Mais do que levar seu som ao palco, Jorge Drexler agora quer apresentar seu silêncio. Dono de uma carreira com 14 discos lançados, cinco Grammys Latinos e um Oscar, o uruguaio cantará seus principais sucessos em dois shows intimistas, no formato voz e violão, em Porto Alegre, nesta sexta-feira (31), no Teatro do Sesi, e em Pelotas, no sábado (1º/6), no Theatro Guarany. Em ambos, os ingressos já estão esgotados. Depois, o músico segue para o Rio de Janeiro (3/6), São Paulo (6 e 7) e Curitiba. E a explicação do cantautor para a criação desta nova turnê deve fazer muita gente se identificar com ele: há algum tempo, Drexler vem sentindo dificuldade de se concentrar.
— Está se tornando muito difícil para mim ler livros longos. Não vejo mais filmes, vejo séries — confessa em entrevista por telefone a GaúchaZH, em um português quase perfeito.
Se na turnê anterior, inspirada no álbum Salvavidas de Hielo (2017), Drexler havia escalado uma banda para acompanhá-lo em shows por 80 cidades em 17 países, agora está sozinho no palco com a responsabilidade de fazer o espetáculo acontecer. Basicamente, um exercício de foco, de atenção total ou, na onda atual, de mindfullness.
Para isso, Drexler partiu de uma insatisfação já antiga em relação à música contemporânea e inspirou-se em uma área de atuação anterior à vida de artista.
— Antes de tocar, trabalhei na medicina, na área de audiologia. Sou muito sensível ao som e gosto muito dos detalhes. Os shows de música popular, hoje em dia, têm um nível de barulho muito alto. Eu queria voltar a um conceito parecido com o de concertos de música clássica, de partir de um silêncio real — explica.
A desenvoltura com a língua portuguesa tem explicação: Drexler é unha e carne com o Brasil, principalmente com o Rio Grande do Sul. Nascido em Montevidéu, o músico mora na Espanha. Mas parece não ter esquecido do impacto que suas músicas causam nos vizinhos gaúchos (ou “gauchos”, quando se atravessa a fronteira). Amigo e parceiro de Vitor Ramil, a quem considera “o mais surpreendente compositor de sua geração”, Drexler enfim vai apresentar suas músicas em Pelotas, cidade natal da “estética do frio”, onde passeia — pelo menos sonoramente — com muita desenvoltura.
— A relação do Rio da Prata com o Rio Grande do Sul é, para mim, uma demonstração da relatividade das fronteiras físicas. O mate, a milonga, o churrasco, o frio, a figura do gaúcho, a maneira de olhar o mundo: imagino que muita gente tenha mais em comum com uruguaios como eu do que com os cariocas. São os lugares do mundo em que me sinto mais querido. Me sinto em casa e acho que as pessoas aí se sentem em casa nas minhas músicas — diz, em tom de emoção, antes de falar do amigo pelotense, que, aliás, também faz show neste final de semana, com a reunião familiar Casa Ramil:
— Por isso, tenho uma emoção muito grande em tocar em Pelotas pela primeira vez. Fui lá quando era pequeno, é a cidade do Ramil. Espero conseguir dar a essas pessoas tanto quanto recebo.
Lições de piano para voltar a compor
Se Silente é sobre dar atenção, dedicar a concentração plenamente ao momento, o show é detalhista no clima que deseja transmitir – e isso se aplica principalmente na iluminação.
— O fato de eu estar solo não quer dizer que seja um show simples. É muito elaborado. Nunca tive uma cenografia que muda tanto. Temos quatro painéis translúcidos, movidos por tração humana, que permitem um jogo de transparências permanente feito de maneira totalmente artesanal — avalia.
Uma das explicações dadas por Drexler para a turnê é gostar de mudanças — “oscilações e variações”, no vocabulário do músico. A prova é uma revelação que faz durante a entrevista: começou a estudar piano há dois meses, num movimento que pode ajudá-lo a voltar a escrever.
— Essa incapacidade de me concentrar ficou clara quando comecei a estudar piano. Eu tinha estudado aos cinco anos e parei quando comecei a tocar violão, porque precisei deixar crescer as unhas. Até que, recentemente, um amigo me disse que isso não é um motivo. Egberto Gismonti (multinstrumentista e compositor carioca) toca piano com unhas compridas. Estou adorando, estou apaixonado. Agora, quero chegar no momento de composição com o instrumento novo — confessa, dando uma pista para uma futura turnê aqui pelos pagos.
Jorge Drexler
- Sexta-feira (31), às 21h. Teatro do Sesi (Av. Assis Brasil, 8.787), em Porto Alegre. Não há mais ingressos à venda.
- Sábado, às 21h. Theatro Guarany (Rua Lôbo da Costa, 849), em Pelotas. Não há mais ingressos à venda.