O cineasta Kleber Mendonça Filho teve seu terceiro e último recurso negado pelo governo federal no caso que aponta irregularidades na captação de seu filme O Som ao Redor (2013).
Com isso, a Secretaria Especial da Cultura, que ocupa a função do extinto MinC, voltou a cobrar a devolução de R$ 2,2 milhões aos cofres públicos.
Se não pagar, a Cinemascópio Produções Cinematográficas e Artísticas, produtora de Mendonça Filho, ficará impedida de participar de editais, projetos ou lei de incentivo ligados à Secretaria Especial de Cultura. Além disso, passará a constar como devedora do Banco Central por meio do Cadin (Cadastro Informativo de Créditos Não Quitados do Setor Público Federal).
Atualmente na França trabalhando em um novo longa, o cineasta afirmou que está "lidando com essa questão". Em uma uma carta aberta divulgada em maio de 2018, escreveu que sofre "acusações injustas" e que devolver a verba captada seria uma "punição inédita no cinema brasileiro".
Como não há mais possibilidade de recurso no ministério, resta agora ao realizador interceder junto ao Tribunal de Contas da União. A partir do momento em que a cobrança chegar à produtora, Mendonça tem 30 dias para efetuar o pagamento.
Considerado pela crítica um dos melhores longas brasileiros desta década, O Som ao Redor venceu um edital de 2009 do extinto Ministério da Cultura, que determinava que só seriam aceitos "projetos com orçamento de, no máximo, R$ 1,3 milhão". O ministério daria R$ 1 milhão e o restante da verba poderia ser captado com outras fontes, inclusive públicas.
A produção do longa, contudo, enviou para a Ancine (Agência Nacional do Cinema) um orçamento no valor de R$ 1.494.991 — 15% superior ao limite máximo. Ocorreu que, após vencer o edital, o filme redimensionou seus custos para cerca de R$ 1,9 milhão. A discrepância entre o custo total do filme e o limite permitido pelo edital foi detectada pela área técnica da Ancine e reportada ao MinC em 2010. Mas o alerta passou batido à época, e o filme acabou captando R$ 1,7 milhão.
O valor saltou para R$ 2,2 milhões após atualização de valores que soma o que foi recebido pelo cineasta em duas parcelas, em dezembro de 2009 e janeiro de 2010, com atualização monetária e juros de mora.
Um servidor da Ancine não identificado levou o caso novamente ao MinC. Em sua denúncia, ele afirmou que, desde 2015, vinha encontrando "resistência interna em representar contra a ilegalidade" nesse e em outros casos ligados ao filme.
Kleber Mendonça Filho é um dos diretores brasileiros mais representativos do cinema atual. Neste ano, seu novo longa, Bacurau, foi selecionado na categoria principal do Festival de Cannes, na França, e passa a concorrer à Palma de Ouro.