Em São Borja, a 250 metros de distância um do outro, estão o Museu de Getúlio Vargas e o Memorial Casa João Goulart — espaços dedicados a conservar a memória dos dois ex-presidentes da República nascidos no primeiro dos Sete Povos das Missões. Porém, as duas estruturas, apesar de estarem em pleno funcionamento, enfrentam problemas justamente de conservação.
A casa de Getúlio Vargas (1882-1954) passou por um restauro entre 2014 e 2015. No processo, além ter ganho uma nova vida, houve uma ampliação, com um anexo moderno construído nos fundos do pátio para abrigar o acervo de mais de mil livros de Vargas, bem como documentos e fotografias, que atualmente passam por um processo de digitalização.
A intenção é deixar o local mais próximo de sua versão original – inclusive, nas paredes, a pintura é feita com cal, tal qual era na época em que o imóvel foi erguido. Porém, dois anos depois da reforma, que custou mais de R$ 2,5 milhões (captados via lei de incentivo à cultura, com contrapartidas da prefeitura), a platibanda da casa desabou em um temporal. Até agora, o ornamento não foi restaurado.
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Pelo museu centenário também percebe-se que há infiltrações e alguns itens, como roupas e cartolas de Getúlio, começam a se decompor, devido a uma conservação que não é a mais adequada. Ao ser questionado sobre o assunto, o secretário de Cultura, Turismo, Esporte e Lazer de São Borja, Edson Damião de Melo, explica:
— É evidente que, com o tempo, existe um desgaste natural porque as construções daquela época eram diferenciadas na questão dos materiais, que hoje são bem mais evoluídos. Na questão do acervo de vestimentas, elas vão ao natural se decompondo, devido às ações do próprio tempo, com frio, calor e umidade. E, na nossa opinião, isso faz parte do processo natural de decomposição, mas tentamos conservar o máximo possível.
De acordo com o secretário, a intenção é promover uma nova reforma do espaço e, também, uma no Memorial Casa João Goulart, porém, ele destaca que os custos são muito elevados. Como exemplo, cita a recolocação da platibanda do Museu Getúlio Vargas, que gira em torno de R$ 100 mil. Melo diz estar buscando os recursos por meio de emendas parlamentares e das legislações com renúncia fiscal:
— Estamos atrás desses fomentos não porque as casas estão deterioradas, mas precisamos mantê-las. É através da conservação da história que os povos evoluem.
Apesar de tombados, o que impede que haja interferências sem a autorização do instituto do patrimônio histórico, os prédios não têm garantidas verbas do Estado, segundo Renato Savoldi, do Iphae:
— Não necessariamente são destinados recursos específicos para fins de proteção do bem, sendo possível evidentemente serem acessadas as leis de incentivos e outros fundos destinados à cultura de maneira que a conservação dos bens tombados seja uma prioridade. Ou seja, podem ser objeto de preferência no caso da obtenção de recursos através dessas leis — explica Savoldi.
Já na casa que pertenceu a João Goulart (1919-1976), a situação é parecida, com infiltrações aparentes e desgaste. O espaço foi reformado em 2009, mas optou-se por deixar algumas “janelas”, com pequenos quadrados não repintados para que os visitantes vejam exatamente o visual das paredes à época em que Jango vivia ali.
Outro problema no trabalho de conservação é que são os próprios monitores que fazem a limpeza do acervo, e, mesmo buscando capacitação – os profissionais, atualmente, estão fazendo cursos junto ao Instituto Brasileiro de Museus (Ibram) para aprender a lidar melhor com as peças –, eles não são museólogos. Preencher esse cargo é uma necessidade que o município assume: de acordo com Melo, um museólogo deverá ser contratado em breve.
O secretário acredita que os museus serem tombados pelo Instituto do Património Histórico e Artístico Nacional (Iphan), colocando-os em uma rota nacional, facilitaria a obtenção de recursos para a conservação. A esperança do titular da pasta é que esse novo possível status ajude a investir em tecnologias para tentar, por exemplo, salvar as roupas dos presidentes, colocando-as em espaços adequados, com temperatura controlada, preservando uma parte importante da história.