Fernanda Montenegro se tornou, em 2019, um símbolo da resistência cultural. Com
90 anos de idade, a atriz conta com orgulho que já viveu diversos momentos políticos nos quais a arte foi colocada em um pedestal e, também, no fundo do poço. Por conta disso, Fernanda aparenta tranquilidade ao dizer que fazer cultura no Brasil sempre foi um esforço.
— Apesar das crises particulares brasileiras, sempre sobrevivemos, somos inarredáveis, é um processo de vocação, não se pode viver fora dessa área — afirmou a atriz em entrevista ao programa Timeline Gaúcha desta terça-feira (17).
A atriz considera que um dos erros do Brasil foi separar a cultura da educação. Para ela, não existe sociedade sem o lado artístico. Durante o bate-papo com os jornalistas Kelly Matos e David Coimbra, Fernanda Montenegro afirmou que a arte é um mercado de trabalho e o processo cultural também é produtivo:
— Não é só uma frescura que só custa ao Estado e não volta nada. Até o pipoqueiro, o guardador de carro, está ganhando em cima da arte. Quando acaba um filme, vem toda aquela lista de gente (se referindo aos créditos), conta ali quantas pessoas tem? Tudo aquilo é resultado e ganhou algo daquele produto técnico e artístico.
E completou:
— O espectador que sai de casa para ver um filme, uma peça, uma exposição, está usando um carro, um táxi, gastando gasolina para chegar lá, e quando chega lá todo aquele prédio foi construído com mão de obra especializada. Nada colabora mais com o emprego do que a cultura.
A atriz também rebateu as críticas à classe artística, que foi colocada como alvo de acusações por uso de recursos financeiros públicos, seguido de cortes na área cultural promovidos pelo governo de Jair Bolsonaro. Sobre os ataques que sofreu recentemente,
a artista se limitou a dizer que "isso não sou eu":
— Há uma visão de que somos supérfluos, de que somos milionários, de que vivemos à custa dos governos...
E justamente tudo isso cai em cima do ator.
Há pouquíssimos atores que são empresários, e empresário é uma palavra fortíssima.
Ao ser questionada sobre o melhor período em que viveu para a área artística, Fernanda Montenegro ressaltou que não é só a cultura que vive um momento de marginalidade, mas também outras áreas necessárias para a população, como a educação.
— No tempo dos militares, o processo era político e ideológico. Mas, mesmo nesse período, a minha geração viveu da bilheteria, o expectador pagava o seu trabalho. No meu caso e da minha geração, nós criamos nossos filhos com o espectador vindo nos ver, prestigiando e pagando pelo nosso trabalho — contou. — Por mais que nos ataquem, nos desprestigiem, vamos sobreviver, é o nosso ser brasileiro. Vamos acreditar na ressurreição.