Depois de um ano e três meses, o fim de semana passado marcou a primeira apresentação de Dejeane Arruée, Graziela Pires e Monique Brito em Campo Bom, cidade do Vale do Sinos onde o trio se conheceu e formou a 50 Tons de Pretas.
Nesse meio tempo, a banda – que inclui em seu repertório samba, a cadência da MPB e as rimas do hip-hop – participou de festivais, tocou ao lado de nomes importantes da nova cena gaúcha, passou a integrar um circuito de vozes femininas na música de Porto Alegre, gravou seu primeiro clipe e começou a preparar seu disco de estreia – que deve ser lançado ainda em 2018. Levando-se em conta que as três são professoras de música com atuação importante na região, chama a atenção a espera.
– Em Campo Bom, se forem quatro professoras negras na rede pública, é muito – calcula Dejeane, 38 anos, sambista há 20 anos e professora de música há 10, ressaltando a dificuldade extra de fazer arte com raízes negras em uma cidade tão branca. – Estamos acostumadas a ter de abrir portas, às vezes inclusive empurrando bem forte para abrir. É a nossa casa, mas é uma cidade com um preconceito enorme. Com a música é a mesma coisa, mas a música facilita a aproximação.
Até mesmo por isso, a história de formação da 50 Tons de Pretas é quase inevitável: professoras de música da rede pública, Dejeane e Graziela – que, até o ano passado, aos 31 anos, regia os quatro corais da cidade –foram convidadas para uma apresentação especial de Dia da Mulher. Resolveram chamar Monique – baiana de 21 anos, aluna de Grazi desde os 13 e sua sucessora como professora de música – e outras duas meninas para formar um grupo de improviso. A apresentação foi um sucesso, rendeu convites para shows, e as gurias, já sem as outras duas parceiras, resolveram seguir carreira. Neste sábado, o trio se apresenta no MEME Santo de Casa, em Porto Alegre.
– Em um ano, o projeto cresceu muito, e isso dá uma ideia da demanda que existe por representatividade – diz Grazi, claramente emocionada. – A gente não tinha noção de como as pessoas precisavam de mulheres para se inspirar, principalmente mulheres negras.
Talvez o grande exemplo tenha acontecido nesta semana: alunos da escola pública Saint Hilaire, da Lomba do Pinheiro, em Porto Alegre, realizaram uma atividade com base em A Mais Pura Verdade, clipe lançado em abril pelas gurias. Quando uma aluna negra sofreu bullying por causa de seu cabelo, as crianças foram postas a ouvir a música do trio – que em determinado momento diz "preta, agora chegou tua vez (...) buscou na tua ancestralidade a mais pura das verdades para se reconstruir" – e incentivadas pela professora Larisse a escrever cartinhas para a banda. O encontro vai ao ar neste domingo, às 6h50min, na RBS TV, no programa Compartilhe RS:
– Tudo isso nos leva a acreditar que a espera valeu a pena e que o momento era esse – emociona-se Grazi.
"Vocês têm um black muito lindo"
No próximo domingo, às 6h50min, o programa Compartilhe RS, da RBS TV, conta a história dos alunos da Escola Municipal de Ensino Fundamental Saint Hilaire, do bairro Lomba do Pinheiro, em Porto Alegre, que escreveram cartas para as meninas da 50 Tons de Preta falando sobre orgulho negro. Esta foi uma das cartas enviadas:
"Oi, meninas! Eu queria muito conhecer vocês, porque me falaram que vocês têm um black muito lindo, e também agradecer muito por existirem e terem feito essas músicas muito lindas. Vocês mudaram um pouco as nossas vidas! E que vocês possam chegar lá no topo e conquistar muitas coisas nas suas vidas. Não tenham vergonha da sua cor, porque negro é forte, negro é resistente, negro é black, negro é rei!"
50 Tons de Pretas
Amanhã, às 21h.
MEME Santo de Casa (Rua Lopo Gonçalves, 176).
Ingressos a R$ 30, à venda no Café do Avesso (Rua da República, 303) ou no local.
O show: Dejeane Arruée, Graziela Pires e Monique Brito tocam clássicos do samba e da MPB, além de músicas próprias, que devem estar no disco de estreia, previsto ainda para 2018.