Um ditado popular muito antigo diz que o modo como uma pessoa vê Deus diz muito mais sobre ela do que sobre Ele. Esta teoria é bem exemplificada nos personagens de O Escolhido, nova série da Netflix, lançada na última sexta-feira. Com um clima de suspense, a produção promove um embate entre a fé e a medicina.
Para falar sobre esta dualidade, a trama começa com três jovens médicos – Lúcia (Paloma Bernardi), Enzo (Gutto Szuster) e Damião (Pedro Caetano) – que são enviados a uma cidade isolada do Pantanal. Eles precisam aplicar a vacina contra uma mutação do vírus zika em cada um dos moradores, após uma série de notificações do governo.
A missão, que parece simples, torna-se uma dor de cabeça: os locais não acreditam na medicina tradicional e se negam, em um primeiro momento, a receberem a dose. Eles confiam plenamente no tal Escolhido (Renan Tenca), um curandeiro que cuida da saúde das pessoas guiado pela fé.
Está lançada a briga. Os médicos são desafiados a realizar a missão enquanto lidam com uma população misteriosa, que pouco fala e é refratária a “estrangeiros”. Graças a esses moradores e seus enigmas, O Escolhido ganha um clima de suspense agradável, que prende o espectador.
Mas a discussão entre fé e medicina soa superficial no texto de Carolina Munhóz (autora do livro infanto-juvenil O Inverno das Fadas) e Raphael Draccon (escritor da trilogia Dragões de Éter). Mas se o desenvolvimento da trama fica devendo, elementos como a atuação do elenco garantem um resultado satisfatório.
Personagem gaúcho no meio do Pantanal
Os gaúchos, mesmo com uma trama ambientada no Pantanal, conseguem se enxergar em O Escolhido. Isso porque Enzo é um jovem médico nascido no Rio Grande do Sul. Sua personalidade é uma das mais questionáveis: infeliz com a missão de desbravar o Brasil, ele vai perdendo a crença em sua profissão. É ateu, mas, no entanto, em um dos momentos mais tensos do seriado, questiona sua crença e sua existência na Terra. Para imprimir o tom, o personagem usa palavras como “guria” e diz ter feito estágio no hospital Moinhos de Vento.
Outro aspecto que chama a atenção é o cenário. Descrita como um ponto no Mato Grosso do Sul, a locação, na verdade, é em Natividade, município do interior de Tocantins tombado pelo Patrimônio Histórico, nomeado como Águazul na trama da Netflix. Com 10 mil habitantes, a cidade, fundada no século 18 e perfeitamente restaurada, teve algumas de suas casas e até a igreja matriz envelhecidas de propósito para acentuar o clima de suspense de O Escolhido.