De um lado, Arnaldo Antunes. Cantor, poeta, artista visual e compositor contundente. Tribalista e ex-Titãs. Do outro, Vitor Araújo. Compositor e pianista virtuoso, natural de Recife (PE). Juntos, eles gravaram o disco Lágrimas no Mar (2021), com base na voz e no piano. Trata-se de um trabalho intimista, assim como será o show da dupla nesta quinta-feira (24), às 21h, no Salão de Atos da PUCRS.
Arnaldo e Vitor se conheceram em eventos pela estrada, mas só foram se aproximar mesmo no final de 2019, quando começaram a trabalhar no show do disco O Real Resiste (2020). Inclusive, a primeira apresentação daquela turnê seria em Porto Alegre, no próprio espaço da PUCRS. Contudo, a pandemia cancelou todos os planos.
Nesse tempo, a dupla começou a produzir músicas. Os dois começaram a descobrir afinidades criativas e desejos de experimentações. Aos poucos, foi surgindo um disco.
— Pensamos em produzir dois singles, que seriam duas regravações: Fim de Festa, de Itamar Assumpção, e Fora de Si. Então, Arnaldo lembrou de uma inédita, a que dá título ao álbum. Viraram três músicas. O disco foi num processo de expansão. "Pô, mas tem essa outra". "E tem aquela". "E se a gente regravasse Longe? Parece que a letra ganhou novo significado por causa da pandemia". E assim foi — recorda Vitor.
O álbum traz três faixas inéditas: Enquanto Passa Outro Verão, Umbigo e Lágrimas no Mar. Há também uma parceria de Arnaldo com Erasmo Carlos (Manhãs de Love) e releituras originais de músicas já conhecidas, como Longe, além de uma versão de Como 2 e 2, de Caetano Veloso. O álbum ainda traz duas participações de Pedro Baby e Marcia Xavier, esposa de Arnaldo.
Lágrimas no Mar foi gravado no estúdio Canto da Coruja, em um sítio localizado em Piracicaba, no interior de São Paulo. Segundo Arnaldo, o álbum carrega em si uma atmosfera do período de quarentena, além das crises que estão sendo atravessadas neste momento:
— A ideia de gravar uma música como Longe ("Onde é que eu fui parar/ Aonde é esse aqui?/ Não dá mais pra voltar/ Porque eu fiquei tão longe"), que parece estar falando do momento das quarentenas. Ou uma música tipo Como 2 e 2 ("Tudo vai mal, tudo/ Tudo mudou não me iludo e contudo"), que reflete tudo o que a gente está vivendo na atualidade, a normalização de uma certa barbárie. Há uma truculência que está em voga neste momento no Brasil.
O cantor acrescenta que ao mesmo tempo em que Lágrimas no Mar reflete um período nebuloso, também é um trabalho solar:
— Não é um disco melancólico, mas sim emocionante. Não tem uma coisa dark. Acho que tem uma esperança de retenção pela arte.
Reencontro
Para Arnaldo, o formato do espetáculo é algo inédito em sua trajetória. Ele descreve a apresentação como "despida", pois são só ele e Vitor no palco, sem a "proteção de uma banda".
— É uma maneira muito interessante de degustar as canções — pontua.
O show de Lágrimas no Mar estreou em São Paulo (SP) no começo de março, em três datas – dias 4, 5 e 6. Porto Alegre receberá a primeira apresentação da dupla na estrada, fora da cidade onde residem.
— Existe uma vontade enorme de começar a rodar o Brasil de novo. Faz uma falta gigante essa rotina. Você sair para outras cidades, levar o show para diferentes tipos de público ou situações, teatro ou festival, tudo isso vai enriquecendo as possibilidades do espetáculo como organismo — relata Vitor.
Sobre a retomada nos palcos, o pianista lembra que sentiu um nervosismo no dia em que voltou a se apresentar, algo similar ao que sentia no começo da carreira. Vitor lembra que a ansiedade do público era recíproca, o que serviu para realimentar a dupla no palco.
— Quando pisa no palco de novo, vem aquela sensação: "Nossa Senhora, como consegui viver mais de dois anos sem isso?" — comenta.
Para Arnaldo, o sentimento foi parecido:
— Me senti voltando à vida. Saí zonzo do primeiro show. No dia seguinte, estava flutuando. Ficamos nessa abstinência muito longa. Para mim, era uma coisa inédita, pois faço shows desde os 20 e poucos anos. Isso sempre fez parte do meu cotidiano. Se eu fico muito tempo sem fazer show, começo a subir pelas paredes. Quando chegamos ao terceiro dia, pensamos: "Poxa, podia ter toda noite" (risos). Queria mais!