Toda a sonoridade da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Ospa) na palma de sua mão. É só dar alguns cliques, colocar o fone de ouvido e mergulhar no mundo das músicas de concerto criadas por compositores nacionais. E esta viagem sonora portátil é possível porque a instituição acabou de disponibilizar nas plataformas de streaming o álbum Ospa e Convidados, primeira gravação da orquestra em 20 anos.
O disco conta com cinco faixas assinadas por diferentes gerações de músicos brasileiros: Radamés Gnattali (1906-1988), Dimitri Cervo, João Guilherme Ripper, Fernando Deddos e Arthur Barbosa. E, para dar vida às composições, a Ospa contou com regência do seu maestro e diretor artístico, Evandro Matté, e com solistas que integram — ou já integraram — o time de instrumentistas da orquestra: Douglas Gutjahr na percussão, Emerson Kretschmer no violino e o Quinteto de Metais Porto Alegre, formado por Elieser Fernandes Ribeiro e Flávio Gabriel no trompete, Nadabe Tomás na trompa, José Milton Vieira no trombone e Wilthon Matos na tuba.
— O objetivo de fazer um disco é, principalmente, deixar um registro histórico, não só das obras, mas da própria orquestra. Além disso, o compromisso e a concentração de você gravar com o detalhamento de hoje, com a tecnologia que se tem, em que tudo se ouve de maneira muito límpida e pura, faz com que o nível da orquestra cresça. Então, eu acho que gravar tem também essa função de crescimento do próprio grupo. Uma orquestra, depois de gravar um disco, com certeza sai melhor do que antes — enfatiza Matté.
Atrelado aos objetivos listados pelo maestro, o álbum Ospa e Convidados, que em breve também deve ser lançado em mídia física para comercialização, busca valorizar a música de concerto brasileira atual, destacando compositores nacionais que tenham reconhecimento atualmente e, em paralelo, sejam donos de características diferentes. A exceção é Radamés Gnattali, porto-alegrense falecido em 1988, mas com uma obra tão poderosa que segue ecoando até os dias de hoje.
Movimentos
O último álbum da Ospa, uma ópera infantil chamada Boiúna, de Walter Schültz Portoalegre, havia sido gravado em 2001, sob regência do maestro Ion Bressan. Assim, quando Matté assumiu a direção artística da instituição, em 2015, decidiu que era preciso um novo registro dos talentos da orquestra. Foram três anos de trabalho e de reposição de músicos que faltavam no conjunto até que ele conseguisse fazer a tão desejada captação sonora para a posteridade. Porém, o processo para conseguir lançar levou mais tempo do que o imaginado — e, claro, a pandemia de covid-19 teve participação nesta demora.
Gravado na Sala Sinfônica da Casa da Ospa, em maio de 2018, o álbum teve produção de Alexandre Ostrovski Jr. e do Audio Porto, estúdio que faz parte da Fábrica do Futuro. E essa junção foi fundamental para que a obra saísse, segundo Matté:
— A acústica da Casa da Ospa era muito boa, mas não tínhamos o equipamento necessário. Então, fizemos uma parceria com o pessoal da Fábrica do Futuro, e isso propiciou que nós levássemos o equipamento de ponta deles para gravar um grupo grande do tamanho da orquestra dentro do seu próprio espaço. A solução que encontramos foi esta: levamos o estúdio para dentro da nossa casa.
Após a captação, o que faltava era trabalhar na pós-produção da obra. Em 2019, no entanto, não foi possível finalizar o disco, uma vez que o processo de masterização é demorado e, enquanto o trabalho estava sendo preparado, a orquestra não parou com os seus compromissos. A ideia era o álbum sair, então, no começo de 2020, mas a pandemia chegou e fez os planos serem adiados. Até agora.
— Ficamos na ansiedade, mas acho que ficou lindo, está sendo muito elogiado, todo mundo está falando muito bem. Os solistas estão satisfeitos, os compositores também. A Ospa cresceu muito nestes últimos 20 anos e, com certeza, está entre as grandes orquestras do país e da América do Sul. Então, ela precisa ser mostrada para fora também. E uma das formas também que você tem de mostrar a qualidade do grupo é fazendo este tipo de registro. Hoje, qualquer pessoa no mundo vai poder entrar no Spotify e ouvir a Ospa — comemora o maestro Matté.
E, pelo visto, a experiência de produzir o álbum empolgou os envolvidos, uma vez que o diretor artístico da Ospa garante que um novo trabalho deve ser gravado em 2022 e deve seguir na mesma linha do recém-lançado. Os nomes dos convidados ainda não podem ser divulgados, mas novidades devem chegar aos donos de ouvidos apurados ainda em janeiro.
As faixas de Ospa e Convidados
- Mba'epu Porã – Arthur Barbosa
Com o nome significando "música bela" em tupi-guarani, a composição é uma abertura sinfônica dedicada à orquestra em razão da inauguração da Casa da Ospa. É uma homenagem lúdica a tudo o que se construiu e se construirá musicalmente no Rio Grande do Sul, em que se conta a história do som e da música na região desde os seus primórdios.
- Concerto Grosso para Quinteto de Metais e Orquestra – Fernando Deddos
A composição estreou no Brasil em 2018, na gravação do disco. A peça foi composta para o Festival Internacional Urubrass 2017, tendo o Quinteto Porto Alegre como solista da primeira apresentação, junto à Orquestra Filarmônica de Montevidéu. Os três movimentos são: I. Alegre, Esperançoso / II. Andante, Poco Rubato / III. Marchar!
- Improviso para Violino e Orquestra – João Guilherme Ripper
Encomendada pela Funarte para a 22ª Bienal de Música Contemporânea, em 2017, a composição apresenta três movimentos – um primeiro marcado pelo caráter reflexivo, um segundo dançante e, por fim, um terceiro mais lírico.
- Canauê – Dimitri Cervo
A composição de 2007 é a nona obra da Série Brasil 2000, constituída de peças para diversas forças instrumentais, que sintetizam brasilidade e minimalismo. A música começa com um tema lento, que é conduzido à sua apoteose e, ao fim, retorna com novas matizes.
- Divertimento para Marimba e Orquestra de Cordas – Radamés Gnattali
Escrita em 1973, a obra traz diversos elementos da música regional brasileira e demonstra a inventividade do compositor ao diluir as fronteiras entre o erudito e o popular. Sua cadência foi escrita por Luiz d'Anunciação, percussionista a quem a obra é dedicada.