Em tempos especialmente bicudos para a arte e a cultura no país, a sexta edição do Canoas Jazz significa uma manifestação de resistência. O festival enxugou os custos e encolheu de tamanho – mas as duas atrações internacionais que vão se apresentar neste domingo asseguram que a régua de qualidade do evento que já trouxe feras como Dave Holland, Ravi Coltrane, Egberto Gismonti, Stanley Jordan, Trio Fattoruso e Hermeto Pascoal continua alta: a primeira atração a se apresentar no Salão de Atos da Unilasalle, a partir das 19h, é o ótimo acordeonista suíço Olivier Forel, seguido do trombonista norte-americano Delfeayo Marsalis. A entrada é franca (leia abaixo).
Integrante da "primeira família" do jazz, Delfeayo é irmão do trompetista Wynton e do saxofonista Branford e filho do pianista Ellis Marsalis Jr. – que colaborou pela primeira vez em um disco do filho, tocando nas 13 faixas de The last southern gentlemen (2014). Base do concerto deste domingo na Região Metropolitana, o álbum de Delfeayo reúne standards e composições próprias, alternando-se entre baladas, blues e grooves mais sincopados – sempre conduzidos com elegância e suingue por um band leader ciente da responsabilidade de levar adiante a herança do jazz de New Orleans. Zero Hora conversou com o músico, produtor e educador de 51 anos, que vai tocar ao lado de um grupo formado por Marvin "Smitty" Smith (bateria), David Pulphus (contrabaixo), Khari Allen Lee (saxofone) e Kyle Roussel (piano).
Canoas jazz – shows de Olivier Forel e Delfeayo Marsalis
Domingo, às 19h.
Abertura da casa: 18h.
Salão de Atos da Unilasalle (Avenida Vitor Barreto, 2.288), centro de Canoas – Região Metropolitana de Porto Alegre.
Os shows: apresentações do acordeonista suíço Olivier Forel e da banda liderada pelo trombonista norte-americano Delfeayo Marsalis. A entrada é franca e lugares por ordem de chegada.
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Entrevista – Delfeayo Marsalis, músico
Como será o concerto deste domingo?
Estarei acompanhado do grande Marvin Smith na bateria e de membros da minha Uptown Jazz Orchestra, de New Orleans. Marvin não vem ao Brasil há 30 anos. Da última vez, ficou por aqui durante um mês, excursionando com a banda do Sting.
Como foi gravar pela primeira vez um disco inteiro com seu pai?
Ele tem um jeito único de tocar, tão lindamente. O grande presente de atuar com músicos que tocam assim tão lindamente é que isso ajuda você a também tocar bonito.
Há fortes influências latinas no disco The last southern gentlemen, como o bolero em The secret love affair e But beautiful e o mambo em The man with 2 left feet. Você poderia falar sobre essas sonoridades?
Para mim, a emoção é a parte mais importante da música. Então, nós tentamos encontrar o ritmo certo para criar a emoção de cada tema. O bolero, por exemplo, funciona perfeitamente para The secret love affair. Gosto de usar os sons de diferentes lugares do mundo.
O que você gosta na música brasileira?
Sou particularmente fã de Elis Regina e Ivan Lins. Eles são tão apaixonantes, gosto da paixão na música.
Voltando a The last..., sua versão de Speak low é tudo menos baixinha, suave, e suas covers de Autumn leaves e My romance são igualmente singulares. Fale sobre sua abordagem de standards como esses, por favor.
É difícil de explicar, mas vou dizer isto: sou um baita fã de Beethoven e dos compositores clássicos. Penso no meu CD como uma sinfonia. Tento captar o máximo de emoções e ânimos possíveis na minha sinfonia. Penso sempre em uma abordagem única para cada música. Isso fica claro no disco que acabei de lançar com a Uptown Jazz Orchestra, chamado Make America great again!.
Você disse mesmo que a razão pela qual o trombone fica no meio da banda é para manter os trompetistas longe dos saxofonistas?
Sim, é verdade! (risos)
Para além da brincadeira, qual é a importância do trombone na história do jazz?
O trompete é um instrumento alto, o saxofone é suave. O trombone fica no meio, é um pacificador. O trombone tem ainda a maior responsabilidade na banda, porque o trompete na música de New Orleans só se preocupa com o trompete. O saxofone preocupa-se com o saxofone e o trompete. O trombone pensa no trombone, no saxofone, no trompete e também na seção rítmica. O trombone, portanto, é o principal instrumento (risos).
Como você escolheu seu instrumento?
Eu acho que o instrumento me escolheu. Penso que é o que aconteceu com todos na minha família, eu tenho a personalidade desse instrumento. Ser um produtor musical é semelhante a tocar trombone.
Como foi crescer em uma família tão musicalmente dotada?
Foi interessante, porque crescemos logo depois do movimento pelos direitos civis. Então, havia muita conversa sobre nossa importância como homens afro-americanos nos Estados Unidos. Sobre como o que faríamos seria muito importante. Não tanto por causa da música, mas pelas novas oportunidades. A ênfase em casa não era na música, mas na educação.
Quais são suas expectativas quanto ao governo de Donald Trump?
Bem, acho que Trump é um bom ator e eu espero que ele faça um bom trabalho atuando como presidente (risos).