Tem trabalho novo de Yamandu Costa na praça. O violonista gaúcho acaba de lançar, nas plataformas digitais, De Vida y Vuelta, álbum que gravou ao lado de Domingo Rodríguez Oramas, mais conhecido como Domingo El Colorao, tradicional músico das Ilhas Canárias. Juntos, os dois promovem o encontro de seus instrumentos, o violão de sete cordas e o timple (instrumento de pequeno porte com cinco cordas), respectivamente, entregando uma sonoridade única.
Com 13 músicas instrumentais, em um total de 32 minutos, a obra conta com um repertório bastante eclético, viajando do clássico ao popular, em uma mistura de linguagens. O trabalho também busca deixar para a eternidade uma celebração à relação entre as Ilhas Canárias e a América Latina, que foi fortemente influenciada pelo arquipélago espanhol — assim, nas faixas, encontram-se músicas vindas da Venezuela, do Paraguai, do Brasil e, claro, da própria terra de Domingo El Colorao.
A criação do álbum, que é um importante marco nesta integração cultural entre os dois lados do Oceano Atlântico, foi realizada a partir de uma pequena turnê de Yamandu pelas Ilhas Canárias. Por lá, ele conheceu Domingo, dando início a esta parceria — que, inclusive, aparece na série documental Histórias do Violão, disponível no canal oficial do músico gaúcho no YouTube.
— O álbum De Vida y Vuelta é totalmente despretensioso — afirma Yamandu.
O músico gaúcho ainda detalha que, quando chegou em Fuerteventura, terra de Domingo, ficou encantando ao encontrar uma cultura típica canária que também é raiz de muito do que se escuta na América Latina:
— As ilhas sempre foram passagem, onde os barcos paravam para se abastecer de alimentos, de água e, dentro destas passagens, a cultura estava junto. Então, a América Latina é recheada de elementos da música canária.
Porém, segundo Yamandu, o Brasil, por não falar a língua hispânica, acaba não tendo tanta influência das Ilhas Canárias como os demais países da América Latina. O músico explica, por exemplo, que a cultura do arquipélago espanhol pode ser vista desde muito tempo atrás.
— No início do tango, antes de ser definido como linguagem, no estilo que o Carlos Gardel cantava, a gente encontra coisa muito parecida, como o vibrato e a maneira de impostar a voz. É herança da música canária, que é uma continuação da música espanhola. Essa cultura ibero-americana chegou à América Latina para colonizar e se transformou em uma nova música, com cada país tendo as suas próprias misturas, suas características — aponta Yamandu.
O timple e o violão
Parceiro de Yamandu neste projeto, Domingo El Colorao é referência no que diz respeito ao timple, instrumento típico canário. Em uma primeira vista, o objeto lembra um cavaquinho ou um ukulele — porém, ao contrário destes, possui uma corda a mais, ou seja, é um instrumento de cinco cordas.
Yamandu, por sua vez, também toca um instrumento com uma corda a mais, o violão de sete cordas (o mais usual é encontrar violões com seis cordas). Juntos, eles entregam uma música harmoniosa, de instrumentos que se integram como parceiros de longa data.
— O violão de sete cordas tem uma corda a mais, mais grave. E casa muito bem. Fica uma grande família de cordas. E o timple é um instrumento que está em uma região mais aguda das cordas. Uma semelhança importante entre eles é que as cordas são de náilon, então fica esse som mais doce — esclarece o músico gaúcho.
Agora, a dupla pretende fazer uma turnê pelas Ilhas Canárias, levando aos moradores de lá essa mistura com o Brasil, enaltecendo a história e abrindo as portas para que novas integrações sejam feitas. E, para tal, Yamandu projeta levar o De Vida y Vuelta também para a mídia física, como um documento que celebra este momento — entretanto, ainda não há data definida para o lançamento. Vale apontar que a última faixa do álbum é uma poesia escrita e recitada por José Hormiga, que dá nome ao projeto.
Lá e cá
Morando em Portugal há três anos — inclusive, foi por lá, na casa do gaúcho, que De Vida y Vuelta foi gravado —, Yamandu conta que ele e a família estão adaptados ao país, o qual ele considera muito tranquilo para se viver. E também oferece muitos benefícios para a sua carreira, que ele enxerga se expandindo cada vez mais pela Europa — marcando a sua consagração como músico mundo afora. Apesar de estar em um país mais centralizado, ele ainda aponta que o Brasil, em algumas situações, pode ser mais fácil para tirar os projetos do papel.
— Apesar das polêmicas sobre a Lei Rouanet nos últimos anos, o Brasil, nesse aspecto (de fomento à cultura), é um país bastante desenvolvido. As pessoas é que não entenderam muito bem o significado da Lei Rouanet. Em poucos países se tem uma estratégia cultural tão bem-sucedida e tão bem argumentada como o Brasil com a Lei Rouanet. Então, às vezes, é mais fácil você conseguir fazer coisas no Brasil do que no Exterior — argumenta.
Por falar no Brasil, Yamandu, depois do arrefecimento da pandemia, está podendo vir ao país novamente espalhar a sua música — em maio de 2022, realizou dois shows no Estado, marcando o seu retorno após dois anos afastado.
— Foi muito emocionante e muito bacana poder voltar à minha terra. Estou muito feliz de poder retornar, novamente, agora em junho, com o cantor português Antônio Zambujo. A gente está fazendo uma parceria, um duo, com o qual nos apresentaremos em Porto Alegre — adianta.
Outro espaço que também tem a emoção de Yamandu é a escola pública de música de Passo Fundo que leva o seu nome. Por lá, no último sábado (18), o instrumentista fez uma apresentação e pôde acompanhar de perto a inauguração oficial do espaço, que busca formar novos artistas e, principalmente, cidadãos influenciados pelo gênio nascido na mesma cidade. O evento fez parte da programação do Festival de Música de Passo Fundo, que teve show de Yamandu.
— A escola de música é uma coisa incrível. A gente espera que isso, realmente, transforme a vida das crianças, que consigam ter uma sensibilidade artística para conseguirem ter uma vida mais interessante, uma vida mais sensível. E a pandemia veio clarificar na cabeça da gente, no sentimento da gente, que a arte não é um entretenimento, não é uma coisa supérflua. Muito pelo contrário, ela faz muito bem para a nossa vida e para o nosso dia a dia — ressalta o músico.
O cidadão ilustre afirma que pretende, ao menos, duas vezes por ano, ir até Passo Fundo acompanhar de perto o desenvolvimento dos novos artistas. Se eles seguirem o caminho trilhado pelo vencedor do Grammy Latino de 2021, uma riquíssima leva de grandes músicos está vindo por aí.
De Vida y Vuelta
- De Yamandu Costa e Domingo El Colorao
- Gravadora: Bagual Produções
- Gênero musical: Instrumental
- Número de faixas: 13
- Capa: Rodrigo Rosa
- Disponível: Plataformas digitais