A Feira do Livro está mais plural. Pode parecer óbvio, mas não é: ao contrário do que ocorreu no ano passado, quando o fenômeno Cinquenta Tons de Cinza dominou 99,9% das prateleiras e concentrou a preferência do público, a atual edição chega à segunda semana sem um título hegemônico.
É claro que os best-sellers da vez estão vendendo bem, entre eles A Culpa é das Estrelas, de John Green. A obra tem um apelo especial entre as adolescentes e é forte candidata a se tornar a mais vendida até o fim do evento. Outra possibilidade é o novo volume da série Bridget Jones, Louca pelo Garoto. Mas nada se compara à pasteurização imposta por Cinquenta Tons de Cinza no ano passado, quando pilhas do título eram vistas em quase todas as bancas, dominando o espaço nos estandes.
Livreiros, editores e vendedores elencam pelo menos duas razões para a guinada, considerada positiva. A primeira delas refere-se ao fato de que, neste ano, não surgiu nenhum livro com a capacidade viral da apimentada criação de E. L. James. Em 2012, o fenômeno já havia estourado no mercado editorial e seu predomínio na Feira foi uma consequência disso.
- Cinquenta Tons de Cinza surgiu como uma coqueluche. Funcionou quase como um meme, sabe? Mas passou. E acho que neste ano não teremos nada parecido, o que é ótimo - avalia o escritor e fundador da editora 8Inverso, Cássio Pantaleoni.
A outra razão para a reviravolta tem a ver com uma alteração na configuração da própria Feira, que levou a uma redução drástica da área infantil (de 29 para 10 bancas). O encolhimento, consequência das obras no Cais do Porto, levou as livrarias da área adulta a incluírem em suas prateleiras exemplares voltados às crianças - algo que antes praticamente não acontecia. É que, a partir deste ano, os livreiros precisaram escolher entre a área adulta ou infantil.
- É natural que a gente também passe a oferecer algo para a gurizadinha - diz o livreiro Paulo Roberto Fogaça, da Fogaça Livraria.
O resultado da nova circunstância é visível. Se na edição passada todas as bancas (ou quase todas) pareciam "mais do mesmo", agora é possível perceber uma variedade maior de títulos. A volta de uma certa pluralidade, que no passado era uma das marcas da Feira, converge com o que o escritor e professor Luís Augusto Fischer vem defendendo desde que se tornou patrono.
- Não fiz nada para que isso acontecesse, mas, devido à minha manifestação, alguns livreiros que partilhavam da mesma opinião (de que é preciso ter mais diversidade) ganharam força para fazer essa observação valer - afirma Fischer.
A imposição de um "arrasa-quarteirão" como Cinquenta Tons de Cinza, na opinião do patrono, acaba por condicionar a disposição dos livros nos estandes e, automaticamente, a opção dos leitores. Mais sortimento, nesse caso, vira sinônimo de maior autonomia na hora de escolher o que levar para casa - e o que não levar.