— Quanto tá o Maus aqui com vocês, gurias? — pergunta uma visitante.
— Vamos ali comprar um sorvete e, depois, a gente olha banca por banca — diz um rapaz para a sua companheira de garimpo.
— Esse é R$ 65, mas levando os dois, faço tudo por R$ 100 — responde uma vendedora para a sua potencial cliente.
Essas são algumas falas que puderam ser ouvidas nas primeiras horas depois da abertura das bancas da Feira do Livro de Porto Alegre. As vozes nunca faltaram no tradicional evento literário da Capital, sejam de escritores, compradores ou vendedores. Até mesmo quando ela não esteve presente fisicamente, as vozes seguiam lá — online, mas lá.
No ano passado, no entanto, com o virtual, faltou o toque, o cheiro, a chance de se conectar com as palavras e a oportunidade de abrir um livro desconhecido em uma página aleatória para ver se ele fazia algum sentido, conforme aconselha o patrono Fabrício Carpinejar.
Neste ano, para alegria de livreiros e leitores, a feira voltou para a Praça da Alfândega, mesmo que cercada de cuidados. Agora, porém, as vozes podem ser ouvidas de perto novamente, mesmo que meio abafadas por conta das máscaras de proteção — e a maioria dos visitantes utilizava o equipamento sem questionar. Voltaram, assim, também os sorrisos do reencontro. E eles são muitos.
— As pessoas sabem que estamos sorrindo. A gente sorri com os olhos — comenta Denise Felippini, dona da livraria Erico Verissimo, que conta com um estande na feira.
Ela diz que, nas poucas horas de abertura das bancas voltadas para o público adulto — foi às 12h30min desta sexta-feira (29) — já deu para perceber que os porto-alegrenses estavam com saudade do evento presencial. Segundo ela, o leitor é um público cativo e a expectativa para os próximos dias está alta, pois as feiras do interior do Estado foram ótimas.
O mesmo pensa o dono da livraria Beco dos Livros, Guilherme Dullius, que também montou a sua banca na Praça da Alfândega neste ano e celebra as pessoas que estão saindo do evento com sacolas cheias de livros:
— O movimento está muito bom, surpreendeu. Está melhor do que se esperava — comemora.
De acordo com ele, o evento não acontecer presencialmente no ano passado prejudicou muitos livreiros. A feira, segundo Dullius, é um encontro para o qual os expositores se preparam durante todo o ano.
— Afetou tanto que muita gente não conseguiu voltar neste ano — lamenta o empresário, ao falar dos colegas que tiveram os seus negócios fechados durante a pandemia.
Pegando no papel
Para o professor, historiador e poeta Duan Kissonde, que estava passando pela Praça da Alfândega para encontrar um amigo, "rapidinho", foi irresistível ver as bancas montadas e não parar para comprar algum exemplar.
— Não tem como passar na feira e não comprar um livro — confessa, mas salienta que vai ser só um. — Se não, vou sair zerado daqui e levar bronca da minha esposa. Mas já tô até tirando fotos dos livros para me lembrar e comprar depois. Hoje, tô levando o Para Ler e Pensar, do Hermann Hesse. Achei ele, abri, li um fragmento, curti e decidi levar. Peguei no saldão de R$ 5.
De acordo com o professor, que também é autor e está feliz da vida porque vai autografar a sua obra, Água de Meninos, na próxima quarta-feira (3), a Feira do Livro traz "uma vida muito grande para a Praça da Alfândega", trazendo mais clientes, inclusive, para os artesões que vendem os seus produtos por ali.
Camila Sattes, estudante, revirava as bancas em busca de novos títulos para levar para casa. Acompanhada da mãe Márcia e da prima Bárbara, que "não são muito de leitura", a jovem conta que, todo ano, desde que era criança, sempre pede para ir até a feira, porque, no local, ela encontra novos livros, pedindo ajuda dos vendedores que, de acordo com ela, é o "pessoal que entende do assunto".
— Eu senti muita falta no ano passado. É o evento que eu mais espero para poder ir. Eu gosto muito de ler, então, foi péssimo ficar sem — conta Camila, que fez questão de estar na Praça da Alfândega logo no primeiro dia da feira e já estava com o livro Um Tom Mais Escuro de Magia, de V. E. Schwab, nas mãos.
Com a pequena Vitória, de um ano e um mês, no colo, Marcos Roberto, desempregado, segurava na outra mão o livro O Vendedor de Sonhos, de Augusto Cury, que encontrou em um balaio recheado. Segundo ele, há muitos anos não comparecia a Feira do Livro.
—Eu era pequeno quando vim — conta. — É um contato bom, porque o livro é uma maneira de tu sair do local sem ter que sair do local. É uma maneira de expandir os teus horizontes. E eu quero trazer isso para ela também. Acho muito melhor sentir um livro na tua mão. É a melhor coisa que tem.
— Tomara que isso aqui nunca acabe, só melhore — diz o pai de Vitória, que saiu da feira carregando um livro de colorir da Peppa Pig.