Arena do Grêmio, Beira-Rio, Pepsi On Stage, Opinião, Auditório Araújo Vianna, Theatro São Pedro, Teatro do Bourbon Country e outros palcos importantes de Porto Alegre habituados a receber grandes nomes da música nacional e internacional foram silenciados pela pandemia de coronavírus. Apresentam um cenário inédito em suas histórias: há mais de dois meses não recebem shows e ainda não há no horizonte um prazo para a realização de eventos com aglomeração de pessoas em ambientes fechados e abertos, grandes ou pequenos.
No Brasil e no mundo, este segmento do setor cultural, um dos mais fortemente atingidos pela paralisação imposta pela covid-19, ocupa o fim da fila no cronograma de retomada das atividades. Sabe-se que será uma volta gradual e cercada de cuidados que devem reconfigurar o negócio.
O que é o jornalismo de soluções, presente nesta reportagem
É uma prática jornalística que abre espaço para o debate de saídas para problemas relevantes, com diferentes visões e aprofundamento dos temas. A ideia é, mais do que apresentar o assunto, focar na resolução das questões, visando ao desenvolvimento da sociedade.
Apesar da incertezas e no aguardo de orientações e autorizações dos governos estadual e municipal, o setor começa a se mobilizar para as adequações necessárias que shows e festas terão de seguir. Criado em 2017, o grupo Live Marketing RS, que envolve 340 empresários do segmento de shows e entretenimento do Rio Grande do Sul, responsáveis por empregar, direta e indiretamente, mais de 500 mil pessoas, tomou a frente agora em maio da interlocução com as autoridades do município e do Estado.
Segundo um dos organizadores da entidade, Rodrigo Machado, sócio-diretor da Opinião Produtora, que administra o bar Opinião, o Pepsi On Stage e o Araújo Vianna, o primeiro passo foi, antes de enviar qualquer tipo de sugestão de protocolo para os governos, radiografar as especificidades do setor no Estado.
– Nosso tema de casa foi separar os tipos de eventos. Até então, um espetáculo em uma casa show era igual ao de uma boate, que era igual ao de um teatro, que era igual ao de um evento corporativo, que era igual ao de evento de rua, que era igual ao de um seminário, por exemplo. E a gente sabe que não é assim, cada tipo tem suas especificidades e suas subdivisões. Separamos em subtipos e, para cada um deles, sugerimos protocolos específicos – explica Machado.
No documento, os empresários listaram algumas prevenções que já estão sendo tomadas para o momento em que as autoridades liberarem shows e eventos do gênero: máscaras para o público e colaboradores, distanciamento entre as pessoas, limite de ocupação do espaço, afastamento de casos positivos ou suspeitos de covid-19, atendimento diferenciado para grupos de risco, higienização dos ambientes dos trabalhadores e do público e equipamentos de proteção obrigatórios, além dos cuidados no atendimento ao público.
Machado descarta qualquer especulação sobre como serão os novos formatos, justamente pelo fato de que as autoridades é que definirão as normas para cada tipo de atividade:
– Vão analisar os protocolos que enviamos e nos mandarão as considerações em cima das propostas. O que disserem que temos de fazer, faremos. Quando as casas forem autorizadas a reabrir, reabriremos com dois tipos de segurança: a biológica, de saúde; e a psicológica das pessoas, pois elas têm que entender que estarão entrando em um local seguro.
Expectativa
Carlos Branco, produtor cultural, da Branco Produções, responsável por shows em Porto Alegre e Região Metropolitana, afirma que ainda tem esperança de realizarem setembro o primeiro evento dos que foram transferidos por conta da pandemia:
– Mas, claro, vai depender da evolução do vírus e dos protocolos das secretarias estaduais e municipais de Saúde, visando garantir a saúde de nosso público.
Branco afirma que, assim que acontecer a reabertura de locais como o Teatro do Bourbon Country e o Salão de Atos da PUC, pretende se reunir com os responsáveis para traçar estratégias:
– Esperamos que o Rio Grande do Sul continue a ter bons resultados em sua politica pública em relação ao vírus para que possamos retomar as atividades. No momento, estamos retomando a programação musical do Instituto Ling, onde fazemos a curadoria e produção, no formato online, até que se possa retomar de maneira presencial.
A médica Maria Eugênia Bresolin Pinto, doutora em Epidemiologia e integrante do Comitê Técnico de Informações Estratégicas e Respostas Rápidas à Emergência em Vigilância em Saúde Referente ao Coronavírus da Universidade Federal de Ciências da Saúde (UFCSPA), faz um alerta sobre a volta de eventos culturais como shows e peças de teatro:
– Vamos chegar no momento em que os eventos de lazer poderão voltar, mas temos um passo anterior, que será a abertura das escolas e das universidades. Aí, testaremos, inclusive, a maturidade dos jovens em seguir ações de prevenção. Mas também veremos se não terá uma piora dos indicadores e a necessidade de darmos um passo atrás.
A especialista ressalta que as atividades que reúnem aglomerações devem ser as últimas a ser liberadas:
– Elas têm suas peculiaridades. Uma sessão de cinema é muito diferente de um show em casa noturna. Talvez shows em ambientes abertos, longe do inverno gaúcho, possam ocorrer. Em alguns parques europeus, estão sendo desenhados círculos nos gramados para delimitar o espaço de cada pessoa. Mas, imagine isso no Anfiteatro Pôr do Sol, com as pessoas ingerindo bebidas alcoólicas. Não acredito que isso seria respeitado depois de determinado momento
Maria Eugênia destaca ainda, que, além dos cuidados básicos para reduzir o risco de transmissão da covid-19, devem ser observados outros fatores para que os shows voltem a ocorrer:
– Os locais onde ocorrem estas atividades, normalmente, são fechados e isso gera outros cuidados, como manter janelas abertas para circular o ar, os cuidados com os sistemas de refrigeração. A capacidade (do local) também deverá ser reduzida, os funcionários deverão usar protetores faciais e máscaras, entre outros ajustes que teremos que verificar de acordo com a evolução desta doença no Estado e na cidade.
Outros países
Com turnês de artistas paradas e grandes festivais de música cancelados ou remarcados para o final do ano ou 2021, a retomada da agenda de shows pelo mundo vai obedecer o cronograma de flexibilização de cada país. Mas, em todos eles, é um setor que está no fim da fila da volta à normalidade. Em entrevista ao jornal The New York Times, o diretor do Instituto de Transformação da Saúde da Universidade da Pensilvânia, Zeke Emmanuel, afirmou a reunião de uma grande massa de pessoas será a última parte a ser retomada após a pandemia:
– Você não pode acionar um botão e abrir toda a sociedade novamente. Não vai funcionar. O vírus vai voltar da pior forma.
Alemanha
Festivais de música estão vetados até o fim de agosto.
Irlanda
O governo divulgou um documento que detalha cinco fases do relaxamento, que começou em 18 de maio. A última fase, marcada para 10 de agosto, contempla a possibilidade de "festivais, eventos e outros encontros sociais de massa onde o distanciamento social pode ser seguido".
Dinamarca
Em abril, o músico Mads Langer realizou um show drive-in, a exemplo dos cinemas ao ar livre, e tocou para o público de 500 automóveis. A edição do Festival de Roskild foi cancelada.
Reino Unido
No começo da pandemia na Europa, o Festival de Glastonbury, um dos mais importantes do mundo, chegou a ser confirmado para junho. Diante do forte avanço do coronavírus no país, foi cancelado.
EUA
O tradicional Festival de Coachella, na Califórnia, foi transferido de abril para outubro. Entre as iniciativas curiosas, o músico Marc Rebillet anunciou uma turnê drive-in.
Portugal
O Rock in Rio Lisboa, marcado para 20, 21, 27 e 28 de junho, foi adiado para junho de 2021.
China
Em algumas cidades, como Chengdu, Shanghai e Shenzhen, baladas voltaram a funcionar, mas com cuidados especiais. Pistas de dança são limpas e desinfetadas com frequência e público têm de usar máscara o tempo todo. Além disso, os estabelecimentos devem medir a temperatura dos frequentadores. E cada pessoa tem seus dados confrontados com uma base de informações para saber se seu histórico clínico permite o ingresso no local ou oferece riscos.
Coreia do Sul
Após adotar medidas de flexibilização reabertura, o país voltou a registrar casos de covid-19 e determinou a volta de restrições de circulação de pessoas. A partir desta sexta-feira (29), por exemplo, museus, parques e galerias de arte serão outra vez fechados.