Se tivessem de contar com algum tipo de privilégio, os músicos que subirão ao palco da Sogipa na noite desta terça-feira (3) talvez não estivessem ali. De famílias de baixa renda e de escolas públicas, a maioria não teria se aproximado de um palco e muito menos de um instrumento musical não fosse a Orquestra Jovem do Rio Grande do Sul, que comemora 10 anos com um concerto especial.
Criado em 2009 na Secretaria da Justiça e do Desenvolvimento Social do governo do Estado, o projeto mistura aprendizado de música com assistência social. Permite que jovens entre 10 e 24 anos, vindos de lares mantidos com até três salários mínimos, entrem para uma orquestra e recebam o ensino completo da música, da leitura de partituras ao domínio de um instrumento.
Muitos desses alunos são da periferia. Poucos cogitaram a carreira artística antes de entrar para a orquestra. Em alguns casos, a seleção para o projeto também foi a primeira vez em que seguraram um violino ou tocaram uma flauta doce, por exemplo. Também acontece de ser a primeira vez que ouvem falar em Mozart e Beethoven.
Secretário da pasta na época e mentor do projeto musical, o cientista político Fernando Schüler diz que a orquestra tem em seu cerne o cuidado para não subestimar os jovens pelo contexto social a que pertencem. O objetivo é tratar a todos como músicos em potencial:
— A ideia partiu de um conceito muito simples: mostrar que o talento não pertence à origem, renda ou estratificação social. Basta que as pessoas tenham oportunidade que o talento floresce.
A lapidação do potencial artístico dos jovens é tarefa do maestro Telmo Jaconi, violinista por 44 anos da Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (Ospa). Exercendo seu lado professor, nesses 10 anos ele viu alunos desistirem das aulas e outros tantos investirem na oportunidade de escolher uma carreira. Tamanha dedicação costuma ter reflexos nas famílias.
— Pais e mães vêm nos contar que os alunos estão botando ordem na casa por causa dos estudos — diz Telmo, que transmite a paixão pela música clássica e cobra esforço e disciplina da garotada.
Vida de músico profissional
A Orquestra Jovem não cobra mensalidade, mas exige dedicação quase exclusiva de seus alunos. As aulas ocorrem de segunda a sexta, das 14h às 17h30min, em salas cedidas pela Fundação Pão dos Pobres. Os cerca de cem estudantes atualmente matriculados são divididos entre avançados, intermediários e iniciantes. Todos recebem vale-transporte e, no caso dos acima de 14 anos, também auxílio financeiro.
A captação dos recursos é função da ONG Associação Orquestra Jovem do Rio Grande do Sul, que busca doações de empresas via Lei Rouanet e contribuições de pessoas físicas. Uma das conquistas foi a compra de instrumentos que permitiu a evolução para uma formação sinfônica – com naipes de cordas, madeiras, metais e percussão – e uma grande vitória: o vínculo com o Jovem Aprendiz, parceria com empresas privadas.
Gratuita e marcada para as 20h, a apresentação de aniversário terá a participação especial de Renato Borghetti e reunirá todos os alunos, dos avançados aos iniciantes. Juntos, abrirão o concerto com Cânone em Ré Maior, de Johann Pachelbel, peça que o grupo apresentou no São Pedro quando o projeto foi inaugurado. O repertório também traz músicas populares, como Un Vestido y un Amor, de Fito Páez, e Pode Vir Quente que Eu Estou Fervendo, clássico de Erasmo Carlos.
Imersos na rotina de ensaios, aulas e apresentações na Capital e pelo Interior, os alunos sentem-se valorizados. Questionados se desejavam ser músicos, três integrantes do grupo avançado, rapazes com pouco mais de 20 anos, respondem em uníssono:
– Nós já somos.
Concerto do 10º aniversário da Orquestra Jovem do Rio Grande do Sul
Terça-feira (3), às 20h.
Salão de Eventos da Sogipa (Rua Barão do Cotegipe, 415).
Entrada franca mediante retirada de ingressos.
Capacidade máxima de 800 lugares.