Quando a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou que havia uma pandemia de coronavírus no mundo, em 11 de março de 2020, muitos setores passaram a batalhar pela sobrevivência. É o caso dos bares com música ao vivo: com as portas fechadas, tiveram que passar por reinvenções (vide telentrega e lives) e reaberturas com restrições de capacidade e atendimento.
No último mês, com o agravamento da situação, o Rio Grande do Sul entrou na bandeira preta. Novamente as portas foram fechadas, às vésperas da pandemia completar um ano.
A reportagem de GZH conversou com os proprietários de quatro bares de Porto Alegre, cujas situações foram acompanhadas pela plataforma ao logo de 2020, para saber como foi o último ano e as perspectivas para 2021. (Leia aqui reportagem sobre a situação do Bar Parangolé, que completa 15 anos.)
Ocidente, por Fiapo Barth
Atual situação: "Está totalmente fechado. Não estamos nem fazendo almoço para levar. Bandeira preta é bandeira preta. Fechamos".
Como foi 2020: "Fizemos almoço para entrega. Em novembro, reabrimos para pub. Eram mais de 30 funcionários antes da pandemia, mas foram demitidos oito".
Perspectiva para 2021: "Para a bandeira preta, não temos estratégia nenhuma. Tem que ficar em casa, se isolar. Fazer o que tem que ser feito. Eu parei de criar expectativas. Não adianta planejamento. A gente não sabe o que vai acontecer, do jeito que o governo está lidando com isso. A perspectiva é chegar a vacina. Sem a vacina, nada da economia vai girar".
Por quanto tempo consegue resistir sem abrir: "Mais dois meses. Eu tenho como pagar meus funcionários parados mais dois meses. Não é que o Ocidente deixe de existir. Mas é que aí acaba qualquer possibilidade de fundo. Terei que me preocupar com como minha família e meus filhos vão se alimentar. Se, por exemplo, voltar a suspensão de contratos, terei uma folga. Assim, consigo aguentar mais uns quatro ou cinco meses".
Agulha, por Eduardo Titton Fontana
Atual situação: "É delicadíssima, é de um fim de festa. As medidas que a gente tomou para ter alguma arrecadação não foram suficientes. As estratégias que a gente traçou também, dentro de suas possibilidades de êxito, não pagam as contas".
Como foi 2020: "Os nossos funcionários foram mantidos. Tentamos cortar todo o resto de despesa: água, luz, internet. Houve negociação de aluguel e com fornecedores. Tivemos êxito num aspecto, pois não demitimos ninguém, apenas uma pessoa saiu por motivos pessoais. Porém, o tempo de pandemia se mostrou muito maior do que o previsto e nos colocou numa situação financeira bem delicada. Principalmente pela falta de perspectiva a curto e médio prazos. Criamos um site com produtos do Agulha (camiseta, pijama, meias, adesivos, bebidas, entre outros). Chegamos a fazer lives, mas isso trazia mais custos do que retorno. Realizamos telentrega em alguns períodos, mas não conseguiram uma quantidade de venda que justificasse a operação".
Perspectiva para 2021: "Bem pessimista de nossa parte, mesmo. A gente não consegue visualizar a execução de shows neste ano, que seria nosso principal pilar. Na parte de gastronomia e coquetelaria, em que a gente tem bastante força, esses problemas variam de inflação, de diminuição do poder aquisitivo, da dificuldade dessa operação nos formatos que são possíveis. Essas vendas não conseguiam sustentar o Agulha. No que talvez seja nosso último movimento, acreditando muito na importância do espaço, vamos lançar um clube de amigos do Agulha, que vai ter várias modalidades de contribuições mensais e diferentes contrapartidas. Um modelo de assinatura. Tentando com essas vendas garantir o mínimo necessário para pagamentos de contas e salários".
Por quanto tempo consegue resistir sem abrir: "Do jeito que estamos nesta situação, sem subsídios e sem incentivo governamental, resistimos março e início de abril. Mas pelos nossos cálculos, abril seria nosso ponto final. Ou a gente tem êxito nessa arrecadação ou em abril a gente vai ter que anunciar algum tipo de fim ou suspensão de atividades".
Gravador Pub, por Gabriel Lopes-Salomão
Atual situação: "Estamos trabalhando com o presente, vivendo um dia de cada vez, sem pressa e sem planos. O Gravador segue vivo graças à colaboração de amigos, clientes, músicos e apaixonados pela experiência e pela lembrança do que vivemos".
Como foi 2020: "Nos reinventamos com as entregas de pizzas artesanais, que foram as responsáveis por manter o Gravador vivo até hoje. Criamos a Rádio Gravador, um talk-show transmitido pelo Facebook e pelo YouTube e apresentado por mim e pelo saxofonista e eterno Garoto da Rua, King Jim. Demitimos funcionários e recolhemos os equipamentos junto com nossos sonhos a um depósito, para enfrentar a dureza da realidade que se apresentava. Não reabrimos nem um único dia de 2020 para o público por entender que a vida está acima de qualquer outra condição. Na virada do ano, trouxemos de volta a cozinheira do pub e tentamos uma abertura para almoço. Discreta, com redução de 80% da capacidade e distanciamento de 3 metros entre mesas".
Perspectiva para 2021: "Resistiremos. O plano é viver 2021 se adaptando diariamente e esperar que consigamos ter o maior número de pessoas vacinadas possível. Esse é o grande desafio que temos pela frente: cuidar das pessoas pra depois cuidar das coisas. Afinal, voltar a fazer o que já fazíamos é um ligar de luz, é fácil. Assim que for possível, reabriremos".
Por quanto tempo consegue resistir sem abrir: "Nada podemos afirmar sobre o futuro. Estamos trabalhando para continuar aqui. Temos confiança no apoio e no carinho que as pessoas têm conosco".
Café Fon Fon, por Luizinho Santos
Atual situação: "Desde o início da pandemia, o Café está fechado para o público".
Como foi 2020: "Começamos uma campanha para manutenção do espaço em que muitas pessoas ajudaram fazendo doações. Teve o brinde do bem criado pela Heineken para ajudar os bares e casas noturnas. Fizemos mais de cem lives no ano passado e neste ano estamos retomando esse formato. Aos sábados, fazemos almoço tele ou para buscar, também estamos fazendo uma entrega de marmitas. Fechamos uma parceria para venda de cursos online. Tivemos que reduzir o pessoal em virtude de não abrirmos mais para o público — de três para apenas um".
Perspectiva para 2021: "Fizemos uma live monetizada com o pianista, compositor e arranjador Cristovão Bastos, e talvez esse seja um caminho para funcionarmos enquanto não houver condições de abrir para o público com segurança".
Por quanto tempo consegue resistir sem abrir: "A questão de quanto tempo vamos resistir está totalmente atrelada ao desenvolvimento da pandemia".