Eu bati nela ontem, admito, mas eu amo essa mulher. Foi um exagero, já passou.
Eu não tenho nada contra veado, eu até conheci um, uma vez. Até apertei a mão dele. Eu só fiz pra assustar, era brincadeira.
A imprensa pega no meu pé, eu não falei aquilo a sério. É difícil governar assim, com todo mundo torcendo contra.
Não foi isso que disse na quinta-feira (16), em vídeo, o secretário nacional da Cultura, Roberto Alvim. Ele disse outra coisa, que no enunciado já é horrível — imaginar que um órgão de governo possa dirigir a arte, que possa reverter o que quer que seja por ato de sua vontade, que saiba melhor do que uma miríade de artistas e seu incontável público ao longo do tempo o que é melhor para um país, que a boa arte seja nacionalista, que a suposta nova arte que ele vai inventar vá significar o renascimento da nação. Todas essas ideias e vontades implicadas na fala e na tese do secretário são horríveis.
Mas é pior, nos vários subtextos que o vídeo carrega; menciono alguns em forma de pergunta, perplexa e desconsolada, sabendo de antemão que ninguém vai responder a sério, com vistas a qualquer esclarecimento.
Essa fala representa o governo federal atual?
O nacionalismo exigido pelo secretário se refere a quais pressupostos? Expulsar gentes? Escolher gentes? Selecionar temas?
Quem vai fazer essas seleções? O mesmo Alvim que considerou Fernanda Montenegro uma degenerada moral? Gente indicada por ele e que pense como ele?
Mas, se isso for concebível, há coisa mais abismal ainda.
Há todo um conjunto de citações explícitas a elementos direta e inequivocamente nazistas. Há um parágrafo inteiro decalcado em fala do ministro de Cultura e Comunicação nazista Joseph Goebbels; há a atuação do locutor, o próprio Alvim, performando a elocução como quem ameaça o ouvinte; há Wagner ao fundo, na peça predileta de Hitler; suplementarmente, há a preeminência da ópera no prêmio que lançado naquele ato, a ópera, a linguagem da suposta arte total, na concepção totalitária dessa gente.
Foi sem querer? Era só uma brincadeira? A intenção não era a de assustar, ameaçar? Amanhã o chefe vai dizer que a imprensa distorceu, exagerou, criou fake news? Ele demitido, fica tudo por isso mesmo?