A obra de David Coimbra (1962–2022) é vasta e eterna. Mas, para a alegria de seus leitores, que sentem falta de chegar à última página de Zero Hora e encontrar um perspicaz texto do escritor, o seu legado ganha um novo capítulo: o livro póstumo Crônicas dos Anos da Peste & Outras Histórias, que está sendo lançado na 68ª Feira do Livro de Porto Alegre.
E, para homenagear o jornalista e escritor, seus amigos de longa data, o editor Ivan Pinheiro Machado e os comunicadores Luciano Potter e Juremir Machado da Silva, que trabalharam com David, foram os escolhidos para apresentar a obra ao público. O evento da editora L&PM foi realizado na tarde desta segunda-feira (31), no Auditório Barbosa Lessa do Espaço Força e Luz.
O trio compartilhou suas histórias com David — Juremir, ex-colega de faculdade e da redação de Zero Hora; Potter, ex-colega de microfone na condução do programa Timeline, da Rádio Gaúcha; e Ivan, editor de 20 livros do jornalista. O papo foi recheado de emoção, curiosidades e, claro, de humor, característica que se destaca na escrita de David.
Ivan, ao falar sobre o livro, explicou que este, como sendo o último, precisava ser maior. Por isso, escolheu 150 crônicas publicadas por David para preencher a obra, que conta com 400 páginas, passando pelo final do tratamento contra o câncer em Boston, a pandemia e, depois, os seus últimos dias. E todos os textos foram colocados em ordem cronológica, representando o seu percurso:
— Foi um mergulho profundo nos últimos anos de David editar este livro, que é maior para tentar representar quem ele foi, como pessoa e como escritor. E, com isso, aumentou ainda mais a minha admiração por ele. É um livro triste, melancólico, mas permeado por humor e leveza.
Juremir, ao falar sobre o ex-colega de Famecos, relembrou da data em que conheceu David: 3 de agosto de 1980, no ônibus da linha T1. Vindo do interior do Estado, o jornalista ressaltou que foi neste dia em que começou a sua amizade com David, que durou até o fim. Ele relembrou que a última conversa deles foi uma semana antes da morte do amigo, com ambos falando sobre remédios.
— David era uma das pessoas mais talentosas que conheci. Um dos principais cronistas do Brasil. Nos últimos anos, posso dizer, talvez ele tenha sido o grande cronista do país — enfatizou Juremir, que completou dizendo que o amigo se despediu com uma grandeza literária.
Potter, por sua vez, relembrou as vezes que visitou David em Boston e como se sentia em casa na presença do amigo:
— Era como um abraço para quem chegava. E, quando ele volta para Porto Alegre, estávamos todos sedentos pelo David, por esse abraço. Mas durou um mês e começou a pandemia.
O trio ainda resgatou histórias peculiares com o amigo, que faleceu em maio deste ano. Eles falaram das aventuras na faculdade, nos corredores das redações e, claro, dos bares.
— David, onde ele estava, contava histórias, puxava assunto. De tudo, ele tirava uma história. Ele era o cara mais engraçado da sala de aula. E eu pensava: "esse cara vai se dar bem, ele tem talento" — apontou Juremir, relembrando na sequência a vez em que saíram em uma excursão para a praia, ficando doente logo em seguida e sendo levado para o hospital por David. — Estava acabando o final de semana, a fila não andava e eu pensei: "ele vai se mandar". Mas não, ele ficou. Era um amigo de verdade.
Ivan e Potter ainda leram o trecho de A mulher mais bonita que já vi, crônica que 2019 de David que está no livro, destacando uma divertida conversa do jornalista com a sua esposa, Márcia Camara — que estava presente no auditório do evento ao lado do filho Bernardo.
— Era impressionante a capacidade de falar bobagem que o David tinha. Mesmo no hospital, era deboche o tempo inteiro — salientou Potter.
— E todos éramos personagens de seus textos. Tinha que cuidar o que se falava perto dele, porque ele ia escrever sobre — completou Ivan.
Respondendo a uma pergunta de um participante, Márcia, a Marcinha dos textos de David, respondeu o motivo da família ter voltado ao Brasil no começo do ano:
— Foi pelos amigos, pela família. Cansamos do frio. Ele estava bem, com saudades do Brasil, da vida que a gente tinha aqui. E ele também podia continuar fazendo o tratamento aqui, que era uma vez por mês.
Outros membros da plateia contaram suas histórias com David, entre risos e lágrimas. Potter ainda enfatizou:
— Todo mundo tinha uma história com o David. Ele era isso, histórias.
Ivan completou:
— E as mesas de bar nunca mais foram as mesmas.
Crônicas dos Anos da Peste & Outras Histórias — cujo título referencia Um Diário do Ano da Peste, de Daniel Defoe — está à venda no site da L&PM e, também, na banca da editora na Feira do Livro de Porto Alegre, com 20% de desconto.
Ainda na programação da edição deste ano da Feira do Livro está prevista outra homenagem a David Coimbra. No próximo dia 14, às 18h, no Teatro Carlos Urbim, na Praça da Alfândega, um sarau será realizado para reverenciar a obra e legado do escritor. Participam os jornalistas Diogo Olivier, Paulo Germano, Luciano Potter e Tulio Milman, sob a mediação de Kelly Matos. O encontro terá como título A Vida É Boa — Crônicas e Causos para Lembrar David Coimbra e seus amigos compartilharão, na ocasião, memórias e trechos da obra do colega.