O choro é considerado o primeiro gênero de música popular instrumental brasileira, datando de meados do século 19. De lá para cá, a música do país viu uma infinidade de outros ritmos surgirem e sumirem. Os chorões, porém, seguem na ativa, mantendo o estilo vivo, apresentando-o para o público e, principalmente, angariando novos adeptos.
Dois exemplos estão em Porto Alegre: são eles o Clube do Choro, que completa 34 anos em 2023, e a Oficina de Choro, em atividade há 20 anos. Enquanto o primeiro conta com um quarteto de artistas profissionais e uma vasta experiência no gênero, o segundo forma novos músicos anualmente, passando adiante os ensinamentos que começaram a ser construídos pelo flautista Joaquim Callado, considerado o "pai do choro", na segunda metade dos anos 1800.
Assim, os grupos de choro tiram o seu som de diversas combinações entre flauta, violão, pandeiro, piano, clarinete, cavaquinho, bandolim, trombone e saxofone — entre outros instrumentos — em suas interpretações. A atual formação do Clube do Choro de Porto Alegre, por exemplo, vai utilizar quatro destes instrumentos para o show que ocorrerá no Centro Histórico-Cultural da Santa Casa (Av. Independência, 75) neste domingo (26), a partir das 17h.
Luiz Palmeira no violão de sete cordas, Camanga no cavaquinho, Antonyo Rycardo no bandolim e André Rocha no pandeiro comandarão a apresentação, que faz parte do projeto Sonoridades. O show será em ritmo de Carnaval, com um repertório que inclui marchinhas e clássicos do choro e do samba. A entrada é gratuita e as senhas podem ser retiradas na plataforma Sympla.
O show marca o retorno do Clube do Choro de Porto Alegre, após quase três anos de pausa, devido à pandemia. O grupo, que existe desde 22 de novembro de 1989 — dia de Santa Cecília, padroeira dos músicos —, foi fundado por nomes como Ernani Kurtz, Paulo Barbosa, Lúcio do Cavaquinho, Túlio Piva, Rogério Piva, Roberto Hipólito, Jaime Lubianka, Luiz Bastos Cebolinha, Ênio Casanova e Jessé Silva, o responsável pela ideia.
Atualmente, o Clube do Choro de Porto Alegre não conta com nenhum dos seus membros originais — Cebolinha se afastou recentemente por questões de saúde e foi substituído por Camanga. André Rocha é, agora, o membro mais antigo da iniciativa, presente no projeto desde 1992, além de ter assumido a presidência do grupo.
— A nova formação conta com músicos de qualidade, isso eu posso garantir. Atualmente, somos quatro, mas estamos pensando em colocar um acordeom ou uma flauta para melhorar ainda mais — adianta André.
Para o atual presidente do Clube do Choro de Porto Alegre, manter o gênero vivo é essencial para a cultura brasileira:
— O choro é comparado ao jazz. É uma música dificílima, de qualidade, e não é qualquer um que toca. É um gênero que não sai de cena e, hoje em dia, tem uma gurizada nova aderindo. Antigamente, era uma coisa de velho, de veterano. Não é mais, isso acabou.
Nova geração
E quem ajuda a formar a nova geração de chorões é a Oficina de Choro, que está com inscrições abertas para quem quiser aprender sobre os mais diversos instrumentos musicais — sem limitação de idade. As aulas ocorrem semanalmente no Instituto Ling (Rua João Caetano, 440) e são gratuitas.
O projeto de educação musical já formou mais de mil pessoas ao longo de suas duas décadas de atuação, auxiliando alunos com ou sem experiência. As inscrições para a nova turma podem ser feitas até o dia 11 de março pelo e-mail oficinadechoroinstitutoling@gmail.com. Os interessados precisam apenas ter o instrumento pelo qual se interessam e noções básicas de música.
Serão ofertadas as disciplinas de Composição Coletiva, que ocorrerá sempre nas quartas-feiras, às 14h, e de Prática em Conjunto, aos sábados, no mesmo horário. As aulas se iniciam em 18 de março e se estendem até 9 de dezembro. As vagas são limitadas, e os interessados serão submetidos a um processo de seleção.
Mathias Pinto foi aluno da Oficina de Choro e, há 10 anos, é coordenador do projeto, que foi iniciado por Luiz Machado — que, inclusive, retorna em 2023 como professor convidado. E não apenas ele: outros músicos experientes também farão participação no ano letivo do curso, compartilhando seus conhecimentos. Serão nove meses de aprendizado para enaltecer o choro.
— O choro aglutina muitos outros estilos. Temos, dentro dele, o samba, o baião, o maxixe, a valsa e vários outros subgêneros. E o choro busca valorizar mais a diferença do que a semelhança. Ele é tocado por praticamente qualquer instrumento, repleto com essa riqueza de elementos, formando uma música popular virtuosa e que necessita de bastante estudo — explica Mathias.
De acordo com o coordenador do projeto, cerca de uma centena de alunos que passaram pela Oficina de Choro se tornaram músicos profissionais. Alguns, inclusive, com projeção nacional, como o bandolinista Luiz Barcelos, que toca com a sambista Roberta Sá, e Pedro Franco, que já se apresentou com Maria Bethânia, por exemplo, tocando violão e bandolim.
— Eu vejo hoje como o melhor momento do choro, sem dúvida. Em termos de números e, sobretudo, de revalorização das culturas populares, de um olhar novo sobre o país que estamos vendo acontecer. Acho que o choro é uma música-símbolo para este momento, trazendo essa teia de elementos que representam a diversidade — destaca Mathias.
Ele continua:
— Temos, hoje, uma cena dinâmica, que está viva e com muita variedade. Raramente, em outros gêneros, vamos ver um senhor de 80 anos tocando junto com um moleque de 10 anos, que nem a gente no choro. Isso é bem comum, um ambiente que tem muito essa mistura geracional.
Assim, o Clube e a Oficina integram uma resistência que também conta com nomes como o dos músicos Elias Barboza, Paulinho Parada (estudioso da obra de Plauto Cruz) e Lucian Krolow, e lugares como o bar Parangolé.
André Rocha complementa afirmando que a cena se mantém firme, principalmente, pelo "amor à camiseta", relembrando que o Clube do Choro já tocou para grandes plateias e também para "meia dúzia de pessoas". Mesmo assim, seguem lá, com o mesmo entusiasmo, mantendo a missão de não deixar o choro morrer.
— O Jessé Silva sempre falava que o choro vai para a UTI, mas nunca morre. O choro é imortal — finaliza André.