Após Olavo de Carvalho afirmar que Roberto Alvim "não está bem de cabeça", o secretário da Cultura, que pode ser demitido ainda hoje, disse que irá "provar ao professor Olavo" que ele está bem de cabeça. A declaração foi dada em entrevista ao programa Timeline, da Rádio Gaúcha, na manhã desta sexta-feira (17).
– Falei com ele rapidamente duas vezes na vida por telefone. A frase do professor Olavo, um mestre pra mim e alguém que me ajudou muito com seus escritos... O que ele colocou: "é cedo pra afirmar, mas talvez o Alvim não esteja bem da cabeça". Vou provar para o professor Olavo ao longo dos próximos meses, quando estrearem as óperas e tiver o lançamento de livros, vou provar que sim, estou bem de cabeça, estou são.
Questionado se ficou chateado com Olavo de Carvalho, Alvim negou:
– Não com ele, mas de as coisas terem descambado dessa maneira, haja vista nosso esforço gigantesco para lançar esse edital (do Prêmio Nacional das Artes), mobilizar o dinheiro, descobrir juridicamente os caminhos e criar a equipe. Foi um esforço muito grande para ser recebido dessa maneira. Não é culpa do Olavo. A culpa foi uma infeliz coincidência retórica, que estou prontamente tentando desmentir.
O que Alvim falou?
O vídeo foi postado pela Secretaria Especial da Cultura do governo Bolsonaro para divulgar o Prêmio Nacional das Artes, lançado horas antes em live com a participação do próprio presidente.
— A arte brasileira da próxima década será heroica e será nacional. Será dotada de grande capacidade de envolvimento emocional e será igualmente imperativa, posto que profundamente vinculada às aspirações urgentes de nosso povo, ou então não será nada — afirmou Alvim no vídeo postado nas redes sociais.
Além dos trechos do pronunciamento, a estética do vídeo, a aparência do secretário, o vocabulário, o tom de voz e a trilha sonora escolhida também fizeram várias personalidades compararem a divulgação à propaganda nazista.
De acordo com o livro Goebbels: a Biography, de Peter Longerich, a fala do ministro da Propaganda nazista Joseph Goebbels foi a seguinte:
— A arte alemã da próxima década será heroica, será ferreamente romântica, será objetiva e livre de sentimentalismo, será nacional com grande páthos e igualmente imperativa e vinculante, ou então não será nada — disse o ministro de Cultura e Comunicação de Hitler em um pronunciamento para diretores de teatro, segundo o livro Goebbels: a Biography, de Peter Longerich.
O que Alvim justificou?
Alvim afirmou que o trecho de seu discurso que se relaciona com a fala de Goebbels "caiu" em sua mesa. Segundo o secretário, ele escreveu 90% do texto, mas o restante foi criado junto a assessores, que trouxeram ideias após pesquisarem frases que relacionassem arte e nacionalismo.
— Houve uma infeliz coincidência retórica nessa frase, cuja forma é extremamente semelhante à frase original do Joseph Goebbels. Foi uma coincidência infeliz, eu não sabia a origem. Chegaram vários papéis e frases na minha mesa com a ideia de nacionalismo e arte. Vamos proceder com investigação — justificou.
O secretário da Cultura afirmou que há boas frases “mesmo de ditadores sanguinários” e que ele concorda com Goebbels na defesa de arte e nacionalismo. Dividir essa ideia, no entanto, não significa que ele apoia o regime de Adolph Hitler, defendeu-se.
— Se você pegar o Stálin, certamente ele tem uma série de grandes frases. Ao tirar do contexto, você pode dizer essas frases e o significado ser incrível — disse. — A frase que eu escrevi tem coincidência retórica, mas a frase é correta. Até um ditador sanguinário pode ter uma frase absolutamente correta, embora essas pessoas travistam com nobres discursos intenções espúrias. Você encontra frases horríveis em ditadores sanguinários, como Che Guevara — acrescentou.
Após a repercussão negativa, ele alega já ter conversado com o presidente Jair Bolsonaro e explicado que a relação de seu discurso com o ministro da cultura e propaganda do regime nazista não foi intencional.
— Ele entendeu que não houve má-intencionalidade, que eu não sabia a origem da menção específica e que o programa não pode ser diminuído.
Alvim também disse que o governo Bolsonaro defende a ideia do conservadorismo na arte – o que não tem a ver, diz, com concordar com o nazismo.
— A ideia de conservadorismo em arte é um conceito que diz respeito ao conhecimento e amor profundo à história da arte, à percepção da complexidade dos clássicos e de que a arte tem como finalidade última a dignificação da vida humana.
O secretário pediu desculpas ao povo judeu pelo vídeo:
— Eu sou cristão. A minha vinculação ao povo judeu é absoluta, porque meu Deus é o mesmo deus do judaísmo. Peço humildemente perdão se essas pessoas se sentiram, com toda a razão, ofendidas por isso. Houve uma coincidência retórica, sem o conhecimento da origem, da forma dessa frase. As ideias postas na frase não têm nada a ver com a perseguição ao povo judeu. A minha repugnância ao ideário nazista é radical. Não há, em nosso horizonte, nenhuma conexão com o regime nazista, que encarnou o mal absoluto em nossa humanidade.
Quem é Roberto Alvim?
Dramaturgo, Alvim ganhou a simpatia de Bolsonaro ao defender o presidente nas redes sociais e ao atacar a atriz Fernanda Montenegro, dizendo sentir "desprezo" por ela.
Na Secretaria Especial da Cultura, coleciona polêmicas, como a nomeação do jornalista e militante de direita Sérgio Nascimento de Camargo para presidente da Fundação Palmares. A nomeação foi suspensa após uma grande mobilização contra afirmações de Camargo consideradas racistas.
Nesta semana, Alvim ironizou a indicação de Democracia em Vertigem na categoria de melhor documentário longa-metragem do Oscar dizendo que a produção deveria estar na categoria ficção. Dirigido pela cineasta mineira Petra Costa, o filme acompanha o impeachment de Dilma Rousseff a partir de uma visão particular da diretora.