Por Nelson Burd
Jornalista
Fim dos anos 1990. Repórteres de portais de internet eram “canetinhas”, como chamam os profissionais de jornal. O avanço tecnológico deu aos novos veículos, além da instantaneidade do rádio, a reunião de todas as mídias.
Transmitir o fato ao vivo era privilégio de rádio e televisão. Por exemplo, a chegada de autoridades ao Salgado Filho, ou um incêndio de grandes proporções no Centro. A canção do grupo Barão Vermelho define bem: “...jornal de ontem, com notícias de anteontem”.
A rede de televisão norte-americana CNN inovou em coberturas internacionais durante a Guerra do Golfo, em 1991. O “Jornalismo Embutido” aparece em 2003, na Guerra do Iraque, com câmeras dentro de tanques militares, como já havia em carros da Fórmula-1. Outra vez, a tecnologia a serviço da informação.
Em termos esportivos, telefones públicos na Copa do México de 1970 e a telefonia celular na Itália, em 1990, foram as facilidades do momento para os comunicadores. Mas o melhor ainda estava por vir. A internet proporcionou trazer o conteúdo textual em tempo real, pela primeira vez. Transmissões de eventos minuto a minuto, literalmente. Unir a velocidade de informação radiofônica ao texto jornalístico. O repórter com a possibilidade de ser testemunha ocular da história, escrevê-la e publicá-la na mesma hora. Foi a experiência de Léo Gerchmann durante a Copa da França, em 1998, para o portal Uol e a Folha de S.Paulo. Cobrir treinos, jogos, cotidianos de torcedores, turistas e locais, retratar realidades e brindar os leitores com retratos reais.
A nova realidade proporciona contar mais detalhes. Não ficar restrito a espaços nas páginas de jornal. O portal é infinito. A diagramação não limita. Dessa forma, como um pintor inspirado por sua musa, o repórter passa narrar fatos e situações, de maneira descritiva. Não se restringe ao factual, apenas. Ganha a liberdade de trazer curiosidades, dicas culturais, atividades do dia a dia. O presenteado é o leitor. Com a melhor informação, a mais interessante, diversificada. O amante do futebol também quer saber sobre restaurantes, sistemas de transportes, teatro, cinema e arquitetura urbana. Até a visão sobre os jogadores muda, pois abrem-se espaços para observações distintas do usual. Qualquer detalhe rende uma nova publicação.
Eu, naquele período, vivendo em Israel, acessava o Uol e lia as matérias. Ficava sabendo antes do noticiário esportivo, sem a necessidade de esperar a imprensa local.
A grande transformação ocorrida em 1998 é ampliada até hoje. O consumidor de notícias virou um “produtor de conteúdo”, sem nenhum código de ética para filtrá-lo. Ônus e bônus da evolução.
Léo Gerchmann, 24 anos depois, revisita a experiência na obra Revolução Digital na Copa da França, editada pela AGE. Nesse intervalo de tempo, o celular tijolão, que o repórter levava a tiracolo na ocasião, se transformou em um smartphone, com poder de transmitir de modo multimídia.
Um exemplo:
Bebeto deve ser confirmado entre titulares do Brasil
13h48 - 27/06/98
Léo Gerchmann
Da Agência Folha
Em Paris
Há cerca de duas horas começou a chover em Paris, onde o Brasil enfrentará, às 16h, a seleção do Chile, em jogo decisivo pelas oitavas-de-final da Copa do Mundo. O tempo esteve nublado durante toda a manhã, com poucos momentos de sol. Mesmo assim, havia torcedores brasileiros espalhados pela área central da cidade e por alguns pontos turísticos, como a catedral de Notre-Dame e o Quartier Latin.
O Brasil deverá ter a confirmação do atacante Bebeto, que sentiu uma lesão leve na quinta e na sexta não participou de atividades físicas no reconhecimento do estádio Parc Des Princes, local do jogo. A intenção do técnico Zagallo foi poupar o jogador, com a expectativa de utilizá-lo no jogo deste sábado.
Texto direto ao ponto, retratando cenário da partida, que foi publicado no portal de notícias, mas que poderia ter sido perfeitamente um boletim de rádio. Não exatamente pela linguagem. Sim, pela instantaneidade.
O livro chega no tempo certo, uma Copa do Mundo. Momento em que repórteres e leitores, de todas as editorias, se mobilizam como torcedores, de frente para a televisão. E o modo de transmitir a informação teve avanço significativo durante a Copa do Mundo de 1998, como retrata Gerchmann.