Paolo Sorrentino é um cineasta que aprecia a grandiloquência dos temas, da encenação e da caracterização de seus personagens, quase sempre retratados com as tintas da caricatura. Desde a consagração internacional com Il Divo (2008), inventiva cinebiografia do político conterrâneo Giulio Andreotti, o diretor italiano consolidou a chancela de autor respeitado, imprimindo em sua obra uma marca reconhecida por admiradores – e detratores.
Em cartaz nos cinemas brasileiros, A Juventude foi realizado por Sorrentino após a conquista do Oscar de melhor filme estrangeiro com A Grande Beleza (2013) – e também é seu segundo filme falado em inglês, depois de Aqui É o meu Lugar (2011). Se em A Grande Beleza o tributo a Federico Fellini é explícito com sua releitura do clássico A Doce Vida (1960), em A Juventude o DNA felliniano está diluído na caracterização do personagem de Michael Caine, um maestro e compositor que remete à imagem do mestre italiano na maturidade, na ambientação e no perfil do diretor de cinema vivido por Harvey Keitel, que encara durante temporada em um spa os impasses para a produção de um novo filme – como Fellini mostrou em 8 1/2 (1963).
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Amigos de longa data, Fred (Caine) e Mick (Keitel), passam férias juntos no hotel aos pés dos Alpes suíços. Encaram a reta final de suas vidas de formas distintas. O músico está resignado com a aposentadoria, tanto que nega o convite da rainha da Inglaterra para conduzir um concerto especial com sua composição mais famosa. Diz que não tem sentido apresentá-la sem a voz de sua mulher, cantora lírica agora apagada na senilidade.
Já o cineasta mostra empolgação ao lado dos jovens que trabalham com ele no roteiro de seu filme-testamento, no qual deseja voltar a trabalhar com sua musa (Jane Fonda). E, como o diretor vivido por Marcello Mastroianni em 8 1/2, Mick é assombrado por imagens que brotam de seu passado real e ficcional. Eles são acompanhados pela filha de Fred (Rachel Weisz), que acaba de ser abandonada pelo filho de Mick. É sob o olhar ora melancólico, ora cínico desses três personagens que Sorrentino ilumina temas como velhice, solidão, vaidade, embate entre arte e cultura popular, exaltação à juventude e futilidades consumistas.
Guiam essas observações hóspedes como um deprimido astro de cinema (Paul Dano), a Miss Universo que desfila nua o corpo esculpido e o craque argentino Diego Maradona, esse em exagerada representação. Em meio aos tipos peculiares que circundam seu universo alegórico, emoldurados por planos de grande beleza visual, Sorrentino confronta em A Juventude a vulnerabilidade do artista com a perenidade da sua criação – espelhamento que conforta uns e amargura outros.
E mesmo que por vezes pareça não emergir da abordagem um tanto superficial de temas tão instigantes, Sorrentino comprova seu talento como provocador de estímulos que renovam a fé no cinema como arte transcendental.