Acostumados a shows em todo o país, na América do Sul e nos Estados Unidos (o grupo passou pela Terra do Tio Sam em 2003 e 2005), Os Serranos sobem pela primeira vez em um dos palcos mais sagrados da cultura gaúcha, o Theatro São Pedro, para celebrar 50 anos de trajetória. Nos espetáculos de nesta quarta (22) e quinta-feira (23), esta que é uma das mais importantes formações da música regionalista gaúcha passará em revista sucessos como Criado em Galpão, Mercedita, Tertúlia e De Chão Batido. Entre as participações especialíssimas estão Frutuoso Luiz Araujo, que fundou Os Serranos com Edson, em 1968, Francisco de Assis Dutra Becker, o Chicão, e José Gentil de Jesus — os dois últimos formavam uma espécie de banda de apoio dos Serranos na época.
— Será uma retrospectiva de nossa história musical. Serão expostas fotos marcantes de nossa carreira. Não tenho dúvidas, de que será emocionante para todos — comenta Edson, líder e acordeonista do grupo, 66 anos.
Na expectativa por subir ao palco sagrado, Edson destaca que o São Pedro tem uma grande importância na cultura gaúcha, mas lembra que o grupo tem ampla experiência em palcos do Brasil e do mundo:
— Nossa expectativa é grande, pela tradição e importância do próprio São Pedro, mas já atuamos em outros grandes teatros, clubes, bailões e CTGs de toda a Região Sul.
Everton "Toco" Dutra, irmão de Edson, e que toca contrabaixo no grupo, ingressou nos Serranos em 1971, segue na mesma linha, dizendo que o grupo "não inventará nada" no palco do São Pedro.
— Claro, é uma comemoração, um show especial. Se fosse um baile comum, não teria sentido. Mas sou tranquilo no palco, levaremos o melhor do nosso conjunto — comenta Toco, 64 anos.
O começo de tudo
Entre o fim de setembro e o início de outubro de 1968, os jovens Edson Dutra (direita na foto), aos 16 anos, e o amigo Frutuoso (esquerda na foto), 18, sem ter ideia do que estaria por vir, encerravam, em Bom Jesus, na serra gaúcha, o primeiro baile de Os Serranos. Na época, o "grupo" ainda era somente uma dupla de acordeonistas e tinha a companhia de uma espécie de banda de apoio, formada por Francisco de Assis Dutra Becker (bateria), primo de Edson, o Chicão e José Gentil de Jesus (pandeiro).
— Usávamos microfone cadeira. Ele era pendurado na cadeira e servia tanto para gaita quanto para voz. E, na época, o pessoal tratava o Chicão e o Gentil como ritmistas, não como músicos. Coisas da época, nada que diminuísse a qualidade deles — relembra Edson.
Sobre aquela histórica época, Edson afirma que não tinha noção que o grupo tomaria a proporção que teve.
—Mas, temos a consciência de que só chegamos até aqui por termos muito foco, responsabilidade, investimento, ótimas parcerias com grandes colegas e respeito aos nossos fãs e amigos — comenta.
Bom Jesus celebra os filhos famosos
E, é claro, uma das comemorações dos 50 anos do grupo foi um baile pra lá de especial, na noite de quarta-feira, no CTG Presilha do Rio Grande, onde tudo começou, em Bom Jesus, terra natal de Edson e Toco, onde o grupo começou sua estrada.
— É uma cidade muito importante para nós, foi lá que tudo começou, com o apoio do patrão do CTG, dos familiares e dos amigos. Bom Jesus mora em nossos corações — derrete-se Edson.
E Toco completa:
— É muito bom estar aqui. Cruza com um conhecido na rua aqui, um primo ali...
Outros projetos pelos 50 anos foram o lançamento do CD (download gratuito em osserranos.com.br) e DVD Conhecendo o Rio Grande do Sul (R$ 25, preço médio), que traz clássicos da música gaúcha em versão instrumental, além de um livro, ainda sem data certa para sair.
Só boas lembranças
Instigados a elencar momentos marcantes de Os Serranos, Edson e Toco relembram, de maneira unânime, as duas turnês que o grupo fez pelos Estados Unidos, em 2003 e 2005, passando por cidades como Miami e Boston.
— Esses momentos não poderiam ficar de fora — relembra Edson.
O acordeonista lembra, ainda, de três participações no extinto Programa do Jô, na RBS TV. Na última, em 2015, Jô abordou temas típicos do Rio Grande do Sul, quase que em pegadinhas para a turma de Edson Dutra.
— Ele nos questionou sobre a diversidade das palavras que temos no Rio Grande do Sul, tais como "atilho", por exemplo. Depois, ele partiu para a Estátua do Laçador, perguntando-me se eu sabia qual era o calçado que ele (o Laçador) estava usando. Respondi na hora: "botas de garrão de potro" — relembra Edson.
Festival foi simbólico
Já Toco relembra outro momento emblemático, a participação na Califórnia da Canção Nativa de 1980, quando faturou a Calhandra de Ouro, prêmio máximo do evento, por conta da música Veterano.
— Sem dúvida, foi um dos divisores de águas. Naquela época, a Califórnia era cheia de músicos mais "festivaleiros" (artistas gaúchos mais especializados em festivais nativistas), e entramos nós, que éramos de bailes e shows e ganhamos. Foi marcante.
Mil amigos pelo país
Além de inúmeros parceiros gaúchos, Os Serranos colecionam amigos na música nacional. Um dos principais é o sertanejo Sérgio Reis, que participou da gravação do DVD de 40 anos do grupo, no Teatro do Bourbon Country, em 2008 — a gravação ainda teve participação do grupo Os Monarcas, de Renato Borghetti e de Eduardo Araújo.
— O Edson Dutra é um gentleman e um grande amigo. Meu filho mais novo, Paulo, esteve em um churrasco na casa dele e disse: "Pai agora entendo por que você gosta tanto dos gaúchos. Que educação, que cordialidade!" — afirmou Sérgio, em entrevista ao Diário Gaúcho, em 2015.
Celeiro de ases
Outra marca importante do grupo, que observadores não tão atentos da música não sabem, é que Os Serranos são um celeiro de formação de grandes nomes da música gaúcha. O mais emblemático, sem dúvida, e considerado o dono de uma das melhores vozes da história da música gaúcha é José Cláudio Machado (1948 _ 2011). O músico integrou Os Serranos por duas vezes _ na segunda, entre 1985 e 1986, participando com seu vozeirão do disco Isto é... Os Serranos, que rendeu ao grupo um de seus discos de ouro.
— Zé Cláudio era de um talento absurdo — relembra Edson
Outros nomes que passaram pelo grupo foram Rodrigo Munari e Joca Martins — ambos em carreira solo, atualmente.
— Tivemos a honra em dividir a responsabilidade de nosso trabalho artístico com muitos colegas que, com seu trabalho, nos auxiliaram na projeção dos Serranos. Mas também, levaram consigo, ensinamentos e conceito profissional que os ajudaram na própria carreira — constata Edson.
Joca devolve os elogios:
— Os Serranos são uma eterna referência do meu coração musical. Quando estou com eles no palco, é como se vivesse um sonho.
Nova geração
Há cerca de cinco anos, os dois comandantes do grupo, Toco e Edson, começaram a diminuir o ritmo de viagens e shows com o grupo, quase que passando o bastão para a nova geração, que tem em Daniel Hack, acordeonista e vocalista, um de seus expoentes:
— Não consigo parar totalmente, mas venho diminuindo o ritmo. Quero viajar uma vez por mês, uma vez a cada dois meses. Tem cidades que temos muitos amigos, não vamos nos desligar totalmente — explica Toco.
—Depois desses 50 anos, nos distanciaremos da maioria dos eventos. Mas, claro, iremos naqueles que entendermos mais necessária a nossa presença. E deixando, aos poucos, os palcos para os colegas — afirma Edson.
Alguns números dos Serranos
- Lançaram 29 discos inéditos e dois DVDS.
- Em 2009, foram indicados ao Grammy Latino, na categoria de melhor álbum de música de Raízes Brasileiras com o disco Os Serranos, 40 anos — Sempre Gaúchos!. Em 2013, nova indicação ao Grammy Latino, na mesma categoria, pelo disco Os Serranos Interpretam Sucessos Gaúchos Vol. 3.
- Mais de dois milhões de discos vendidos
Duas noites com Os Serranos
O quê: dois shows de Os Serranos
Quando: nesta quarta (21), às 21h, e nesta quinta (22), às 21h
Onde: Theatro São Pedro, Praça Marechal Deodoro, s/nº
Quanto: ingressos a R$ 35 (galerias), R$ 60 (camarote lateral) e R$ 100 (camarote lateral, camarote central e plateia), à venda nas bilheterias do teatro, neste sábado e neste domingo, das 15h às 20h e, a partir de segunda-feira, das 13h às 18h30min ou no site theatrosaopedro.com.br.