Em clima de festa e não de despedida, Caetano Veloso encerrou a segunda e última noite de apresentações em Porto Alegre com a animada A Luz de Tieta neste sábado (2). Também foi o encerramento da turnê Meu Coco, conforme o músico anunciou durante o show. Em 1h30min, o cantor e compositor emocionou e contagiou o público que lotou o Auditório Araújo Vianna.
As apresentações deste sábado e sexta-feira (1°), ambas com ingressos esgotados, estavam agendadas originalmente para agosto do ano passado. Porém, os shows foram remarcados por questões médicas — o músico estava com uma gripe forte, além de febre alta. Depois disso, Caetano mesmerizou o público ao fechar a primeira edição do Festival Turá em Porto Alegre, realizada em novembro.
Aos 81 anos, sendo mais de 60 de carreira, Caetano começou a se despedir dos palcos. Em junho de 2023, o cantor e compositor baiano comentou que a turnê de Meu Coco poderia ser a última que faria “voando pelo mundo”. “Quero voltar a viver na Bahia e cantar lá toda semana — e que venha à minha terra quem quiser me ver e ouvir", escreveu em suas redes sociais.
Diante desse cenário, havia uma interrogação para as duas apresentações de Caetano no Araújo: seriam as últimas do cantor baiano em solo gaúcho? Apesar da despedida anunciada, ainda há esperanças de mais um grande ato: em outubro do ano passado, as equipes de Caetano Veloso e Maria Bethânia usaram as redes sociais para anunciar que estão negociando uma turnê conjunta. Porém, não há "nada de concreto ainda", conforme o comunicado.
Qualquer que seja a decisão final de Caetano, o sábado no Araújo foi mais uma oportunidade para celebrar uma das vozes mais importantes da MPB. E que voz. Quando ele abriu o show delicadamente com Avarandado (canção conhecida pela interpretação de Gal Costa, lançado no disco Domingo, de 1967), às 21h14min, logo um canto afinado e suave se apossou do auditório. Caetano segue com sua voz suntuosa.
Ao longo da apresentação, o artista demonstrou vigor no palco. Tanto que, em alguns momentos, pulou e lançou uns passinhos de dança. A vitalidade continua em dia.
Como costuma rolar nos shows da turnê, Caetano contou histórias de sua trajetória em alguns intervalos. Discorreu sobre músicos e formações que o acompanharam — como A Outra Banda da Terra, Banda Nova, a banda Cê —, falou sobre o R retroflexo presente na faixa A Outra Banda da Terra e saudou o poeta Augusto de Campos, após interpretar sua versão musicada do poema Pulsar.
Eta, eta, eta, eta
Depois da versão voz e violão de Avarandado, Caetano emendou Meu Coco, que é faixa-título do álbum lançado em 2021 e dá nome à turnê. Aliás, uma parte do show permeia o repertório do disco — outra música do álbum, Anjos Tronchos, já veio na sequência —, o que inclui Não Vou Deixar, Ciclâmen do Líbano e Sem Samba Não Dá.
Só que a apresentação também resgata pérolas da carreira do cantor, como Sampa. Logo nos primeiros versos, a plateia vibrou. Suavemente, a plateia sussurrava a letra como se fosse uma segunda voz de Caetano — comportamento que seria comum ao longo do show.
Foi o que aconteceu, por exemplo, na doce O Leãozinho, na bela Menino do Rio e na inevitável You Don’t Know Me, com o público fazendo coro. Aliás, após a faixa do Transa (1972) ser apresentada, Caetano anunciou que aquele seria o último show da turnê de Meu Coco.
— Que beleza, Porto Alegre. É o último Meu Coco que a gente está fazendo no Brasil, é o encerramento da turnê. Eu fui obrigado a deixar pra depois a volta a Porto Alegre, porque é simplesmente maravilhoso para nós encerrar aqui — disse.
Depois de momentos mais contemplativos do repertório, o público se acendeu com Cajuína, mas foi a vibrante Reconvexo que fez a plateia se levantar de suas cadeiras e dançar como se fosse Carnaval.
Quando terminou de interpretar a histórica Baby, que ficou conhecida na voz de Gal Costa, Caetano prestou homenagem à amiga. Ela partiu em 2022.
— Gal Costa para sempre — louvou.
Com Sem Samba Não Dá, que obviamente colocou o Araújo para sambar, o público se direcionou para dançar próximo à grade em frente ao palco. O clima festivo tomou conta do ambiente, que se confirmou com a música seguinte, Lua de São Jorge. Ao término da canção, ele recebeu uma bandeira da Palestina e a exibiu à plateia, que o ovacionou.
No bis, ele começou com a delicada Mansidão e, a seguir, provocou um tremendo êxtase no anfiteatro com a suingada Odara. A Luz de Tieta fechou o show, com o Araújo . Terminada a música, o público continuou cantando o refrão “Eta, eta, eta, eta/ É a lua, é o sol, é a luz de Tieta”. E seguirão cantando Caetano por um bom tempo.
Foi a despedida nacional da turnê Meu Coco, que foi um sucesso na capital gaúcha: além das duas datas deste fim de semana, o show encheu o Araújo em três noites de abril (8, 9 e 10) e duas de dezembro (16 e 17) de 2022.
Não se tem informação se Caetano voltará a se apresentar em Porto Alegre. Torça-se, quem sabe, que retorne com a irmã. Seguramente, quem foi em pelo menos um dos shows no Araújo, o veria por mais noites. Para sempre.