Foi em 1994 que a banda gaúcha Nenhum de Nós subiu ao palco do Theatro São Pedro (TSP) pela primeira vez para apresentar e gravar o seu show acústico. Na época, segundo o guitarrista Carlos Stein, foi uma aposta arriscada e gerou uma certa dúvida no público. Porém, o quinteto driblou a desconfiança e o chute de fora da área, meio sem ângulo, foi um golaço. O tradicional templo cultural do Rio Grande do Sul receberia o time para partidas históricas mais 99 vezes — e contando.
Agora, para comemorar as cem apresentações acústicas no TSP, o grupo retorna ao local depois de quase quatro anos — o último show deles no espaço foi em janeiro de 2020 e, depois, veio a pandemia, o que impossibilitou as famosas temporadas da banda na casa. Os shows desta retomada, que também antecipam as celebrações dos 30 anos do disco acústico gravado em 1994, ocorrem em cinco datas, desta quinta (30) a sábado (2), às 20h; domingo (3), às 18h; e na terça-feira (5), às 20h. Com todos os ingressos esgotados há semanas. Um sucesso.
— Isso é o resultado de uma construção. No começo, foi bem complicado, porque as pessoas não conheciam bem o conceito de acústico, mas depois de a gente ter feito algumas temporadas no São Pedro virou um evento consolidado. O pessoal espera por estes shows. Virou algo tradicional. Eu acho que hoje, fazendo uma analogia futebolística, se tivesse que dizer que o Nenhum de Nós tem um estádio, seria o Theatro São Pedro. Seria o nosso jogar em casa. E isso é uma honra — afirma Stein.
Porém, o "jogar em casa", que pode vir a parecer uma vantagem, na verdade, para o vocalista Thedy Corrêa, tem uma carga extra de compromisso. O músico não gosta de pensar que está subindo no palco com o jogo ganho, por mais que conheça o campo:
— Sempre prefiro pensar que jogar em casa tem uma outra conotação e, em alguns casos, aumenta a responsabilidade, porque estão ali pessoas que a gente conhece, preza, ama, adora, que fazem parte da nossa família, os nossos amigos mais próximos, aqueles que estão com a gente desde o início e que vão nos assistir. Então, por mais que essas pessoas gostem da gente, queremos oferecer o melhor para elas.
E o melhor prometido por Thedy vai vir no formato das músicas que os fãs amam, além de muita dedicação na hora de executá-las. Este último item, por sinal, é primordial para o vocalista. Colocar emoção é essencial e, para ele, é impossível, por exemplo, cantar Camila, Camila de maneira "meia boca". É sempre na força máxima. Além deste hit atemporal, estarão na setlist canções como O Astronauta de Mármore, Paz e Amor, Eu Não Entendo, Julho de 83, entre muitos outros clássicos que tocam nos fones de diversas gerações que acompanham o Nenhum de Nós.
— É uma questão de herança (risos). Os mais jovens, muitas vezes, nos ouvem porque os pais têm canções nossas como importantes na vida e passam a considerar essas músicas importantes também. É uma cadeia emocional que se constrói. Ainda tem os casos de pessoas que nos ouvem pela primeira vez e dizem: "Isso diz respeito a mim". E não importa se a música foi feita 20 anos atrás. Isso é o que eu acho que faz a música do Nenhum de Nós não ter prazo de validade, ultrapassa qualquer moda — explica Thedy.
Uma vida
Formado em 1986 por Thedy, Stein e Sady Homrich na bateria, o grupo jamais se separou. O trio segue unido até hoje, 37 anos depois, e foi apenas somando membros. Em 1990, entrou Veco Marques, acrescentando na guitarra e no violão. Seis anos depois, passa a integrar o conjunto João Vicenti, colocando os teclados e o acordeom nas apresentações. Desde o último reforço, há 27 anos, a formação se mantém sólida. Nenhum deles partiu.
Mas o que explica esta união de uma vida?
— A gente tem um pacto de morte. Quem sair, a gente mata (risos) — brinca Stein. — Na verdade, não é nada tão radical assim. Acho que, no final, o que mantém a banda unida assim é uma noção de que o que a gente faz ainda tem relevância para nós e para as pessoas que gostam da gente. Isso talvez seja o fundamental. E o fato de a gente ter nascido de um grupo de amigos também faz bastante diferença.
O guitarrista relembra, porém, que houve momentos críticos, como flutuação de popularidade, dúvidas sobre qual rumo artístico seguir e divergências. Mesmo assim, ele explica que o grupo soube administrar as suas discordâncias, sempre com respeito e utilizando as críticas como alavanca para melhorar a harmonia da banda. Todos, então, conseguiram se alinhar na mesma viagem, que é tornar o Nenhum de Nós cada vez melhor.
Thedy complementa a brincadeira de Stein:
— Não é um pacto de morte, é um pacto de música (risos). É muito difícil manter um grupo de pessoas trabalhando em torno de um projeto musical por tanto tempo. E estamos conseguindo superar todos os desafios. Tivemos a sorte de ter encontrado as pessoas certas. Essa que é a verdade. São pessoas que acreditam. E, nos últimos tempos, a gente sempre pensou ano a ano, passo a passo. A idade vai chegando, o projeto em si parece que em determinado momento vai perder fôlego e, então, vem um ano como este, com uma agenda ótima, muito trabalho, festivais. Então, a gente pensa: "Temos fôlego ainda". E continuamos.
Nenhum de Nós em "Acústico 100"
- Desta quinta (30) a sábado (2), às 20h; domingo (3), às 18h; e na terça-feira (5), às 20h.
- No Theatro São Pedro (Praça Marechal Deodoro, s/n°), em Porto Alegre.
- Ingressos esgotados.