moldar um estilo local no Século 20, continuam a todo vapor, com exemplares mais densos e fartos. Da mesma forma que outro ícone, a Camelo, com sua pizza fininha e crocante (uma proposta tipicamente paulistana), também permanece influente. Contudo, é curioso observar que uma nova geração, representada pelos fornos da Leggera, da Carlos, do Eataly, do Forquilha, da Bráz Trattoria, se estabelece no mercado trazendo novos ares, com aromas e sabores que evocam de forma muito mais fiel a escola napolitana.
Tenho para mim que essa vertente mais moderna (que, na verdade, é tradicionalista), aos poucos, será capaz de difundir de vez o hábito da pizza muito bem assada, individual, por vezes como opção de almoço. E de demonstrar que uma boa redonda se faz com matéria-prima de primeira e técnica adequada – não com exuberância irracional de recheios, nem com ingredientes bizarros (tenho trauma de invencionices, como pizza de estrogonofe).
Pizza boa tem muito mais a ver com gastronomia do que com gourmetização. Só depende de farinha adequada, tomates maduros, queijos e embutidos de qualidade, forno a lenha lá pelos 400 graus e, claro, de um pizzaiolo com paixão e bom senso. Fosse um filme, eu diria que a receita se vale de roteiro, fotografia e atuação, dispensando efeitos especiais.