A cubana Teresa Cárdenas era uma criança que adorava ler, mas jamais se conformou com uma ausência nos livros que tinha à mão: nenhum deles tinha negros como protagonistas. Já adulta, descobriu que havia um concurso para publicar romances e topou o desafio: em poucos dias, com a filha recém-nascida ocupando um dos braços, datilografou Cartas para minha mãe, sobre uma menina negra vítima de preconceito.
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Atualmente, Teresa é uma das autoras de maior circulação em seu país, sendo uma das poucas que se dedica exclusivamente à criação literária. A escritora esteve na Praça da Alfândega para lançar o romance Cachorro velho, ficção que aborda a escravidão e o período colonial em Cuba. Confira três perguntas de ZH para a escritora:
Seus livros abordam o preconceito racial. Como a senhora compara o racismo do Brasil com o de Cuba?
Esta é a terceira vez que venho. O racismo aqui no Brasil é muito forte. É tão forte que a luta dos negros contra o preconceito é muito mais forte do que em Cuba. É possível senti-lo em qualquer lugar, pelo modo como as pessoas olham e tratam os negros. O Brasil é um país maravilhoso, com gente muito valorosa, mas também com gente muito louca, capaz de qualquer coisa. Basta ver o que aconteceu com o impeachment. Em Cuba, víamos as imagens do novo governo. Eram todos homens. E não se viam negros.
Cartas para minha mãe aborda a vida de uma menina negra vítima de preconceito em Cuba. O livro já foi traduzido para outros países e encanta leitores de gêneros e etnias diferentes. Como a senhora explica essa identificação dos leitores com a personagem?
Isso se explica pelo sentimento. Os humanos se igualam nas emoções. Não importa o cabelo, a cor, o credo: todos sentimos as mesmas emoções. O ser humano se esforça em ser diferente, em se distinguir de seus semelhantes. Mas, no final das contas, somos todos a mesma raça e experimentamos os sentimentos do mesmo modo.
A senhora se sente livre para escrever sobre o que quiser em Cuba?
Sim, me sinto muito livre. Sou conhecida em Cuba por escrever sobre temas difíceis, que não costumam aparecer na literatura para crianças e jovens. Mas há muitos autores em Cuba que escrevem tendo em vista a publicação, ou seja, criam história para interessar os editores, com temas leves. Não é meu caso. Tenho três linhas de literatura. Escrevo para crianças pré-escolares, trabalho temas como famílias negras e preconceito e também tenho livros que reinventam a mitologia afro-cubana. Sinto-me à vontade para escrever nessas três linhas.
3 perguntas
Teresa Cárdenas: "O racismo aqui no Brasil é muito forte"
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Alexandre Lucchese
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