Um espetáculo superlativo de popstar. Mas contando, essencialmente, com a comunhão da plateia. Diante de mais de 10 mil fãs, Jão realizou uma apresentação triunfante no Estádio Passo d'Areia, em Porto Alegre, neste sábado (23).
O show marcou a retomada do estádio do São José como palco musical. Também conhecido como Zequinha Stadium (como batizou o R.E.M. em 2008), o espaço não recebia eventos musicais desde 2016.
O cantor de 29 anos trouxe a Superturnê à capital gaúcha. Quando se fala em "super", não se refere apenas ao quarto disco do artista, lançado em agosto de 2023: a estrutura é, de fato, ambiciosa. Para Porto Alegre, Jão contou com passarela que ia até a metade do campo, cenário com dezenas de metros de altura, telões gigantescos e muitos efeitos especiais — fogos, fumaças e luzes. Até um gigantesco dragão cenográfico marcou presença no palco.
Mas de nada adianta tanta estrutura se o principal não funciona, o que não foi o caso aqui. Jão proporcionou duas horas de puro carisma e entretenimento, sobrando em energia e presença de palco. Havia muita coreografia e entrosamento com a banda que o acompanhava. Até suspenso no ar, no topo do palco, ele surgiu uma hora para cantar A Última Noite.
É possível não criar afinidade com as músicas de Jão, faz parte, mas é inegável o talento e disposição do cantor. Ele se esforça e se dedica para entregar um espetáculo contundente ao público. Sem dúvida, uma das características mais marcantes de Jão está em sua capacidade em se conectar com os fãs.
Carismático, Jão sempre se expressa bem ao conversar com seu público. Ao longo da apresentação, ele chegou a comentar sobre sua primeira vinda à capital gaúcha e como sua relação com os gaúchos cresceu com o tempo.
— A primeira vez que estive em Porto Alegre foi no Teatro Unisinos, em 2018. Estavam lá? A probabilidade é pequena, poucas pessoas foram — recordou. — Mas foi um show lindo e incrível, o começo da nossa história. Cada vez que eu voltava tinham mais pessoas. E mais. O amor aumentando, fomos nos apaixonando um pelo outro, até que chegamos aqui na Superturnê.
No mesmo discurso, Jão ainda celebrou os ingressos esgotados do show:
— Vender ingresso no Brasil é muito difícil. Se não está atrelado a uma festa ou a um open bar, e você é um artista ali no fundo... Vender ingresso para as pessoas virem até aqui, cantar junto, se amar, isso é muito raro. Por isso dou muito valor ao que vocês fazem por mim. Muito obrigado!
Jão atinge, essencialmente, um público jovem. O estádio estava tomado por adolescentes (ou pouco mais do que isso), em sua maioria. Além disso, era uma plateia diversa: havia famílias, casais de diferentes gêneros, fãs que capricharam no figurino, muita gente com chapéu de cowboy vermelho (referência à identidade do disco Super) e diferentes bandeiras LGBTQIA+.
Possivelmente, alguns jovens estavam indo ao seu primeiro grande show. Tudo era motivo para comemorações, até um avião sobrevoando o estádio. O público estava empolgado antes mesmo de Jão aparecer, ao ponto de cantarem as músicas que estavam sendo tocadas no sistema de som — a comoção era grande quando rolava Taylor Swift, mas Anna Júlia, do Los Hermanos, segue atravessando gerações.
Volume máximo
Após uma contagem regressiva e um vídeo de introdução, o show começou às 20h50min, com Escorpião, faixa de abertura do Super. Jão surgiu no meio da passarela e o estádio veio abaixo.
Os gritos alcançaram o volume máximo. Amigos se abraçavam, casais se beijavam, outros dançavam, alguns choravam, todos pularam. Desde a primeira música, a plateia cantou cada música com uma força. Muitos estarão, seguramente, sem voz neste domingo (24).
Falando nisso, havia momentos em que o canto do público superava Jão e a banda, isso que o som vindo do palco estava eficientemente audível — sem problemas técnicos nesse quesito. Sem dúvida, o público foi bastante participativo. E também carinhoso com o artista: durante as breves pausas entre uma música e outra, emendava um grito de "Jão tesão, bonito e gostosão" ou "Jão, eu te amo".
As faixas de Super ocuparam boa parte do repertório. No entanto, a apresentação passou por toda a discografia de Jão, trazendo sucessos como Idiota (muitos pulos aqui), Acontece, Imaturo, Pilantra, Santo, Meninos e Meninas, entre outras. Após uma introdução que abrange quatro músicas — além de Escorpião, entra A Rua, Essa Eu Fiz pro Nosso Amor e Doce — o show seguiu por quatro atos que representam os elementos presentes em seus discos: terra no álbum Lobos (2018), ar em Anti-herói (2019), água com Pirata (2021) e, por fim, fogo com Super.
Antes de o show começar, houve uma disputa por meio de um "medidor de gritos" entre duas músicas para selecionar qual entraria no repertório. Tempos de Glória entrou no setlist após receber mais ovações do que Eu Quero Ser Como Você.
Clímax
Outro ponto forte de Jão está nas letras. Dentro de uma sonoridade que costuma flutuar entre pop, rock e MPB, o cantor aborda desamores em versos bastante diretos e identificáveis, trazendo um eu-lírico intenso, que se entrega às paixões e expressa frustrações sem rodeios. Bebe da fonte de suas vivências.
Há uma influência clara de Cazuza (1958-1990) em suas músicas, tanto que ele homenageou o ídolo em mais de uma ocasião. Porém, o pop arredondado com versos cotidianos remetem também a Lulu Santos. Trata-se de uma "sofrência pop", que pode ser festiva e catártica e facilmente cria laços com o seu público. Talvez por isso as músicas de Jão tenham sido cantadas em um volume máximo neste sábado.
Aliás, é comum falar que um show tem aquela música que leva ao clímax, constituindo uma catarse coletiva. Contudo, é um tanto difícil apontar apenas um momento assim na apresentação de Jão no Zequinha. Pelo que se viu na plateia, foi uma euforia do início ao fim.