Gujo Teixeira tem 11 CDs gravados e é um nome reconhecido do nativismo gaúcho. Ele, porém, não canta, não toca instrumentos, sequer assovia. Tampouco sobe em palcos para se apresentar - porém, abre exceção quando vai receber prêmios. E, em seus mais de 30 anos de carreira, foram dezenas deles. A arte de Gujo, no entanto, está nas palavras, que se formam no encontro da ponta da caneta com o papel. É nesse momento que acontece o seu show.
Escritor de clássicos modernos gauchescos como Batendo Água, que já foi cantada por mais de cem artistas, de Luiz Marenco a Michel Teló, o autor das letras, por meio de porta-vozes, entrega o que tem a dizer para o público. Que, por sinal, é enorme: mais de 500 composições suas já foram gravadas pelos mais variados cantores. Calcular quantas pessoas já foram alcançadas pela sua obra é uma tarefa praticamente impossível.
Acostumado a estar sempre na estrada, indo de festival em festival, seja como jurado, convidado ou concorrente, o escritor viu a sua rotina mudar durante a pandemia. Mas isso não fez com que ele parasse. Pelo contrário. Depois de publicar, por meses, suas trovas nas redes sociais, Gujo decidiu reunir o seu trabalho em um livro, Pitangas, o seu nono, mas diferente de tudo que já produziu.
Trabalhador da arte
Inspirado pelos mais diferentes estilos musicais, passando da música tradicionalista gaúcha até o rock do grupo Legião Urbana, Gujo, aos 13 anos, começou a escrever os seus primeiros versos. Foi aos 17, no entanto, que ele conta como início de sua carreira: em 1989, estreou em um festival realizado na cidade de Mata, a uma hora de Santa Maria, mostrando o seu trabalho ao público pela primeira vez.
A partir dali, o seu talento começou a aproximá-lo de nomes do nativismo. Com as suas composições fazendo bonito em festivais, artistas começaram a pedir parcerias - artistas esses que o compositor sequer sonhava que um dia trabalharia junto. Assim, Gujo foi trilhando o seu caminho no meio até se tornar a referência que é hoje — ele ainda se espanta ao contar que pessoas tatuaram os seus versos na pele. Pelos seus cálculos, já foram mais de cem.
— Sempre gostei muito de escrever e, mesmo sem nunca ter tido pretensão de ser artista, queria mostrar o meu trabalho. Então, vencendo festivais, essa turma do nativismo começou a me procurar de maneira natural para gravar as minhas composições. Eu nem sonhava com algo assim e, hoje, quem tu pensar do meio, eu tenho parceria — conta.
Há quase três décadas sendo um dos principais colaboradores de Gujo, o músico Luiz Marenco, reforça que Batendo Água é uma das músicas que não pode deixar de cantar em seus shows. Segundo ele, ao lado de Gujo, já perdeu as contas de quantos festivais eles, como dupla, já venceram. E o vasto trabalho que os dois fizeram em conjunto já preencheu dois discos, Quando o Verso Vem pras Casa e Enchendo os Olhos de Campo. E segue somando.
— Acredito que o Gujo seja um dos principais responsáveis pela aproximação da juventude do cenário cultural do Rio Grande do Sul. É muito importante a sua poesia. É um cara que pensa mais à frente, é o compositor que mais trabalha a sua composição, pois está sempre lançando um livro ou um disco. Sempre contribuindo. Ele é meu compadre, meu irmão e muito importante para a cultura do Estado — destaca Marenco.
Classificando-se como um "trabalhador da arte", Gujo explica que, ao escrever, gosta de se debruçar em cima de um tema e procurar a inspiração até chegar na composição ideal. E para conseguir atender às demandas - afinal, centenas de composições suas estão na estrada -, busca estar sempre estudando, lendo e se preparando para as próximas. Não tem uma cidade por onde ele passe que não saia com um livro novo na mala.
— Estou sempre indo atrás do verso — enfatiza.
Pitangas
Gujo não gosta de seguir fórmulas. As suas composições não buscam se encaixar em padrões musicais. O próprio mesmo conta que sempre foi um artista que busca ousar mais, e a sua escrita é mais "longa" que o convencional, incluindo os títulos das músicas, como Quando o Verso Vem pras Casa ou Na Madrugada dos Galos. Para o seu nono livro, quis fugir da própria transgressão. A ideia era justamente trabalhar em cima de um título simples, com apenas uma palavra. E a escolhida foi "pitanga".
Alinhando as trovas individuais publicadas nas redes sociais e lembrando dos livrinhos de cabeceira que traziam pílulas de sabedoria, em que se lia uma dica por dia, Gujo fez a ligação com a fruta colorada, que se pega uma de cada vez no pé e come sem encher a boca, catando qual é a mais madura e buscando a mais saborosa. Em março, ele começou a organizar o livro, reunindo o material já divulgado na internet e acrescentando novidades, como novos textos e os cinco sentidos.
Na obra, é possível encontrar um creme para as mãos com cheiro de pitanga — que também está impregnado nas páginas —, balas com o sabor da fruta e uma capa com relevo. A audição é aguçada por meio de QR Codes presentes na publicação que levam para o Spotify. Na plataforma, 106 pessoas foram envolvidas em um processo de trilha sonora, com vozes de atores, cantores e anônimos de vários lugares do Brasil e do Exterior declamando as trovas de Gujo. Entre eles, Evandro Mesquita, Jackson Antunes, Letícia Spiller, Marcos Palmeira, Thiago Lacerda e, claro, Luiz Marenco.
Obreiro da palavra
Nascido na Capital, mas lavrense de coração, Gujo Teixeira, cujo nome de verdade é Paulo Henrique — e nem ele sabe o motivo e o significado de seu apelido — tem 49 anos, é casado com Anita e pai de Bethânia e de Guilhermina — esta, aos 16 anos, foi uma das mais ativas no processo de criação de Pitangas. E, para tirar a obra do forno, além da gráfica, foram vários dias de trabalho manual, reunindo a família ao redor do fogo, com todos colaborando. O escritor fez questão de fazer o seu livro assim, pois, colocando a mão em cada detalhe, teria certeza do cuidado e do carinho com que a obra chegaria ao seu leitor.
Gujo preparou duas mil cópias de seu mais novo livro que, antes mesmo do lançamento, já tinha vendido 1,2 mil exemplares. E, para ele, este esforço foi "prazeroso", pois estar envolvido com a arte, sempre procurando novas maneiras de alcançar o público, é o que lhe motiva a seguir adiante, além de lhe fazer se aproximar das pessoas, sejam artistas para musicar as suas letras ou de sua própria família ao redor do fogo para criar uma obra sensorial.
— Hoje, por exemplo, recebi uma mensagem de uma pessoa dizendo que leu um verso meu e disse: "Tu não sabes o bem que faz para mim, pois meus dias não estavam muito bons". Ler isso já fez valer livro, sabe? E mostra que a palavra diz coisas além do que a gente pensa. É isso o que busco, mesmo que sem intenção. Acho que as palavras têm que chegar em alguém. Sou um obreiro da palavra, gosto de trabalhar com ela. Sou sempre um inquieto, não canto, não toco e tenho 11 CDs lançados. Acho que pessoas tinham que ser um pouco mais assim, ousadas, e não ficarem só esperando as coisas acontecerem — finaliza.
Pitangas pode ser adquirido diretamente com o autor, pelo WhatsApp (55) 9976-5440, ou pelo Instagram @gujoteixeira.